Título: OMC já discute manipulação de moedas globais
Autor: Oswald, Vivian; Beck, Martha
Fonte: O Globo, 29/10/2010, Economia, p. 33

Problema é como estabelecer uso do câmbio como subsídio

BRASÍLIA. Diante da dificuldade de se encontrar armas de grosso calibre que possam combater a guerra cambial em nível global, as distorções nos valores das moedas internacionais já estão sendo discutidas nos bastidores da Organização Mundial do Comércio (OMC). O problema é como caracterizar manipulações cambiais como subsídios ao comércio. Oficialmente, não está claro se o organismo pode estender seus tentáculos para mais esse tema e ajudar o Fundo Monetário Internacional (FMI) a monitorar a questão.

A proposta brasileira de se criar dentro do FMI um índice que meça como o câmbio pode ser usado pelos países para favorecer suas exportações e, com isso, prever punições para o uso desse expediente por China, Coreia do Sul e os próprios Estados Unidos, entre outros, pode ser simples e eficiente em teoria. Na prática, pode levar anos para sair do papel.

¿ Saber se a OMC poderá atuar nessa matéria é a pergunta de um milhão de dólares ¿ diz um técnico da área internacional do governo.

O fato é que o temor de que a guerra cambial tenha desdobramentos protecionistas é mais real que nunca. Não é à toa que se buscam restrições comerciais para conter a manipulação das moedas. No passado, já foi possível caracterizar o uso de dumping cambial ¿ usar preços artificialmente baixos por meio da moeda. Mas isso foi antes da existência da OMC.

Especialistas questionam se ir à OMC seria vantajoso Criado para regular provisoriamente as relações comerciais internacionais, em 1947, portanto, antes da OMC, o Gatt (Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio) previa no artigo 15 que temas como reservas internacionais, balanço de pagamentos e manipulações cambiais poderiam ser levados ao FMI, que estava sendo criado à época.

O Gatt foi incorporado pela OMC. O artigo 15 continua valendo.

Esta é uma das brechas encontradas por especialistas para que a OMC possa entrar na questão do câmbio e, eventualmente, prever punições se provada a manipulação cambial para beneficiar exportações.

Mesmo que o tema passe à alçada da OMC, ainda seria preciso fazer uma análise caso a caso para saber se a valorização ou desvalorização cambial viola as normas ou se enquadra no conceito de subsídio ¿ benefício concedido por um governo a um setor ou produto.

Ainda que essas dúvidas sejam sanadas rapidamente, especialistas perguntam qual seria a vantagem de recorrer à OMC.

¿ De que adiantaria? A competitividade da China, por exemplo, não está só sobre a moeda desvalorizada ¿ diz o técnico.

Além disso, pelas regras atuais, nem todo subsídio é proibido.

É preciso que ele crie efeitos adversos em um país, que deve mostrar como foi afetado.

(Vivian Oswald e Martha Beck)