Título: Jornalista que encomendou dados de tucanos é indiciado
Autor: Maltchik, Roberto
Fonte: O Globo, 26/10/2010, O País, p. 4

Acusado no escândalo do dossiê, Amaury responderá por quatro crimes

BRASÍLIA. Após seis horas e meia de depoimento à Polícia Federal, o jornalista Amaury Ribeiro Jr. foi indiciado ontem pelos crimes de corrupção ativa, violação de sigilo, uso de documentação falsa e pagamento de suborno a testemunha. Amaury é acusado de encomendar a quebra de sigilo fiscal de pessoas ligadas ao candidato do PSDB à Presidência, José Serra. Em seu quarto depoimento na PF, Amaury reafirmou que seu banco de dados particular foi furtado pelo coordenador de comunicação da campanha do PT, deputado estadual Rui Falcão (PT-SP), mas voltou a negar que tenha obtido o material ilegalmente.

Os quatro indiciamentos estão baseados em provas materiais e testemunhais obtidas pela PF no último mês. A principal foi o depoimento do despachante Dirceu Garcia, que admitiu ter recebido R$ 12 mil de Amaury para devassar o Imposto de Renda dos tucanos. Dirceu também disse que, em setembro último, ganhou mais R$ 5 mil do jornalista para ¿ficar calado¿ sobre as encomendas feitas por ele e consumadas nas delegacias da Receita em Santo André (SP) e Mauá (SP). As declarações de Dirceu foram confirmadas por cópias de extratos bancários, bilhetes aéreos e outros documentos.

As quebras de sigilo fiscal ocorreram nos dias 30 de setembro e 8 de outubro do ano passado, enquanto Amaury gozava férias no jornal ¿Estado de Minas¿.

Ao fim das férias, Amaury pediu demissão. Em abril deste ano, foi chamado pelo jornalista Luiz Lanzetta, da Lanza Comunicações, para trabalhar no núcleo de inteligência da pré-campanha de Dilma Rousseff. O núcleo só foi desfeito após sua existência ser revelada por reportagem da revista ¿Veja¿, em maio. O ¿Estado de Minas¿ nega ter pagado pelas incursões de Amaury a São Paulo.

No depoimento de ontem, o jornalista voltou a dizer que levantava informações há mais de dez anos sobre as privatizações ocorridas no governo Fernando Henrique. E que passou a buscar novos elementos depois que ficou sabendo, em 2007, da suposta existência de um grupo clandestino de inteligência comandado pelo deputado federal Marcelo Itagiba (PSDB-RJ) para espionar o então governador de Minas Gerais, Aécio Neves.

Porém, Amaury se valeu do direito de ficar calado para não responder a novas perguntas feitas pelo delegado Hugo Uruguai.

Ele foi questionado e não respondeu sobre sua ligação com Dirceu Garcia. A respeito do suborno ao despachante, Amaury apresentou como álibi documentos que comprovariam que estava em Manaus nas datas dos pagamentos, feitos em duas parcelas iguais, a partir de uma agência do Bradesco no mesmo prédio onde funciona a Lanza Comunicações, em Brasília.

Ao sair da PF, o advogado Adriano Bretas entregou à imprensa uma série de documentos supostamente levantados por Amaury durante investigações sobre as privatizações do governo passado. Na papelada, ele anexou 12 páginas de documentos confidenciais da CPMI do Banestado. Amaury diz que nos documentos há supostas irregularidades envolvendo pessoas ligadas ao PSDB. Os documentos citam transações financeiras que teriam sido feitas pelo ex-diretor do Banco do Brasil Ricardo Sérgio e por Gregório Marin Preciado, parente de Serra.

Ambos tiveram o sigilo fiscal violado em 8 de outubro de 2009, na Receita Federal de Mauá.

Em nota, Amaury disse que não tem ¿militância partidária¿ e apresentou um histórico profissional.

Em defesa apresentada à PF por escrito, disse que ¿rechaça, veementemente, qualquer responsabilidade criminal sua no episódio investigado¿ e ¿nega, terminantemente, que tenha praticado qualquer delito no lídimo desempenho de sua atividade de jornalismo investigativo.¿ Sobre o indiciamento, o advogado do jornalista afirmou que a decisão da PF é positiva.

¿ A defesa vê o indiciamento de forma positiva, porque agora as especulações a respeito do fato vão ser cessadas. Vai ser esclarecido que ele não cometeu crime algum. Ele ratificou que não houve da parte dele quebra ou encomenda da quebra de sigilo de quem quer que fosse ¿ disse Adriano Bretas.

Amaury era o único personagem ligado diretamente ao escândalo da quebra de sigilo que ainda não tinha sido indiciado.

Além dele, são investigados os despachantes Dirceu Garcia e Ademir Cabral, o contador Antônio Carlos Atella e a servidora do Serpro Adeildda Ferreira dos Santos. Sem data para a conclusão do inquérito, a PF informou que o relatório final deve ser concluído nos próximos dias.

¿ Amaury está sendo usado de bode expiatório para ocultar os fatos que ele apurou de forma lícita ¿ afirmou Bretas.