Título: No Brasil, artilharia do governo inclui IOF e mais intervenções no mercado
Autor: Duarte, Patrícia
Fonte: O Globo, 10/10/2010, Economia, p. 36

Para analistas e técnicos do Planalto, porém, câmbio flutuante é a melhor política

BRASÍLIA. Apesar de o Brasil ter adotado o regime de câmbio flutuante há mais de uma década, o governo tem atuado como nunca no mercado para evitar que o real se valorize ainda mais frente ao dólar. Na sexta-feira, a moeda americana fechou valendo R$ 1,667 no mercado brasileiro, portanto abaixo do piso informal de R$ 1,70. As medidas do governo englobam compras robustas da moeda americana no mercado à vista pelo Banco Central (BC), elevação de impostos para investimentos estrangeiros em renda fixa e mais poder de fogo ao Tesouro Nacional para também adquirir dólares.

Mesmo assim, especialistas e integrantes da equipe econômica não pensam duas vezes ao afirmar que o regime flutuante é, de longe, a melhor alternativa para manter a política econômica nos trilhos. Isso porque, apesar dos percalços, ajuda a amortecer os eventuais choques.

¿ O que está acontecendo hoje no Brasil é um reflexo do mercado mundial. O dólar está se desvalorizando frente a várias moedas por problemas nos países desenvolvidos, pelo excesso de liquidez. É uma questão para chefes de Estado resolverem ¿ resumiu uma alta fonte do governo, lembrando que este é um dos principais temas do encontro anual do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial (Bird), que acontece neste fim de semana nos EUA.

O Brasil tem atraído muitos investidores estrangeiros pela boa perspectiva de crescimento econômico ¿ previsto para 7,5% este ano ¿ e pelo fato de pagar um dos maiores juros do mundo (a taxa básica Selic está em 10,75% ao ano). De janeiro a agosto, entraram no país quase US$ 43 bilhões em ações, renda fixa e investimentos estrangeiros diretos. Esse cenário não vai mudar a médio prazo, avaliam os especialistas.

Emissões devem trazer mais US$ 20 bilhões este ano O governo estima que até o fim do ano o país deve receber mais US$ 15 bilhões a US$ 20 bilhões só com novas capitalizações e emissões de empresas brasileiras.

No aumento de capital da Petrobras, que aconteceu há poucas semanas e pressionou fortemente o dólar, entraram pouco menos de US$ 10 bilhões.

Com tantos recursos, o dólar já voltou para patamares pré-crise.

A cotação de R$ 1,667 de sextafeira passada é a menor desde 2 de setembro de 2008.

Mas, ao mesmo tempo, o próprio governo sabe que existe limite de atuação no câmbio. Por exemplo, o BC tem na manga a possibilidade de voltar a fazer leilões de swap cambial reverso ¿ que equivale a uma compra futura de dólares ¿, mas entende que esse mecanismo traz custos também. Por isso, neste momento, prefere esperar.

¿ Essas medidas (de atuação no câmbio) são paliativas ¿ resumiu um integrante da equipe econômica.

A saída para melhorar a situação cambial seria o governo adotar uma política fiscal menos expansionista, reduzindo seu consumo, defendem os especialistas.

Dessa maneira, o BC conseguiria diminuir mais a Selic e retirar pelo menos parte do apetite dos investidores de fora.

O Ministério da Fazenda discorda: acredita que o nível de gastos, que empurra o PIB, não deve ser sacrificado porque não é inflacionário. Além disso, defende que o BC deveria testar um novo patamar de juros. Descobriria, na avaliação dos técnicos, que as equações da autoridade monetária são defasadas e que uma Selic menor não aqueceria excessivamente a demanda.

¿ A solução é melhorar a política fiscal, reduzindo o consumo público ¿ defende o ex-presidente do BC Gustavo Loyola.

`Câmbio flutuante serve para isolar economia de choques¿ Ex-diretor de Assuntos Internacionais do BC e hoje economistachefe do Santander, Alexandre Schwartsman concorda com a avaliação e vai além. Para ele, sem o câmbio flutuante o país não teria condições de absorver choques externos sem pressionar a política monetária.

Ele citou como exemplo o recente crescimento das commodities no mercado mundial.

¿ O regime de câmbio flutuante serve para isolar a economia doméstica de choques positivos ou negativos ¿ afirmou.

No front externo, há um consenso de que a China é o problema principal neste momento porque, ao adotar o regime fixo e ter a segunda maior economia mundial, acaba trazendo distorções para as cotações das moedas.