Título: Nem cartão de crédito escapou de fraude
Autor: Duarte, Patrícia
Fonte: O Globo, 12/11/2010, Economia, p. 23

OO Banco Central (BC) encontrou indícios de fraude nas operações com cartões de crédito do PanAmericano, por meio de uma subsidiária do banco, informou ontem o presidente do BC, Henrique Meirelles. Segundo fontes ouvidas pelo GLOBO, a instituição não repassou às administradoras o pagamento das faturas feitas pelos portadores dos cartões. Do rombo total de R$ 2,5 bilhões descoberto no banco do Grupo Silvio Santos, as inconsistências na área dos cartões somaram cerca de R$ 400 milhões. Os R$ 2,1 bilhões restantes estavam nas carteiras de financiamento ¿ ativos já vendidos continuaram sendo contabilizados e uma mesma carteira foi vendida a mais de uma instituição.

Todas essas ações supostamente fraudulentas já foram cobertas com o empréstimo de R$ 2,5 bilhões feito pelo Grupo Silvio Santos junto ao Fundo Garantidor de Créditos (FGC).

O BC já comunicou ao Ministério Público Federal (MPF) que encontrou indícios de fraude nas operações do PanAmericano. As avaliações do BC sobre o ocorrido continuarão sendo feitas, mas o comunicado ao MPF já abriu caminho para que os responsáveis pelos problemas no PanAmericano possam ser punidos criminalmente.

Para Meirelles, o grupo do apresentador de TV Silvio Santos deve vender o PanAmericano para honrar suas dívidas com o FGC. Nos bastidores, no entanto, é esperado que o empresário tenha de se desfazer não só do banco, mas de boa parte de seu patrimônio empresarial, à exceção do canal de TV SBT.

Caixa esperou solução para indicar executivos

O contrato do empréstimo fechado com o FGC teria uma cláusula determinando a venda dos ativos, uma vez que não se espera que as empresas do grupo gerem caixa suficiente para honrar a dívida, ainda que esta tenha que ser paga em dez anos, com carência de três.

¿ É plausível se pensar que, para viabilizar recursos para pagamento de empréstimos, uma das medidas possa ser, certamente, a venda da participação acionária (do Grupo SS) no banco ¿ afirmou ontem Meirelles, que participou de audiência pública na Comissão Mista de Orçamento do Congresso Nacional.

O presidente do BC também informou que, se a Caixa Econômica Federal tivesse assumido sua gestão no PanAmericano antes dos acertos feitos entre o Grupo SS e o FGC, ela também acabaria se tornando responsável pelo rombo.

A Caixa pagou R$ 739,2 milhões por 49% do PanAmericano, numa transação concluída em julho passado. Em agosto, quando o BC descobriu as irregularidades, a estatal ficou sabendo dos problemas contábeis no PanAmericano. Então, esperou que os problemas fossem resolvidos para indicar seus executivos.

O objetivo foi evitar que esses profissionais fossem considerados também responsáveis pelas supostas fraudes.

Meirelles foi firme na defesa da atuação da autoridade monetária no caso, apesar de o BC ter detectado as irregularidades que originaram o rombo de R$ 2,5 bilhões no PanAmericano somente depois da aprovação da compra pela Caixa de participação no banco.

Segundo o próprio BC, essas operações podem estar acontecendo há três ou quatro anos.

¿ Nenhum banco central do mundo pode assumir responsabilidade futura, garantir que todas as instituições do sistema não têm problema algum. O governo federal estaria assumindo um passivo contingente de proporções incomensuráveis, na medida que dá garantias de gestão e de patrimônio a todas as instituições financeiras ¿ defendeu ele.

Meirelles disse ainda que o BC agiu ¿a tempo e na hora¿ para solucionar os problemas do PanAmericano e sem usar ¿um centavo de dinheiro púbico¿. Além disso, o rombo no banco não causou prejuízo nem aos depositantes nem aos acionistas minoritários, argumentou.

¿ A grande conclusão é que (o problema) foi solucionado. Sem o uso de nem um único centavo público ¿ afirmou Meirelles, que também se encontrou rapidamente com o presidente do Senado, José Sarney (PMDB). ¿ Quem perde, em última análise, é o sócio controlador (Grupo SS).

Em meio à intensa movimentação de funcionários do banco PanAmericano, que ocupa todo o edifício número 2.240 da Avenida Paulista, na esquina com a Rua Bela Cintra, a maioria dos clientes que passou ontem à tarde pela agência tratava de dívidas.

¿ Se falir não estou nem aí. É até melhor, quem sabe minha dívida não desaparece junto ¿ brincou o cliente Edson, que não quis informar o sobrenome

`A gente sempre fica preocupado¿, diz cliente

De terno e gravata, voltando do almoço, um dos funcionários do banco, que não quis se identificar, disse que o maior movimento é de pessoas que vão tratar de empréstimos, seja concessão ou pagamento, principalmente renegociações de dívida.

¿ Quem vem aqui é porque está precisando.

Está precisando de dinheiro e quer fazer empréstimo, ou está precisando pagar e não tem dinheiro ¿ resumiu.

O empresário Antonio Paulo Rodrigues de Souza, dono de uma marmoraria na Zona Leste da capital paulista, foi pagar uma prestação do financiamento de uma caminhonete e mostrou-se preocupado com a situação do PanAmericano: ¿ A gente sempre fica preocupado com essas coisas. Banco é banco, não é? Ajuda, mas cobra, e muito, por isso. Mas esse lado de ajudar, na hora em que a gente precisa, é sempre bom. Tomara que eles saiam dessa.

Aos 69 anos, a aposentada Laura Akemi Watanabe garantiu sempre ter pago em dia os empréstimos com o banco, por isso estava tranquila e sem qualquer expectativa sobre um desfecho desfavorável para Silvio Santos.

¿ Aproveitei que tinha de vir aqui para esse lado da Avenida Paulista e vim pagar o meu empréstimo. Parece que está tudo normal, sem qualquer alteração. Os funcionários estão atendendo como sempre fazem, e não há nada de diferente ¿ disse.