Título: Assistência financeira ao exterior
Autor:
Fonte: O Globo, 12/10/2010, Opinião, p. 7

RUBENS BARBOSA

Um dos aspectos da política externa que pouco tem merecido a atenção dos analistas e estudiosos é o da assistência técnica e financeira prestada pelo Brasil a dezenas de países mais pobres, especialmente da África e da América Latina.

Essa ação é um dos desdobramentos da política Sul-Sul desenvolvida nos últimos oito anos pelo governo brasileiro.

O Brasil está se tornando um dos maiores doadores e prestadores de assistência técnica e financeira para os países mais pobres. Por meio de diversas formas de ajuda, o Brasil somente em 2010 teria se comprometido com mais de US$4,5 bilhões.

Segundo informações coligidas recentemente pelo ¿The Economist¿, os recursos utilizados nessa ação externa sobem a US$1,2 bilhão, superando o Canadá e a Suécia, tradicionais doadores e prestadores de ajudas aos países em desenvolvimento. Os recursos são oriundos da Agência Brasileira de Cooperação do Itamaraty, com cerca de US$52 milhões. De outras instituições de cooperação técnica, como Embrapa e Conab, saem US$440 milhões; para ajuda humanitária a países afetados por desastres naturais, US$30 milhões; recursos para a UNDP das Nações Unidas, US$25 milhões; para o programa de alimentação da FAO, US$300 milhões; de ajuda para a Faixa de Gaza, US$10 milhões, e para o Haiti, US$350 milhões. Implantamos escritório de pesquisas agrícolas em Gana; fazenda-modelo de algodão no Mali; fábrica de medicamentos antirretrovirais em Moçambique; e centros de formação profissional em cinco países africanos.

Os empréstimos do BNDES e agora do Banco do Brasil para os países em desenvolvimento subiram a mais de US$3,5 bilhões, entre projetos na América do Sul, no Haiti, Guiné Bissau, Cabo Verde, Palestina, Camboja, Burundi, Laos e Serra Leoa.

O Tesouro Nacional, por outro lado, aumentou sua exposição com o incremento de US$300 milhões da contribuição do Brasil para a Corporação Andina de Fomento e para o Fundo para a Convergência Estrutural do Mercosul, que sobe hoje a US$470 milhões, acrescido de US$100 milhões por ano, 70% representados por contribuições do Brasil.

Por outro lado, além de créditos de difícil recuperação concedidos a alguns países africanos, a Cuba e à Venezuela, o governo brasileiro, nos últimos anos, perdoou dívidas de Congo, Angola, Moçambique, Bolívia, Equador, Paraguai, Suriname e agora Tanzânia.

Até dezembro, coincidindo com o fim do atual governo, segundo se noticia, o governo brasileiro vai doar US$300 milhões em alimentos (milho, feijão, arroz, leite em pó) para, entre outros, Sudão, Somália, Níger e nações africanas de língua portuguesa. Serão beneficiados também a Faixa de Gaza, El Salvador, Haiti, Cuba. Segundo a Coordenação Geral de Ações Internacionais de Combate à Fome do governo federal, também receberam ajuda brasileira África do Sul, Jamaica, Armênia, Mali, El Salvador, Quirguistão, Saara Ocidental, Mongólia, Iraque e Sri Lanka

Pensando mais em considerações de política externa e menos nos interesses de alguns setores industriais afetados pela competição chinesa, pelo custo Brasil e pelo câmbio apreciado, o Itamaraty, na área comercial, procura ajudar os países de menor desenvolvimento relativo pela iniciativa de abrir o mercado brasileiro para produtos desses países com tarifa zero e sem quota.

No tocante a assistência técnica e abertura de créditos para obras públicas em países africanos e sul-americanos, a exemplo do que ocorre com os países desenvolvidos, as empresas brasileiras poderão vir a se beneficiar, ganhando concorrências para a prestação de serviços e exportando produtos brasileiros.

A generosidade externa é pelo menos controvertida. Enquanto a taxa de investimento interno é baixa, ao redor de 17%, o perdão dessas dívidas não está de acordo com a legislação brasileira. Sendo duvidosa a viabilidade de recuperação dos empréstimos do BNDES, não seriam esses recursos mais bem aplicados em programas de infraestrutura, de habitação, de energia, de alimentos e de tantos outros setores carentes de recursos?

A discussão sobre a prioridade do governo brasileiro nessa área fica para um próximo artigo.

RUBENS BARBOSA é presidente do Conselho de Comércio Exterior da Fiesp.