Título: Dança das cadeiras nas estatais
Autor: Bôas, Bruno Villas
Fonte: O Globo, 14/11/2010, Economia, p. 35

Mudança de governo abre disputa por 161 cargos em diretorias e conselhos de empresas, cujos salários somam R$ 63 milhões por ano A disputa por cadeiras em cargoschave das maiores empresas estatais e bancos públicos brasileiros envolve, além do controle político sobre investimentos e crédito, uma engrenagem que vai pagar somente este ano mais de R$ 63,6 milhões em salários e benefícios para diretores e conselheiros de oito das principais companhias federais.

Na queda de braço entre PT, PMDB e a base aliada do novo governo para ocupar postos estratégicos, estão em jogo 83 cargos de diretorias (incluindo presidências e vice-presidências) e 78 assentos em conselhos de Administração e Fiscal em estatais como Petrobras, Eletrobras, Banco do Brasil (BB) e Caixa Econômica Federal. Outras estatais também estão na mira de partidos, como BNDES e subsidiárias da Eletrobras, responsáveis por grandes projetos de infraestrutura.

Levantamento do GLOBO sobre a remuneração das principais estatais mostra que alguns desses futuros nomeados vão receber salários polpudos, que chegam a superar R$ 1,4 milhão ao ano na Petrobras e R$ 870 mil anuais no Banco do Brasil. Para políticos, as nomeações significam poder.

Para os executivos apoiados pelos partidos, um atalho para remunerações ainda maiores que a iniciativa privada vai pagar quando deixarem um cargo de relevo no governo.

¿ É um custo alto e uma responsabilidade grande para executivos que muitas vezes são colocados no cargo para cumprir alguma missão política, e que nem sempre estão ali para defender os interesses da empresa pública ¿ afirma Gil Castelo Branco, fundador da ONG Contas Abertas.

¿ Claro que não são todos assim, mas a sociedade precisa ficar atenta.

Menina dos olhos de políticos por causa do pré-sal, a Petrobras ¿ que investirá US$ 224 bilhões até 2014 ¿ está no centro dessa disputa. Sete executivos que ocupam salas no 23oandar do edifício-sede da companhia, onde ficam as diretorias da estatal, são funcionários de carreira apoiados nos cargos por PT e PMDB. Recebem em média R$ 1,4 milhão por ano, incluindo salários e benefícios. No rearranjo político, uma nova diretoria deve ser criada na estatal apenas com o objetivo de acomodar o PMDB: a diretoria de Gestão, que ficaria responsável pela área jurídica e de comunicação.

Nos bastidores da Petrobras, é dado como certo que o PT vai manter a presidência da companhia, atualmente ocupada por José Sergio Gabrielli. Ele foi candidato a deputado federal em 1982 e ao governo da Bahia em 1990, sempre pelo PT. Há quem aposte no nome da atual diretora de Gás e Energia da Petrobras, Maria das Graças Foster, para o cargo. Ela é ligada à presidente eleita Dilma Rousseff e também é cotada para ministra-chefe da Casa Civil.

Para o advogado João Geraldo Piquet Carneiro, ex-presidente da Comissão de Ética Pública da Presidência da República, a nomeação política para cargos de presidência e diretoria das estatais não deveria ser um problema, porque faz parte do modelo democrático brasileiro de presidencialismo por coalizão.

¿ A questão é o uso permanente de indicações que não atendem a critério técnico algum ¿ afirma.

No Banco do Brasil, mais benefícios

Ex-coordenador do Programa Nacional de Desburocratização nos anos 80 e profundo conhecedor da administração pública, o advogado defende a criação de um órgão central responsável por avaliar nomes indicados por partidos.

Segundo melhor pagador de salários e benefícios, o Banco do Brasil será outra importante arena de disputa. Um diretor da instituição ganha em média R$ 870 mil por ano. E são 37 deles, segundo dados informados à Comissão de Valores Mobiliários (CVM). O PT quer manter seu atual peso dentro da instituição, que tem uma carteira de crédito de R$ 135,6 bilhões. Mas o presidente do banco, Aldemir Bendine, pode deixar o posto e abrir espaço para uma nova queda de braço.

O mesmo ocorre na Caixa, onde a disputa entre PT e PMDB envolve a presidência e 11 vice-presidências do banco, responsável pelo programa de crédito ¿Minha Casa, Minha Vida¿. Os diretores recebem em média R$ 438.708,08 em salários e benefícios por ano, informou a própria empresa.

¿ Os políticos certamente não vão contratar headhunters para procurar profissionais no mercado para preencher essas e outras cotas ¿ acredita Creomar Lima, analista político do IbmecDF. ¿ As lideranças costumam buscar dentro de suas bases nomes que trabalham nas estatais para alçar a um cargo de presidência e diretoria.

Os Correios são o caso mais emblemático.

A diretoria da estatal foi relacionada a uma série de escândalos nos últimos anos. Foi a única estatal procurada pelo GLOBO que não passou, mesmo que parcialmente, dados de remuneração de diretores e conselheiros.

Os Correios informaram que não concedem ¿esse tipo de informação por normas da empresa e baseado em orientações do Ministério das Comunicações¿. Mas o ministério negou que exista essa recomendação.

Já o BNDES informou apenas parcialmente os dados pedidos pelo jornal, enviando a remuneração mensal de conselheiros de Administração. Sobre os ganhos de diretores, alegou que ¿a instituição não torna pública a remuneração de nenhum de seus funcionários porque entende que essa divulgação violaria o direito à intimidade constitucionalmente assegurado¿.

Mas o próprio BNDES divulga em seu relatório anual de gestão o ganho médio de administradores e o maior salário, que supõe-se ser de Luciano Coutinho, presidente do banco, no valor de R$ 611 mil por ano, incluindo o décimo terceiro. Na média, cada diretor recebe R$ 269.100 anuais.

Uma possível nomeação de Coutinho para o Ministério da Fazenda ou o Banco Central também pode abrir espaços para disputa.

Nos conselhos das estatais, os jetons variam de R$ 25 mil a R$ 86 mil no acumulado de um ano. Os valores variam de acordo com a frequência das reuniões dos conselhos: uma vez por mês ou trimestre. Mas a estatal que melhor paga benefícios a conselheiros é a Itaipu Binacional, onde cada um ganha R$ 14 mil mensais para ir a uma reunião por mês segundo levantamento do deputado Arnaldo Madeira (PSDB-SP). Até a última sexta-feira, permanecia no conselho o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, apesar das denúncias de crimes na Cooperativa Habitacional dos Bancários (Bancoop) de São Paulo. O advogado de Vaccari e Itaipu foram procurados pelo jornal e não responderam.