Título: Abuso sexual infantil corre à margem de rodovias
Autor: Ribeiro, Marcelle
Fonte: O Globo, 07/10/2010, O País, p. 18

Pesquisa mostra que, nas estradas federais, há risco de exploração de crianças em 1.820 locais

SÃO PAULO. A Bahia e o Paraná são os estados em que há mais pontos onde a exploração sexual de crianças e adolescentes nas rodovias federais é crítica, segundo levantamento da Polícia Rodoviária Federal, da ONG Childhood Brasil, da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência. A pesquisa mostra que o país tem 1.820 locais em seus 66 mil quilômetros de rodovias federais onde há risco de crianças estarem sendo exploradas.

Esses pontos foram classificados em quatro graus: crítico (são 924 do total), alto (478), médio (316) e baixo (102). Como O GLOBO já mostrou, há rodovias em que crianças recebem R$ 1,99 para fazer sexo com motoristas de caminhão.

A exploração sexual nas rodovias federais não é tão articulada.

É uma rede menor, em que taxistas, frentistas e pequenos comerciantes oferecem os menores para usuários da rodovia afirma o chefe da Comunicação da Polícia Rodoviária Federal, Alexandre Castilho.

A Bahia tem 12,7% dos pontos críticos, seguida do Paraná, que tem 12,2%. Os cinco primeiros estados lista completada pelo Rio Grande do Sul, Minas Gerais e São Paulo detêm as maiores malhas viárias federais do país. O Rio aparece na 14aposição do ranking, com 30 pontos críticos. Considerando os quatro graus de vulnerabilidade, o Rio soma 98 pontos de exploração sexual infantil, e aparece em 8olugar, em ranking liderado por Paraná (168), Rio Grande do Sul (154) e Bahia (148).

Segundo a PRF, os locais mais vulneráveis para a exploração sexual infantil ficam em ambientes urbanos (67,5%), iluminados (79,5%), onde há consumo de bebida alcoólica (81,9%), com grande presença de caminhoneiros (76,1%), onde não há atuação de conselhos tutelares (73,6%) nem de vigilância privada (69,5%) e onde adultos se prostituem (69,3%). Observouse, ainda, que nessas áreas também são comuns a venda e o consumo de drogas e o tráfico de seres humanos.

Na análise por regiões, o Nordeste é a que tem mais locais com probabilidade de haver crianças e adolescentes sendo exploradas sexualmente: são 545. Em seguida, vêm o Sul (399), o Sudeste (371), o CentroOeste (281) e o Norte (224). As rodovias com mais locais de vulnerabilidade são duas das maiores do país: a BR-116 e a BR-101, que ligam as regiões Nordeste, Sul e Sudeste do país, e têm 262 e 187 pontos, respectivamente.

Considerando a malha de rodovias federais em cada estado, São Paulo é o estado em que a distância média entre cada ponto de vulnerabilidade à exploração infantil é menor, de 11,6Km.

Ou seja, no estado que tem 1.067,6 quilômetros de rodovias federais a exploração sexual é mais concentrada. O Rio aparece na 3aposição, com distância de 15,1km entre os pontos.

Este é o quarto levantamento sobre o assunto feito pela PRF, com ajuda de caminhoneiros.

Em 2003, foram detectados 844 pontos de vulnerabilidade e, em 2007, 1.819. O aumento, segundo a PRF, deve-se ao maior detalhamento da pesquisa. A corporação afirma ter prendido 951 pessoas em flagrante por abuso sexual infantil e encaminhado 2.036 crianças e adolescentes a instituições de atendimento, de 2005 a 2009.

A diretora executiva da Childhood Brasil, Ana Maria Drummond, elogia as políticas públicas para combater a exploração sexual infantil, mas acredita que falta integração dos órgãos governamentais nos locais onde o problema acontece.

A articulação tem que ser no terreno onde acontecem os problemas. A criança que foi explorada tem que contar oito vezes a sua história, não há integração dos serviços, da assistência social, da saúde afirma Ana Maria.

O chefe de divisão do combate ao crime da PRF, Moisés Dionísio, diz que a maior dificuldade encontrada no combate à exploração sexual infantil está relacionada à falta de conhecimento e engajamento da sociedade.

Às vezes, a sociedade não sabe que tem o Disque 100 para denunciar ou não tem interesse, ou não sabe que tem Conselhos Tutelares que ajudam.