Título: Nas urnas, a incerteza
Autor: Braga, Isabel; Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 02/10/2010, O País, p. 3

Destino de milhões de votos em candidatos atingidos pela Ficha Limpa é indefinido

Sem uma definição clara da Justiça Eleitoral, é considerado incerto o destino dos milhões de votos que serão dados neste domingo a candidatos a governador, senador, deputado federal e estadual que estão com seus registros sub judice por causa da lei da Ficha Limpa. Na sessão de ontem, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não discutiu o assunto, e não há previsão de nova sessão hoje para resolver a questão. As dúvidas, que só deverão ser sanadas depois das eleições, ganharam uma nova polêmica: como o voto de quem tem ficha suja ficará em suspenso, sendo considerado nulo, eles serão transferidos para o partido ou coligação, ajudando a eleger aliados, ou simplesmente anulados?

Amanhã, os votos dados aos que concorrem sem registro, por força da lei da Ficha Limpa, não serão computados pelo sistema eleitoral, o que poderá causar grandes polêmicas. Especialmente em estados onde a disputa pelo governo é acirrada e a não divulgação dos votos de um candidato sub judice pode deixar em aberto se haverá ou não o segundo turno. O TSE decidiu que os TREs vão poder divulgar o resultado da votação desses candidatos. Mas os dados não estarão no sistema oficial de computação de dados do TSE.

"Isto é lamentável", diz procuradora

Entre os que têm problemas com o registro estão nomes conhecidos como os dos candidatos a deputado federal Paulo Maluf (PP-SP); ao Senado pelo Pará, Jader Barbalho (PMDB) e Paulo Rocha (PT); o líder do PP na Câmara, João Pizzolatti (PR), candidato è reeleição; e o tucano Cássio Cunha Lima (PSDB), ex-governador da Paraíba cassado no ano passado e que concorre nestas eleições ao Senado.

- Decisões de última hora trazem muita insegurança jurídica e isto é lamentável - afirmou a procuradora Silvana Battini, ao comentar a decisão do TSE.

No caso do ex-governador Anthony Garotinho (PMDB), que disputa uma vaga de deputado federal, os votos serão computados - ele conseguiu o registro eleitoral por liminar. A questão é que se o plenário do TSE cassar a liminar dada a ele pelo ministro Marcelo Ribeiro, a decisão do TRE do Rio volta a valer, e os votos dados a Garotinho amanhã serão anulados. Ele foi condenado este ano pelo TRE do Rio, que o tornou inelegível por três anos.

Está claro na lei que, se o puxador tiver seu registro definitivamente cassado depois de julgado os recursos contra a lei da Ficha Limpa, todos os votos dados a eles serão nulos. A dúvida é se os votos se perdem só para os puxadores ou para todos os que se beneficiarem de sua votação. Como há controvérsias no meio jurídico, o TSE terá que se manifestar sobre mais essa polêmica.

- O Garotinho está enquadrado na Lei da Ficha Limpa, mas conseguiu liminar suspendendo a decisão do TRE. Se o TSE cassar a liminar, os votos dele serão anulados. Para serem aproveitados, é preciso que o registro seja deferido definitivamente pelo TRE - afirma Silvana Battini.

A expectativa é que Garotinho consiga 700 mil votos, o que daria para eleger pelo menos mais meia dúzia de deputados pelo PR.

No caso dos que concorrerão com os registros cassados por conta da Lei da Ficha Limpa, três candidatos a governo estadual, oito ao Senado e dezenas de candidatos a deputado federal e estadual - boa parte deles puxadores de votos para seus partidos -, correm o risco de ter seus votos anulados se houver confirmação em decisão final dos registros.

Advogados eleitorais afirmam que a minirreforma aprovada ano passado no Congresso deixa mais claro que, se o registro eleitoral for indeferido, os votos são nulos e não irão para as legendas, como acontecia antes. A lei permitia, nos casos em que os registros fossem indeferidos depois da realização das eleições, que os votos fossem creditados à legenda do candidato impugnado.

- O artigo 16-A da lei das eleições, com a nova redação da minirreforma, é expresso: sem registro, os votos são anulados e não vão para a legenda. Matam a coligação. Essa foi a intenção da lei: afastar o malandro puxador de voto - afirmou o ex-ministro do TSE Torquarto Jardim.

Anteontem, os candidatos aos governos de Alagoas Ronaldo Lessa (PDT), e do Maranhão, Jackson Lago (PDT), tiveram seus registros liberados no TSE, mas o Ministério Público ainda deve recorrer ao STF.