Título: Câmbio: índice do FMI ampliaria punições
Autor: Oswald, Vivian; Beck, Martha
Fonte: O Globo, 29/10/2010, Economia, p. 33
Proposta do Brasil ao G-20 tira foco da China. Para especialistas, porém, ideia tem poucas chances de se concretizar
BRASÍLIA e SÃO PAULO. A proposta do ministro da Fazenda, Guido Mantega, para que o Fundo Monetário Internacional (FMI) crie um índice para medir manipulação do câmbio ¿ a ser apresentada na próxima reunião do G-20, no início de novembro ¿ é uma forma de fazer com que todos os países envolvidos na atual guerra cambial sejam passíveis de punição, e não apenas a China, apontada como principal responsável pelos desequilíbrios no comércio exterior hoje.
Os Estados Unidos, que também têm trabalhado para manter sua moeda enfraquecida, foram os primeiros a falar em medidas na linha sugerida por Mantega.
A Câmara americana acaba de aprovar um projeto pelo qual o câmbio chinês poderia ser classificado como subsídio ilegal.
Mas, pela ideia do Brasil, as armas seriam voltadas para todos, inclusive os americanos.
¿ Os EUA só pensam em seus próprios interesses. Eles também querem tornar suas exportações competitivas como forma de recuperar a economia local da crise ¿ afirmou o ex-embaixador do Brasil nos EUA, Rubens Barbosa.
Politicamente, a proposta brasileira mostra que o país não pretende se furtar aos grandes debates globais e, assim como pautou a guerra cambial na agenda dos principais fóruns internacionais, não tem intenção de esperar que as quatro grandes economias do mundo resolvam tudo entre elas.
¿ É o Brasil tomando a frente novamente. Trata-se ainda de levantar a discussão e criar a responsabilidade de todos os países ¿ comentou um especialista do governo no setor.
Na visão de especialistas, embora a proposta brasileira tenha tudo para ganhar forte repercussão política, ela conta com poucas chances de se concretizar num acordo global, porque americanos e chineses não querem arriscar seus interesses. A China tem uma economia dependente de exportações, graças a um câmbio artificialmente desvalorizado, e uma mudança brusca nessa política provocaria uma crise doméstica, com aumento do desemprego. Já os EUA confiam nas vendas externas para recuperar sua economia.
¿ Existe um desequilíbrio estrutural na economia internacional e isso vai durar alguns anos ¿ disse Barbosa.
Para o professor de economia internacional da USP, Simão Silber, esse desequilíbrio só vai terminar quando a China conseguir reduzir a dependência do mercado externo.
Dólar fecha em queda de 0,46% e Bolsa cai 0,35% ¿ As chances de um acordo global em torno da proposta brasileira são mínimas. A China, por exemplo, será a principal interessada em não colocar o índice em prática. Ela sabe que teria de mudar seu padrão cambial, mas fará gradualmente para que não haja grandes impactos sobre sua economia.
O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, reafirmou ontem que o governo está atento ao risco de bolhas de ativos, por causa da forte entrada de dólares no Brasil.
¿ O BC continua tomando medidas no sentido de não permitir que o mais perigoso dos tipos de bolha se crie no Brasil, que é a impulsionada pelo aumento excessivo do crédito ¿ afirmou, na Câmara Americana (Amcham), em São Paulo.
Ontem, o dólar fechou em queda de 0,46%, a R$ 1,714. Já a Bolsa de Valores de São Paulo caiu 0,35%, aos 70.320 pontos.