Título: Sem choro nem champanhe
Autor: Camarotti, Gerson
Fonte: O Globo, 04/10/2010, O País, p. 4

Aliados animam Dilma, que no sábado via maior possibilidade de segundo turno

PORTO ALEGRE (RS) e BRASÍLIA. Na noite de sábado, por volta das 19h, antes mesmo da divulgação das novas rodadas de pesquisas do Datafolha e do Ibope, a candidata do PT, Dilma Rousseff, e a cúpula de sua campanha já tinham jogado a toalha sobre a possibilidade de vitória no primeiro turno.

Além dos novos números, as pesquisas internas já indicavam a queda nas duas últimas semanas.

Dilma recebeu telefonemas do presidente Lula e do presidente do PT, José Eduardo Dutra, além de outros conselheiros políticos em sua casa de Porto Alegre. Nessas conversas, além da reação à possibilidade concreta do segundo turno, discutiram as primeiras estratégias do plano B. Mesmo abatidos com um segundo round ainda mais difícil de campanha, decidiram injetar confiança na candidata.

Em nenhum momento Dilma demonstrou receio, segundo os interlocutores.

Nas conversas, Dilma disse que estava preparada para a nova batalha.

Dilma está bem de saúde e preparada fisicamente para o novo embate? Questionado sobre isso, um dos coordenadores da campanha garantiu que sim. E que se não estiver hoje, vai estar no tempo certo. A expectativa no sábado era que Dilma repetisse pelo menos os números de Lula no primeiro turno de 2006: 48,6%. Ela ficou com cerca de 46%, bem próximo do que Lula registrou em 2002: 46,4%.

Os coordenadores da campanha de Dilma avaliam que dos votos da candidata do PV, Marina Silva, um bom percentual vai para a candidata petista, porque se considera que o eleitorado da senadora é mais próximo do de Dilma. Mas, do ponto de vista institucional, José Serra (PSDB) poderá ter vantagem, já que o PV está coligado com o PSDB na maioria dos estados.

O PV só não é coligado com o PSDB na Bahia, Acre e Rio Grande do Sul. Mas acham que no segundo turno o apoio não vai funcionar pelo partido, mas pela liderança de Marina.

Esperam também que todo o eleitorado de Plínio Arruda Sampaio (PSOL) vote em Dilma.

Nas menos de 24 horas que permaneceu em Porto Alegre para votar, Dilma não escondeu, nas conversas com familiares, a expectativa com os desdobramento da eleição de ontem e os números das novas pesquisas. Para relaxar, passou boa parte da noite com o exmarido Carlos Araújo, a filha Paula Araújo, a mãe dona Dilma Jane e outros parentes. No jantar, apesar de antever dificuldades, ela não demonstrou desânimo com a possibilidade de ter que iniciar a campanha da estaca zero.

¿ No jantar ela estava na expectativa e disse que era preciso aguardar o resultado das urnas. Mas disse estar bem de saúde e disposta a partir para a luta. Não mostrou preocupação de não dar conta ¿ contou Araújo.

Ontem, Dilma iniciou o dia mostrando um certo conformismo com o inesperado quadro eleitoral. Mas sem abatimento.

Ela chegou bem cedo para um café da manhã com aliados e o candidato petista ao governo do Rio Grande do Sul, Tarso Genro (PT), sinalizando disposição para enfrentar uma nova etapa de campanha. Disse confiar na militância e evitou debitar ao escândalo Erenice Guerra, aos atritos do presidente Lula com a imprensa e à reação da Igreja sua queda nas pesquisas.

Dilma votou por volta das 9h15m. A petista levou 46 segundos para votar, depois passou na casa da filha, Paula, para se despedir e seguiu para Brasília, onde acompanharia a apuração ao lado do presidente Lula. Ela ressaltou que esperaria o resultado com tranquilidade, independentemente de dar primeiro ou segundo turno. Mas disse acreditar no peso da militância para virar o jogo, em caso de segundo turno.

¿ A minha militância é aguerrida, guerreira e não desiste nunca. Diante do obstáculo, ela é melhor do que diante da facilidade. Eu não temo nada, seja o que for que acontecer, tenho a certeza de que lutamos a boa luta ¿ disse Dilma, após votar. ¿ Agora, o que acredito é que, seja o que for, o bom combate te dá a boa vitória.

A petista disse estar preparada para qualquer coisa, agradeceu a Deus por ter lhe dado forças na superação de obstáculos, sem se referir diretamente à doença que teve ano passado. Também agradeceu a parceria, a amizade e o companheirismo do presidente Lula.

E minimizou o tom das críticas de Lula à imprensa ou o escândalo Erenice: ¿ Não acredito que as razões para ficar no primeiro turno ou ir para o segundo turno derivem de um único fator. Há um processo na sociedade que explica ganhar no primeiro turno ou ir para o segundo. A minha relação com a imprensa foi muito boa.

De volta a sua casa, Dilma disse que não teve dificuldades para dormir por causa das pesquisas: ¿ Ontem quando botei a cabeça no travesseiro, pensei: vamos para a guerra.

Para a guerra não, vamos para a luta.

Estava certa de que fiz tudo certo. Na hora de dormir e hoje cedo acordei confiante e muito animada para a luta.

À tarde, já em Brasília, Dilma descansou num hotel, para fugir um pouco do assédio da imprensa, depois foi para o Palácio da Alvorada, com o comando da campanha, para acompanhar a apuração.

Um dos participantes da reunião na Alvorada comentou: ¿ Não teve choro, mas também não se estourou champanhe.

* Enviada especial COLABORARAM: Demétrio Weber e Cristiane Jungblut