Título: Esforço fiscal sobe, mas abaixo da meta
Autor: Duarte, Patrícia; Beck, Martha
Fonte: O Globo, 29/09/2010, Economia, p. 27

Superávit até agosto cresce 27%, para R$29,7 bi, inferior aos R$30 bi previstos

BRASÍLIA. Fortemente ancorado nos dividendos pagos pelas estatais, o governo central (composto por Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central) registrou até agosto um superávit primário de R$29,7 bilhões, ou 1,29% do Produto Interno Bruto (PIB). O montante, que representa um crescimento de 27% em relação ao mesmo período de 2009, não foi suficiente para cumprir a meta de esforço fiscal fixada pela equipe econômica para o segundo quadrimestre de 2010, de R$30 bilhões - esse valor era de R$40 bilhões, mas foi reduzido diante da dificuldade do governo em fechar suas contas. Mesmo assim, o secretário do Tesouro, Arno Augustin, garantiu ontem que a meta de primário do ano será cumprida.

O objetivo é de 2,15% do PIB para o governo central e de 3,3% do PIB para o setor público consolidado. Para isso, o secretário conta com uma manobra fiscal pela qual a capitalização da Petrobras renderá R$30 bilhões em receitas primárias à União. Antecipando o bom resultado, Augustin afirmou que governo central terá, em setembro, o maior superávit primário da história. O recorde atual é de R$16,7 bilhões e foi obtido em abril de 2008.

O secretário não quis comentar a manobra fiscal alegando que ainda não houve a liquidação da capitalização da Petrobras. Mas já está decidido que parte dos R$75 bilhões que serão pagos pela estatal à União pela cessão onerosa de quase cinco bilhões de barris de petróleo para a exploração do pré-sal vão compor o superávit primário.

Augustin criticou analistas que alertam para o risco que os artifícios fiscais podem ter para as contas públicas no futuro:

- O mercado está enxergando na nossa forma de atuar algum tipo de especificidade que não existe - disse ele.

Tendência é de aumento das despesas até o fim do ano

Para o economista da consultoria Tendências Felipe Salto, o governo está fazendo o superávit primário sem qualquer esforço efetivo. Esse comportamento, afirmou, traz pouca transparência para as contas públicas e distorce os números. De acordo com projeções da consultoria, o primário do setor público em 2010 ficará abaixo da meta - em 2,6% do PIB - sem a ajuda da Petrobras.

- Com as receitas primárias que virão da Petrobras, o primário chegará a 3,3%. Mas o esforço efetivo será menor. Foi uma receita fabricada - disse.

O Tesouro também tem usado outras estratégias para reforçar o caixa, como a antecipação de dividendos pagos por estatais.

A dificuldade do governo em cumprir suas metas fiscais advém do forte aumento dos investimentos que, combinado com o comportamento crescente de despesas correntes, deixa o cobertor curto. Até agosto, embora as receitas tenham registrado crescimento de 2% em termos reais, as despesas cresceram num ritmo mais forte: 2,9%.

O professor de economia da FGV Evaldo Alves destaca que a tendência até o fim do ano é de aumentos das despesas em geral, o que deve pressionar mais as contas públicas.

- Haverá um crescimento típico dos gastos no fim do ano, pressionando, portanto, o orçamento público - disse Alves.