Título: Governo eleva fatia na Petrobras
Autor: Carneiro, Lucianne; D"Ercole, Ronaldo
Fonte: O Globo, 25/09/2010, Economia, p. 33
Dinheiro dos investidores privados, no entanto, soma R$45 bi e entrará direto no caixa
Lucianne Carneiro, Ronaldo D"Ercole, Wagner Gomes e Fernanda Godoy*
APetrobras concluiu ontem sua megacapitalização com um avanço da União sobre o capital da empresa. Antes da oferta, a fatia do governo era de 39,8% e agora passou a 48,03%. Com a operação, a companhia conseguiu levantar até R$120,36 bilhões, na maior capitalização da História.
Do total que a empresa captou, R$74,8 bilhões são referentes à cessão onerosa de barris. Ou seja, foram emitidos títulos que irão para a União em pagamento pelo direito de explorar 5 bilhões de barris. Mas foi dos investidores privados que vieram cerca de R$45 bilhões, que vão diretamente para o caixa da empresa. Esse montante é o que companhia poderá contar para investir já no pré-sal.
Da fatia do governo, eram 37,3% de União e BNDESPar, e 2,5% de BNDES e Caixa. Já os investidores privados (institucionais, estrangeiros, pessoas físicas, ações na Bolsa de Nova York, FGTS-Petrobras) respondiam pelos outros 60,2% da empresa. Com a operação, a fatia da União e da BNDESPar ficará em 45,03%, e outros 3% do Fundo Soberano. E a fatia dos investidores privados vai recuar para 51,97%.
Com uma grande procura pelas ações e com o apetite do governo para avançar no capital da companhia, os novos investidores da Petrobras terão uma fatia menor do que pretendiam: só levarão 45,77%. Ou seja, quem fez uma reserva de R$10 mil na semana passada conseguiu apenas R$4.577. O percentual de rateio vale para quem reservou ações diretamente ou via Fundos de Investimentos em Ações (FIA) Petrobras. Já os atuais acionistas da empresa - e que participaram da oferta prioritária, inclusive os que usaram o FGTS - foram atendidos integralmente em seus pedidos até o limite de 34% da participação que já tinham na companhia. Ou seja, conseguirão manter sua fatia na Petrobras e não terão o capital diluído.
Mais risco político, dizem analistas
O aumento da fatia do Estado na Petrobras foi anunciado pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, ontem ainda pela manhã, durante cerimônia no antigo pregão da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), que marcou o encerramento da oferta da estatal, com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, e do vice-presidente José Alencar.
- A operação até superou as expectativas, em um momento de condição adversa, porque ainda há crise no mundo - comemorou o ministro.
Mantega disse que, além de exercer plenamente o direito de preferência na oferta prioritária, que correspondeu a 80% do total e era reservada aos acionistas da companhia, o governo elevou sua fatia no capital da Petrobras adquirindo papéis preferenciais do lote ofertado aos investidores em geral. De acordo com o ministro, o governo atuou em várias frentes para adquirir papéis: diretamente via União, com o BNDES e o Fundo Soberano.
O presidente Lula disse que a capitalização da Petrobras é uma das salvaguardas criadas pelo governo para evitar que a riqueza do pré-sal seja perdida num "labirinto de desperdícios e interesses equivocados". Vestindo um macacão laranja usado pelos funcionários da petrolífera, ele disse que o destino dos recursos é sagrado, pois servirá para garantir um longo ciclo de desenvolvimento no país:
- Ao contrário do passado, não estamos aqui para debilitar o Estado ou alienar o patrimônio público.
O presidente também justificou o aumento da participação do governo no capital da companhia como fator fundamental para o fortalecimento da economia do país.
- Um Estado fraco nunca foi sinônimo de uma iniciativa privada forte - disse ele.
Mesmo com um modelo complexo e a poucos dias da eleição, analistas também consideraram que a oferta foi um sucesso para a companhia.
- Foi positivo, já que mesmo depois de um processo turbulento e antes das eleições a empresa conseguiu arrecadar um bom volume de recursos - disse Cássia Inez, analista da Lopes Filho & Associados.
Para o acionista minoritário, afirmam, os ganhos talvez não tenham sido tão grandes. Além do aumento na participação do governo, o preço das ações da oferta pública ficou pouco abaixo do que vinha sendo negociado no mercado.
- O risco político da Petrobras sempre existiu porque o governo já era acionista controlador. Mas com a maior participação, o risco aumenta - afirmou um analista.
Daniella Marques, sócia da Oren Investimentos, diz que o aumento de participação da União pode ser considerado ruim porque, como controlador da empresa, o governo não mostrou preocupação em gerar ganhos para os minoritários:
- Ficou claro que o interesse é gerar dividendos políticos para o governo atual e para o próximo. Estamos no meio de um processo eleitoral - afirma a gestora.
Ontem, na Bovespa, as ações da Petrobras caíram ao patamar definido pela companhia para os papéis vendidos na oferta: as preferenciais (PN) caíram 1,86%, para R$26,30, e as ordinárias, 1,98%, para R$29,65. O Ibovespa, índice de referência no mercado, recuou 0,87%, aos 68.196 pontos. O giro financeiro foi de R$11,04 bilhões. Só os papéis da Petrobras movimentaram R$2,6 bilhões (27% do total).
Na Bolsa de Nova York, foram negociados cem milhões de papéis com a presença do diretor financeiro Almir Barbassa. Os papéis fecharam estáveis, a US$34,92 (ON) e US$30,79 (PN).
(*) Correspondente