Título: Mais lucrativo que o Bird
Autor: Verdini, Liana
Fonte: Correio Braziliense, 12/07/2009, Economia, p. 15

Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social empresta cinco vezes mais e temrendimento 50% superior à do Banco Mundial

Coutinho, ex-diretor do BNDES: maior rigor nos critérios

O principal banco financiador de investimentos de longo prazo no Brasil, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, concorre em pé de igualdade com as maiores agências multilaterais de crédito do mundo. Embora tenha um patrimônio líquido menor do que o Banco Mundial (Bird) e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), por exemplo, o BNDES tem lucro maior e empresta muito mais (ver quadro). E o que faz um banco de fomento de um país de terceiro mundo ser mais efetivo e lucrativo do que instituições de atuação continental?

¿Quando se comparam os lucros e os desembolsos do BNDES com os de agências multilaterais, o resultado chama a atenção¿, reconhece Ernani Torres, superintendente da área de pesquisa e estudo do BNDES(1). ¿Mas precisamos observar que as agências emprestam para governos e para projetos de longo prazo. Estamos falando de operações de 15, 20, 25 anos. A instituição brasileira também faz empréstimos de longo prazo, como Itaipu, operação de 25 anos, mas há um volume considerável de financiamentos para compra de máquinas e equipamentos, que são de curto prazo.¿ Isso faz a carteira de empréstimos do banco girar com maior velocidade, aumentando os desembolsos e a lucratividade da instituição. Enquanto Bird e BID fazem operações com 15 e 25 anos, o prazo médio dos empréstimos do BNDES é de sete anos para os financiamentos via instituições financeiras.

O ex-diretor do BNDES Ruy Coutinho, hoje presidente da Latinlink Consultoria, destaca ainda outro ponto que contribui para o desempenho diferenciado da instituição. ¿O banco trabalha com critérios bem rigorosos para a aprovação das operações¿, ressalta. Coutinho lembra que os empréstimos de valor mais baixo são aprovados diretamente pelas instituições financeiras parceiras, recebedoras de repasses do BNDES. ¿Assim, o risco dessas operações é assumido inteiramente pelos bancos¿, conta ele. Para os grandes volumes, há diversos níveis de avaliação e aprovação, passando por comissões, comitês, grupos até chegar à diretoria. ¿Os critérios são bastante conservadores. Há ainda a exigência de garantias colaterais e pessoais que correspondem a 130% do valor da operação e mais o aval dos sócios da empresa, tudo para cercar os empréstimos de segurança.¿

Mercado de capitais Em relação ao lucro do banco, bastante diferenciado em relação ao das outras agências de fomento, o superintendente do BNDES ressalta uma especificidade da instituição. ¿O ganho do BNDES não está relacionado às operações de crédito, que não são muito rentáveis, mas sustentáveis financeiramente¿, avalia Ernani Torres. ¿O que faz toda a diferença são as operações no mercado de capitais.¿ Torres lembra que o banco está voltado ao desenvolvimento do mercado de ações no Brasil desde os anos 1970. Nesse período, uma das formas que o governo encontrou para capitalizar o banco foi dar ações de outras empresas. Além disso, algumas das operações de crédito previam a conversão do empréstimo em ações. O próprio desenvolvimento do mercado de capitais levou a uma valorização expressiva dos títulos de várias empresas, gerando um lucro substancial para o banco.

Um caso conhecido é o da Light, companhia de eletricidade da cidade do Rio de Janeiro. Em junho de 2005, a diretoria do banco aprovou a subscrição de debêntures conversíveis em ações no valor de até R$ 727,2 milhões. Inicialmente, era uma operação de renda fixa que rendeu TJLP mais 4%. No vencimento, o banco poderia converter em ações parte dos títulos desde que a empresa conseguisse a redução da perda de energia e o aporte de capital por parte do controlador. ¿Essa conversão seria ao valor de R$ 11 por ação. Na época, o papel estava cotado a R$ 7 na bolsa. No momento da conversão, a ação já valia R$ 24. Então, quando entramos emprestando e nos tornando sócios, temos um ganho como se fosse um adicional de sucesso¿, diz Torres. ¿E isso é muito lucrativo.¿

Faz coro com ele o ex-diretor do BNDES. ¿A atuação do banco no mercado de capitais tem trazido muita lucratividade¿, diz Ruy Coutinho. ¿A BNDESpar tem uma composição arrojada, e a instituição é sócia em várias empresas, inclusive em usinas de etanol.¿ Torres lembra que a carteira de ações do banco é muito diversificada e recheada de pérolas, como Petrobras, Vale, Eletrobrás. ¿O que fazemos é manter uma parte dessas ações guardadas para valorizar e outra parte nós giramos, vendendo e fazendo caixa.¿ E graças a isso, e à forma de gestão, em que ¿ninguém tem condições de sozinho aprovar uma operação grande¿, segundo Coutinho, o BNDES é o caso mais bem-sucedido de agência de fomento em toda a América Latina.

1- BNDES Órgão do governo federal, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social (BNDES) foi fundado em 1952, e hoje é o principal instrumento de financiamento de longo prazo para a realização de investimentos em todos os segmentos da economia, em uma política que inclui as dimensões social, regional e ambiental. O apoio do BNDES se dá por meio de financiamentos a projetos de investimentos, aquisição de equipamentos e exportação de bens e serviços.

Memória

1952 a Lei nº 1.628, de 20 de junho, criou o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), com o objetivo de ser o órgão formulador e executor da política nacional de desenvolvimento econômico. A meta era investir em infraestrutura. O setor agropecuário e as pequenas e médias empresas passaram a contar com linhas de financiamento do BNDE.

1964 descentralização das operações, com abertura de escritórios regionais em São Paulo, Recife e Brasília. Além disso, criou uma rede de milhares de agentes financeiros credenciados espalhados por todo o Brasil.

1971 vira empresa pública e ganha maior flexibilidade na contratação de pessoal, maior liberdade nas operações de captação e aplicação de recursos. Os setores de bens de capital e insumos básicos passam a receber mais investimentos.

1974 criação de três subsidiárias para atuar no mercado de capitais, de modo a ampliar as formas de capitalização das empresas brasileiras.

1982 fusão das subsidiárias e criação da BNDESpar.

1982 passa a se chamar Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

1983 lançamento de programa de estímulo às exportações.

1991 inicia o Programa Nacional de Desestatização

1993 estímulo à descentralização regional, com o incremento dos investimentos em projetos nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Setor de comércio e serviços começa a receber investimentos do banco. Preocupação com o meio ambiente ganha força, com a classificação do risco ambiental dos projetos. Início ao programa de microcrédito

1995 início de apoio ao setor cultural, com o investimento na produção de filmes e na preservação do patrimônio histórico e artístico nacional.

2006 passa a investir na economia da cultura, com financiamentos para todas as etapas de sua cadeia produtiva