Título: Crime requer um combate nacional
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Fonte: O Globo, 06/11/2010, Opiniao, p. 6

Foram oportunas as declarações de Dilma Rousseff, após as eleições, sobre violência e segurança pública, temas indissociáveis, objeto de preocupação em todo o país. A presidente eleita afirmou que a questão será enfrentada com prioridade no próximo governo. É imperioso, antes de tudo, que o tratamento a ser dispensado ao problema seja bem diferente da maneira superficial como ele foi abordado durante a campanha eleitoral.

A violência decorrente do banditismo é fruto de um conjunto de fatores, o principal deles a inexistência de uma real política nacional de segurança pública. Que pressupõe a integração entre a União e os governos estaduais e municipais. Compromisso da vitoriosa campanha de Lula para seu primeiro mandato de presidente, a proposta chegou a ser formalizada com a criação da Secretaria Nacional de Segurança ¿ mas, devido a razões políticas, acabou ficando pelo meio do caminho. A ideia de integração das ações de polícia em nível nacional foi retomada no segundo mandato da era lulista, mas é uma iniciativa que ainda se ressente da tibieza governamental com que é tratada.

Precisa ser implementada de fato, sob pena de levar ao fracasso esforços isolados para atacar pontualmente a violência e seu motor, o crime organizado. Disso é exemplo claro o Rio de Janeiro, estado com graves indicadores de agravos à segurança pública. O governo fluminense tem alcançado vitórias na guerra contra a criminalidade, notadamente no programa de resgate de áreas dominadas pelo tráfico de drogas e pelas milícias.

As Unidades de Polícia Pacificadora, instaladas em favelas até então subjugadas pela violência das quadrilhas, são um indiscutível êxito tático, na medida em que sufocam o tráfico de drogas e desmontam grupos paramilitares.

Mas, em não poucos casos, os criminosos expulsos acabam migrando para outros pontos do estado, e mesmo para outras unidades da federação, ou então recorrendo a outros tipos de crime, como assaltos a pedestres e arrastões no trânsito.

Se é imprescindível combater o crime na ponta onde ele se materializa, é igualmente fundamental que sejam atacadas as fontes que dão sustentação ao poder paralelo, como o tráfico de armas e a lavagem de dinheiro ¿ função precípua da Polícia Federal e dos organismos de segurança com abrangência nacional. Integrar as ações policiais, paralelamente a medidas que levem à modernização dos órgãos de segurança e de valorização de pessoal, são providências inescapáveis para que uma política de segurança seja bem-sucedida.

O combate à violência também requer ações em outras áreas. É inquestionável que se precisa prender mais, e aí reside um desafio e tanto para as polícias como para a Justiça.

Como exemplo, recente pesquisa feita no Rio mostra que, de 2000 a 2007, apenas 8% dos homicídios e 3% dos roubos resultaram em algum tipo de punição do Estado. Por outro lado, aumentando-se a produtividade policial e judicial, resta a dificuldade de se ter onde deixar aqueles que afrontam a lei ¿ o que implica reformar substancialmente o falido sistema penitenciário do país. Tudo está interligado.