Título: O FMI não tem como administrar
Autor: Beck, Martha
Fonte: O Globo, 28/10/2010, Economia, p. 29

SÃO PAULO. É difícil que qualquer Banco Central do mundo aceite a intromissão do FMI em sua política monetária, diz o exdiretor da área externa do Banco Central Carlos Thadeu de Freitas. Recentemente, o FMI também pediu cooperação dos países para evitar a guerra cambial.

O GLOBO: Qual a possibilidade de o FMI conseguir apoio para um ajuste de moedas que evite uma guerra cambial no mundo? CARLOS THADEU: O Fundo Monetário não tem condições de administrar as desvalorizações das moedas porque isso significa administrar as políticas monetárias de cada país. E nenhum Banco Central vai abrir mão de administrar a sua política monetária.

Mesmo na época em que o Brasil precisava do FMI, nós nunca aceitamos que ele administrasse a nossa política monetária.

Mas qual seria o papel do Fundo? CARLOS THADEU: O máximo que o Fundo Monetário pode fazer é declarar que essas desvalorizações não funcionam e que, se cada um desvalorizar a sua moeda, todos vão perder. Eventualmente, o Fundo poderia estabelecer regras para intervenções cambiais e para controle de capital, mas aí estaria entrando na independência do BC de cada um. O pedido de quarentena, por exemplo, poderia ser uma saída honrosa para o FMI, mas na prática ele não consegue fazer isso.

Já que o FMI não tem poder para definir regras, o que poderia de fato fazer para ajudar a controlar a situação? CARLOS THADEU: O FMI poderia sugerir que fossem feitas intervenções de maneira conjunta para tentar valorizar o dólar. Houve intervenções no mercado de câmbio da Suíça e do Japão, mas foram intervenções isoladas.

O problema é que os Estados Unidos, principal acionista do Fundo, como já foi dito, têm a moeda fiduciária mais importante do mundo, querem emitir essa moeda e ninguém controla.

Um secretário de Tesouro americano disse uma frase que ficou famosa durante a mudança de paridade do dólar. Ele afirmou: a moeda é minha e o problema é de vocês. A mesma coisa acontece agora. A moeda é dos Estados Unidos e, se há a emissão de mais moedas, o problema é do resto do mundo.

Qual política poderia ser adotada pelos países para conter a queda do dólar? CARLOS THADEU: Os países com taxas de juros baixas são menos vulneráveis à entrada de dólares. Mas, para se ter isso, é preciso ter dependência menor do governo na captação de recursos no mercado. A primeira coisa é ter uma política fiscal mais arrumada.