Título: Falta pressão contra a moeda chinesa
Autor:
Fonte: O Globo, 24/10/2010, Opinião, p. 6
Para estancar a apreciação do real, o governo triplicou, no espaço de apenas algumas semanas, o imposto (IOF) incidente sobre a entrada de capitais estrangeiros destinados a aplicações de renda fixa no país. Também brechas que permitiam esses capitais participarem mais ativamente de operações no mercado futuro de câmbio foram fechadas.
Tais iniciativas fizeram o dólar reagir, voltando à cotação de R$ 1,70 já na última quinta-feira. Na sexta, também subiu. Mas é ilusão achar que o problema foi resolvido A valorização do real frente a outras moedas, em doses indesejáveis, não se resolverá apenas com essas medidas pontuais, pois esse movimento é acompanhado pelos demais países, em um segundo momento. Isso não significa que o Brasil deva ficar de braços cruzados, pois já se disse muitas vezes que o elevado patamar das taxas de juros do país é uma fonte de atração de capitais financeiros de curto prazo, que se beneficiam, no exterior, de financiamentos a custos muito baixos.
Para que essa taxa possa ser reduzida, sem comprometer o combate à inflação aqui dentro, o governo teria de adotar uma política fiscal menos expansionista, com gastos mais controlados. No entanto, não existem sinais de que isso já esteja ocorrendo.
Então, além de medidas pontuais, como o aumento do IOF, o governo tem privilegiado o front externo, clamando por uma articulação internacional capaz de acabar com a atual ¿guerra cambial¿.
Pelo fato de as exportações para a China terem crescido significativamente, especialmente as de minério, as críticas brasileiras estão mais voltadas às políticas das autoridades econômicas americanas no sentido de enfraquecimento do dólar. Essa desvalorização já era esperada diante da dificuldade que os Estados Unidos têm encontrado para revitalizar sua economia.
Os EUA acumularam um forte déficit comercial e agora esperam reduzi-lo, aumentando exportações e diminuindo importações. O mais natural é que isso acontecesse em relação à China e a outros parceiros comerciais asiáticos, que são os maiores responsáveis por esse déficit.
Entretanto, a moeda chinesa não reflete a situação de sua economia, superavitária tanto no comércio como no balanço de pagamentos como um todo. O yuan se valoriza em um ritmo inaceitável, o que já tem motivado uma onda de ações antidumping pelo mundo, pois o artificialismo faz com que os produtos chineses invadam os mercados por causa de preços considerados irreais, em face de não ser possível identificar os custos de produção.
Pressões isoladas contra a China não vêm surtindo efeito e podem até desencadear uma onda protecionista nos moldes da década de 30, estopim da Grande Depressão.
A gravidade do problema exige uma ação conjunta, articulada, como, aliás, o governo brasileiro defendeu. Mas, nessa ação, Brasil e Estados Unidos têm mais interesses comuns do que conflitos. Para ambos países é importante que a moeda chinesa se ajuste mais rapidamente: no caso americano, para que haja mais equilíbrio de sua balança comercial com a China; no caso brasileiro, para que o real consiga manter uma paridade que não inviabilize a produção de manufaturados no país.