Título: Brechas podem deixar investidores estrangeiros livres de IOF mais alto
Autor: Beck, Martha; Bôas, Bruno Villas
Fonte: O Globo, 20/10/2010, Economia, p. 28

Instrumento do BC contra subterfúgios ainda precisa ser regulamentado

BRASÍLIA e RIO. A decisão do governo de aumentar novamente a tributação para a entrada de capital estrangeiro no país pode não ser suficiente para deixar o mercado brasileiro menos atraente. Segundo técnicos da área econômica, é preciso esperar que o Banco Central (BC) decida como vai tratar as operações.

Uma das brechas a serem fechadas está na chamada margem de segurança ¿ recursos que os estrangeiros têm que depositar quando fecham contratos de dólar no mercado futuro (em que investidores apostam que a moeda estará a uma determinada cotação no vencimento do contrato e se comprometem a vender ou comprar moeda a este preço). O Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) incidente sobre essa margem subiu de 0,38% para 6%.

Cada contrato vale US$ 50 mil, com exigência de um lote mínimo de cinco contratos. Ou seja, o investidor precisa operar pelo menos US$ 250 mil. O problema é que tudo dependerá da forma como o aplicador ingressar no Brasil. A margem pode ser oferecida na forma de CDB, ouro, títulos públicos e até mesmo ações da Bolsa. Se ele entrar com dinheiro no mercado nacional, será tributado a 6%. No entanto, se utilizar ações, ele pagará apenas 2%, mesmo que os valores sejam destinados ao pagamento da margem de segurança.

João Medeiros, diretor da Pioneer Corretora, explica que 80% dos depósitos são em títulos e cartas de fiança, ativos não estão sujeitos ao IOF, porque os recursos já estão no Brasil.

Essa distorção pode ser corrigida caso o BC aplique uma regra pela qual os investidores tenham que simular uma ação de entrada e saída de recursos no mercado brasileiro (conhecida como câmbio simultâneo). Desta forma, é como se eles pagassem 2% com as ações, mas fizessem um novo contrato de câmbio que os obriga a pagar os 6% referentes à margem.

Segundo o subsecretário de Tributação e Contencioso da Receita Federal, Sandro Serpa, o decreto 7.330, que define o novo aumento da alíquota do IOF, já dá ao BC a prerrogativa de utilizar essa regra. No entanto, ela ainda precisa ser regulamentada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).

O governo também elevou de 4% para 6% o IOF que incide sobre os investimentos em renda fixa. Neste caso, o decreto também dá ao BC o poder de utilizar o câmbio simultâneo se o estrangeiro decidir entrar no Brasil para aplicar em ações e depois migrar para renda fixa.

Com o aumento do IOF anteontem, analistas previam uma redução dos negócios no mercado futuro da moeda, mas não foi o que ocorreu ontem. O mercado futuro de dólar movimentou R$ 3,835 bilhões, um volume acima da média.

O banco Barclays, em relatório, porém, disse que a nova alíquota pegou o mercado em um momento técnico de fragilidade, após a primeira elevação do IOF. O banco acredita que a medida vai ¿secar consideravelmente a liquidez do mercado¿: ¿Com o novo aumento de IOF, o governo está sinalizando que vai fazer custe o que custar para evitar a apreciação do real¿.

O diretor-presidente da BM&F Bovespa, Edemir Pinto, afirmou ontem que o governo não procurou a Bolsa para tratar sobre medidas no mercado futuro.

Pinto se disse ¿inconformado¿ com o aumento do IOF: ¿ Eu vi pelos jornais que governo falaria com a gente sobre duplicar margens do investidor estrangeiro. Conversamos ontem (segunda-feira), mas em nenhum momento se chegou a pedir esse tipo de iniciativa.

Lula: aumento do IOF foi para dificultar especulação Ao inaugurar seis hidrelétricas em Goiás, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que a nova alta no IOF tem como objetivo evitar a especulação.

¿ Tomamos a iniciativa de aumentar o IOF de 4% para 6% para que a gente facilite a entrada do dólar que venha direto para o setor produtivo e a gente crie dificuldade para o dólar apenas para aplicação na Bolsa ou especular.

Lula disse que somente em setembro entraram no país US$ 16 bilhões e que este fluxo forte de capitais ao país justifica o aumento da tributação.