Título: Causa dos juros altos está no governo
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Fonte: O Globo, 16/10/2010, Opinião, p. 6

O Comitê de Política Monetária (Copom) se reúne esta semana num momento em que as expectativas no mercado financeiro sobre a inflação em 2010 e 2011 se situam ligeiramente acima do ponto médio (4,5% ao ano) das metas estabelecidas pelo governo. De acordo com as análises prévias do Banco Central, existem mais razões para a manutenção das taxas básicas de juros nos atuais 10,75% ao ano do que para alterá-las.

Se por um lado a recuperação das economias dos países desenvolvidos tende a ser mais lenta, com pouca possibilidade de uma pressão de demanda que force para cima a maioria dos preços, por outro temos um quadro interno em que há cada vez menos contribuição da política fiscal no esforço de combate à inflação.

No último relatório de inflação, o Banco Central fez referência direta à polêmica em torno de qual seria o nível adequado (considerado neutro) de taxas reais de juros para o país, na presente conjuntura. A conclusão, compartilhada por parcela considerável do mercado financeiro, é que o Brasil, para conter a inflação dentro das metas, já não precisa pôr em prática juros reais tão elevados como os que foram necessários no passado.

O movimento de valorização do real, junto com várias outras moedas, frente ao dólar, é facilitado pela ainda expressiva diferença entre as taxas de juros vigentes no Brasil e as que predominam no mercado internacional, o que torna atrativa a aplicação de capitais financeiros voláteis em títulos de renda fixa no país, por exemplo.

O BC tem procurado absorver o excedente de divisas comprando quase que diariamente moeda estrangeira à vista no mercado brasileiro. O Tesouro também está autorizado a proceder da mesma maneira, assim como o Fundo Soberano.

Embora não reste alternativa ao BC neste momento, alguns especialistas acham que tal ação das autoridades equivale a "enxugar gelo", pois, de fato, não tem conseguido evitar a apreciação do real (ainda que se possa dizer que evitou uma valorização mais acentuada).

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, responsabiliza especialmente alguns países asiáticos por uma guerra cambial que estaria sendo travada no mundo, e por isso pede que os governos ajam de maneira articulada para estancar esse processo, pelo menos no âmbito do G-20. Por enquanto, as iniciativas para se neutralizar os efeitos dessa "guerra" têm sido isoladas, como fez o Brasil, ao dobrar para 4% a taxação de IOF incidente sobre capitais que chegam ao país para usufruir as aplicações de renda fixa. A Tailândia adotou medidas semelhantes na semana passada.

Como não é possível ficar esperando por essa articulação internacional, o melhor anteparo que o Brasil poderia ter para proteger o real seria uma política macroeconômica mais equilibrada.

Se as altas taxas de juros domésticas do Brasil são efetivamente o fator de desequilíbrio, é preciso agir mais sobre suas causas. Uma política fiscal que produz déficits primários mensais (ou superávits muito baixos) ao longo do ano certamente não abre espaço para a natural redução das taxas básicas de juros.