Título: Atenção aos royalties do petróleo
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Fonte: O Globo, 07/11/2010, Opinião, p. 6

O governo Lula ainda pretende que a atual Câmara dos Deputados aprove a legislação relativa ao modelo de partilha para exploração e produção de petróleo em áreas não licitadas ou cedidas da chamada camada do pré-sal. Algumas emendas entraram como ¿contrabando¿ nesses projetos com objetivo de alterar completamente a distribuição dos royalties aos estados e municípios, incidentes sobre a produção de petróleo no mar.

É possível que o Congresso não tenha mais tempo para essa votação, pois há na pauta outras questões urgentes, como o Orçamento Geral da União para 2011 e várias medidas provisórias. O Congresso sofre um esvaziamento em fim de legislatura porque as atenções políticas ficam quase todas voltadas para a formação dos governos que tomarão posse em janeiro. Também vários parlamentares não conseguiram se reelegere se ausentam das sessões.

Mas, exatamente por essas características, é que existe o risco de, com um quorum baixo, deputados aprovarem, no apagar das luzes, a legislação frankenstein para o setor de petróleo.

O governo Lula tem interesse em aprovar o modelo de partilha, mas é contra as emendas que desfiguram completamente o acordo definido para distribuição dos royalties dos futuros campos do pré-sal. Em caso de aprovação das emendas, o presidente assumiu publicamente o compromisso de vetálas.

As emendas refletiram o ambiente pré-eleitoral, fértil para iniciativas demagógicas e irresponsáveis dentro do Congresso. Caso da encaminhada pelo deputado Ibsen Pinheiro (PMDB-RS).

A descoberta de reservatórios gigantes na camada do pré-sal de fato pode mudar as perspectivas da indústria do petróleo no Brasil. Estados e municípios não produtores reivindicam mais participação nas receitas que incidem diretamente sobre a produção de petróleo, e, como a União não aceita abrir mão da sua fatia (embora prometa investir mais com os recursos que vão compor o Fundo Social), a corda se rompeu no lado mais fraco, especificamente os estados do Rio de Janeiro e do Espírito Santo.

O avanço não se limitou aos contratos futuros, mas também aos já existentes ¿ em um claro desrespeito à Constituição, como demonstram pareceres irretocáveis elaborados a pedido da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro Da forma como estão, as emendas destroem a modesta capacidade de investimento que o Estado do Rio e o Espírito Santo recuperaram em anos recentes, o que configura um ato discriminatório e abusivo contra duas unidades da federação que enfrentaram ( e enfrentam) problemas sociais gravíssimos.

E o pior é que o argumento para a mudança no cálculo dos royalties se baseia no critério que o mar não faz parte dos territórios estaduais ou municipais. Depois disso houve o acidente com o poço da BP no Golfo do México e sabe-se agora muito bem as consequências ambientais e econômicas para as áreas mais próximas das zonas de produção.

O compromisso do veto precisa ser cumprido.

Não interessa ao país a deflagração de uma crise política decorrente da ruptura do pacto federativo, o que ocorrerá caso os direitos dos estados produtores sejam revogados, ilegalmente, no plenário na Câmara.

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