Título: Soja leva Luziânia à era da prosperidade
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Fonte: Correio Braziliense, 08/07/2009, Economia no DF, p. 32

O aumento da venda do produto para o mercado asiático e o boom no setor da construção civil fazem o município seguir na contramão da crise mundial e destoar da realidade da maioria das cidades do Entorno. Este ano, a produção da semente chegou a 366 mil toneladas

Luísa Medeiros Renato Alves

Fotos: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press Renato Pedro Faita, no galpão de sementes, onde estão armazenadas 42 mil sacas: ¿O custo de produção foi alto, mas a venda foi melhor do que no mesmo período do ano passado¿

Vantuil : ¿A cidade de hoje não é a mesma que a de cinco anos atrás¿

As cidades do Entorno são mais conhecidas por suas mazelas. A maioria sequer tem saneamento básico. Mas Luziânia, a 56km de Brasília, foge desse padrão. O município goiano de 200 mil moradores nunca viu tanto dinheiro. Na contramão da crise mundial, a cidade não para de receber investimentos. O setor da construção civil é o que mais prospera. Casas estão sendo derrubadas para dar lugar a edifícios. O mais emblemático é um de 32 andares, previsto para ficar pronto ano que vem. Será o mais alto prédio, o primeiro grande centro comercial e o primeiro residencial de alto padrão do lugar. Além das lojas, estão à venda apartamentos de até R$ 700 mil. Tudo isso é reflexo do aumento das exportações, em especial da soja e seus derivados, para países asiáticos.

Luziânia é a cidade goiana que mais exportou de janeiro a maio deste ano. No período, as vendas do município totalizaram US$ 118,55 milhões (cerca de R$ 230 milhões). Um aumento de 58% em relação aos cinco primeiros meses de 2008. À época, Luziânia ocupava a terceira posição entre as cidades goianas, atrás de Itumbiara e Alto Horizonte. Os números são da Secretaria do Comércio Exterior (Secex) do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic), que considera o domicílio fiscal das empresas exportadoras. No caso de Luziânia, estão instaladas multinacionais como Bunge e Multigran, compradoras de grãos da cidade e seu entorno ¿ o Vale do Pamplona ¿ e principais responsáveis pela venda externa.

As exportações do município goiano do Entorno se destacam também no cenário nacional. No mesmo período em que Luziânia cresceu 58%, as vendas externas brasileiras, como um todo, caíram 22%. ¿É um resultado bastante significativo. Crescer num momento em que a demanda mundial estava caindo não é fácil¿, afirma o secretário adjunto de Comércio Exterior do Mdic, Fábio Martins Faria. Segundo ele, a economia mundial está num processo de retomada e há prognósticos de crescimento para 2010, o que deve favorecer ainda mais os produtos concentrados em Luziânia. É nisso que apostam investidores, como os construtores do primeiro shopping center da cidade.

Sucesso de vendas Além das lojas de grifes famosas, o empreendimento terá duas torres residenciais, totalizando 32 andares (três de garagem subterrânea, três de lojas comerciais, dois de área coletiva residencial e 24 de apartamentos). A poucos metros da prefeitura, as obras de fundação estão em andamento. Já foram vendidos 80 dos 160 apartamentos, com 68 a 341 metros quadrados de área. Entre os clientes, 30% são produtores rurais e trabalhadores do setor. O restante são pessoas que trabalham em Brasília e buscam uma opção mais barata de moradia em relação à capital. ¿Nos últimos anos, houve um aumento da procura de imóveis. Isso tem a ver com o crescimento da agricultura da região. A proximidade com Brasília também estimula o desenvolvimento¿, diz Vantuil Guimarães Júnior, diretor da Suporte Engenharia, construtora responsável pela obra.

A construção civil em Luziânia cresceu 700% nos últimos três anos. ¿A cidade de hoje não é a mesma de quatro, cinco anos atrás. O comércio aumentou, os prédios estão surgindo, a cidade é outra¿, ressalta o secretário de Indústria e Comércio de Luziânia, João de Abreu. O varejo também sente a melhora na economia local. Sem saber nada sobre o movimento ascendente, a vendedora de lingerie Valciani Machado, 27anos, afirma que vendeu mais peças íntimas a partir de maio. ¿Em relação ao início do ano, vendemos mais peças. Acho que se está bom para eles (produtores rurais) melhora para a gente também¿, comenta. O superintendente de Comércio Exterior da Secretaria de Indústria e Comércio de Goiás, Joni Ronnie Pessoni, diz que o sucesso do município nas exportações irá garantir uma maior arrecadação de impostos locais e a geração de empregos. ¿É difícil o cidadão comum perceber, mas hoje a estrutura de Luziânia se diferencia das outras cidades do Entorno¿, destaca.

1- COMPLEXO DE SOJA A expansão das exportações de Luziânia este ano já aumentou em 79% a produção do complexo soja em relação aos primeiros cinco meses do ano passado. Foram produzidas 250 mil toneladas de janeiro a maio de 2008. Em 2009,o foram 366 mil toneladas. Ao todo, a cidade tem 54 produtores de soja de médio e grande porte.

Chineses são os maiores compradores

Os motivos que fizeram Luziânia se tornar polo de exportações de grãos vão desde as condições ambientais à abertura comercial de países emergentes. A proximidade das fazendas com rodovias que cortam o município, como a BR-040 (Rio-Brasília) e a GO-010, facilita a saída da produção para os portos secos de Goiás. Além disso, a despeito da crise mundial que abalou algumas economias, os países asiáticos mantiveram a compra de alimentos importados. Hoje, a China é o maior comprador individual do Brasil.

Os chineses têm forte presença em Luziânia. Eles compraram 37% da soja produzida na cidade do Entorno, nos primeiros cinco meses desse ano. ¿A demanda dos chineses não depende da economia. Apesar de terem grandes áreas, eles não têm clima favorável para as plantações de soja. Preferem produzir na indústria no que no setor agropecuário¿, explica o superintendente de Comércio Exterior da Secretaria da Indústria e Comércio (SIC) de Goiás, Joni Pessoni.

Alto custo A família de Renato Pedro Faita, 24 anos, fez parte da cadeia de exportação de soja em Luziânia. No galpão da Sementes Faita, há 42 mil sacas de 40kg de sementes de soja, oriundas da safra 2008/2009. Cerca de 90% estão vendidas. Em relação à produção de grãos, tudo foi para a multinacional Bunge, logo após a colheita, que ocorre em abril e maio. ¿O custo de produção foi alto mas a venda foi melhor do que o mesmo período do ano passado. Se há mais venda de grão há mais procura de semente¿, diz ele.

Para o próximo plantio, no entanto, não há previsão de uma significativa ampliação da área de plantio, até porque o produtor tem receio de investir, diz o presidente da Associação do Vale do Pamplona (Aprovale), Wilson Gonçalves.¿Os reflexos positivos da exportação não chegam aos agricultores e não vão mudar muita coisa. Tivemos uma produção muito cara na última safra com o aumento do preço dos insumos, como o adubo¿, justifica.

Os reflexos positivos da exportação não chegam aos agricultores e não vão mudar muita coisa.