Título: Ainda mais estatal e sem necessidade
Autor:
Fonte: O Globo, 29/09/2010, O Globo, p. 6

Concluída, com sucesso, a operação de lançamento de novas ações da Petrobras, a maior empresa do continente poderá prosseguir com seu audacioso programa de investimentos (da ordem de US$224 bilhões até 2014) mais capitalizada, menos dependente de financiamentos de terceiros. No entanto, se tornou também mais estatal, desnecessariamente.

Ao que tudo indica esse também era um dos principais objetivos do governo, ao integralizar sua participação no aumento de capital da companhia com uma engenhosa cessão onerosa de cinco bilhões de barris de petróleo que poderão ser extraídos de reservatórios ainda a serem explorados em áreas contíguas aos campos gigantes descobertos pela Petrobras na chamada camada do pré-sal da Bacia de Santos.

O Tesouro efetivamente não precisou desembolsar recursos, e, assim, o governo conseguiu fazer um aporte de capital que foi muito além de suas reais disponibilidades financeiras.

Os critérios para fixação das condições dessa cessão onerosa foram controversos, mas, em face da resposta positiva do mercado na subscrição das novas ações, pode-se deduzir que os investidores e minoritários aceitaram, ou se conformaram, com o que o sócio majoritário resolveu impor.

Em termos práticos, a única justificativa racional para esse aumento de participação governamental na companhia já sob controle estatal é a possibilidade de o Tesouro, direta e indiretamente, vir a receber no futuro mais dividendos caso a Petrobras multiplique seus lucros, além de uma aposta na valorização das ações.

A União já detinha a maioria com direito a voto, o que permitia ao governo indicar quase todos os membros do conselho de administração e os diretores. Esse controle não esteve ameaçado, mas, à medida que a participação dos sócios minoritários fosse aumentando por meio das ações preferenciais, o comportamento da Petrobras teria de mudar, passando a dar mais atenção aos aspectos de governança - como acontece com companhias que têm seu capital pulverizado no mercado.

Os interesses políticos do governo algumas vezes conflitam com o que se define como boa governança corporativa de uma companhia cotada em bolsa. Desse modo, a estrutura de capital que prevalecia até agora parecia ser incômoda para o Planalto.

Tanto assim que, além da cessão onerosa dos bilhões de barris de petróleo, o governo resolveu usar recursos do Fundo Soberano, criado em função de carrear receitas futuras oriundas do pré-sal, e ainda manter a participação relativa da BNDESPar no capital da Petrobras, sem que o BNDES tivesse dinheiro disponível para tal (o Tesouro teve de emitir R$30 bilhões em títulos para emprestar ao banco, com essa finalidade absurda).

Satisfeita essa ambição política e ideológica do governo Lula, espera-se que a Petrobras não se afaste de uma conduta profissional, pois seus desafios se agigantaram, e para superá-los a empresa terá de ser cada vez mais eficiente.