Título: Europa ajudará Estado do Rio a adotar modelo de gestão e reciclagem do lixo
Autor: Alencar, Emanuel
Fonte: O Globo, 16/10/2010, Economia, p. 38

Sistema português de separação de embalagens orientará governo e entidades

FÁBRICA SELENIS, de reciclagem de PET no Alentejo: trabalho manual não foi abolido, mas segue lei

INDÚSTRIA DE reciclagem portuguesa modernizada

A COMPOSTAGEM é uma das soluções adotadas

BRUXELAS e LISBOA. O Rio de Janeiro entrou na agenda mundial da economia verde e caminha para a adoção de um modelo de gestão de resíduos baseado na experiência bem-sucedida de mais de 20 anos da Europa. Durante o 5º Seminário do ProEurope (Organização Europeia de Recuperação de Embalagens), que terminou no último dia 8, em Bruxelas, autoridades europeias expuseram a dirigentes de órgãos ambientais fluminenses o interesse em ajudar o estado na implementação do projeto que engloba empresas de reciclagem de embalagens em 30 países da Europa, mais o Canadá.

Graças ao sistema, em 2009 foram recolhidas e recicladas 32 milhões de embalagens, evitando a emissão de 25 milhões de toneladas de CO2 equivalente. Na Europa, as indústrias assumiram há muito papel de protagonismo ¿ mas com sociedade, empresas e governos atuando de forma compartilhada. Por aqui, o assunto entrou na agenda econômica e ambiental com a aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos do Brasil, em maio.

A partir de agora as empresas precisarão se responsabilizar por seus resíduos. Mais do que isso, a nova legislação introduziu o modelo de logística reversa, que determina que fabricantes, importadores, distribuidores e vendedores realizem o recolhimento de embalagens usadas. Na Europa, a política de gestão compartilhada foi adotada oficialmente pela diretiva 94/62/CE do Parlamento Europeu, de dezembro de 1994.

Modelo adaptado a cada realidade regional

O ProEurope anunciou em Bruxelas que apoia a extensão de seu modelo ao Brasil, que já antevê problemas ainda maiores com o lixo urbano, em função da explosão do consumo. Diretor da entidade, Joachim Quoden afirma ver com bons olhos a expansão do modelo para além das fronteiras da Europa.

¿ Não temos uma proposta fixa, dada as diversas particularidades de nossos países. O Brasil é enorme e cada estado poderia formatar sua própria gestão. Rio, um modelo. São Paulo, outro. E assim por diante. Mas é extremamente importante a participação de todos os atores, empresas, estados e municípios. Todos devem formular a política juntos. Caso contrário, é queimar dinheiro ¿ alerta. ¿ Temos todo o interesse em discutir soluções com o Brasil. A ideia é adaptar o modelo, de acordo com cada realidade. Como é feito na Europa: metas comuns, definidas pela Comunidade Europeia, mas maneiras distintas de atingi-las.

Quoden aproveitou para mandar uma mensagem aos empresários brasileiros:

¿ Não tenham medo de apostar em uma política de sustentabilidade. No início pode ser mais custoso, mas os ganhos a longo prazo são muito mais significativos.

Ponto Verde: até 2011, 55% das embalagens recicladas

A maior esperança de que o sistema pode funcionar aqui vem da Sociedade Ponto Verde (SPV) de Portugal, fundada há 14 anos. A criação da entidade sem fins lucrativos, uma das ações do Primeiro Plano Estratégico de Resíduos Sólidos Urbanos (de 1996 a 2006), teve peso decisivo para mudar o panorama: a meta para 2011 é reciclar pelo menos 55% de embalagens do mercado português com metas especificas por material: vidro, papel/cartão, metal, plástico e madeira.

Com capital acionário dividido entre empresas embaladoras e produtoras, do comércio e da distribuição, a SPV é licenciada pelo Ministério do Meio Ambiente e está proibida de distribuir seu lucro aos acionistas. Cada embalador ou importador paga uma quantia anual à SPA ¿ o chamado Valor Ponto Verde ¿, calculado em função do peso e tipo de material das embalagens colocadas no mercado. Por meio de contratos com receptores e recicladores, a SPV assegura a destinação final correta destes materiais. Já são mais de nove mil empresas clientes que transferiram a obrigação legal à sociedade.

Os membros do ProEurope adotam modelos semelhantes, embora cada um mantenha particularidades.

Em 1996, Portugal vivia uma situação bastante semelhante com a atual fluminense: cada municipalidade contava com lixões a céu aberto (eram 341 ao todo) e não havia um sistema de coleta seletiva estruturado. Investimentos maciços da União Europeia e do estado português ¿ de 1997 a 2006 foram investidos 1,6 bilhão no país ¿ ajudaram Portugal a erradicar os seus lixões há nove anos.

¿ As empresas, no geral, têm duas opções: adotar um sistema próprio ou um integrado, como o nosso. A solução integrada é economicamente mais vantajosa ¿ explicou Luís Martins, presidente da organização e um dos palestrantes do ProEurope. ¿ Imagine a AmBev tendo que recolher as embalagens que comercializa no Estado do Rio para dar a elas um encaminhamento adequado?

O subsecretário de Desenvolvimento Sustentável da secretaria estadual do Ambiente, Gelson Serva, afirmou que a ideia é adaptar o modelo à realidade brasileira.

¿ Aprenderemos com os erros e os acertos cometidos na Europa. Os catadores não ficarão de fora da formulação do nosso sistema ¿ garantiu Gelson Serva.

(*) O repórter viajou a convite da Sociedade Ponto Verde

oglobo.com.br/economia