Título: Crianças, pretos e mulheres: as maiores vítimas
Autor: Garone, Raimundo; Perboni, Juraci
Fonte: O Globo, 27/11/2010, Economia, p. 40

Entre os idosos, apenas 3,6% estão tão próximos da fome

RIO e TERESINA. A fome no Brasil atinge mais as crianças, as mulheres e os pretos. Entre os brasileiros com até 4 anos de idade, 7,5% sofrem de insegurança alimentar grave. Na faixa etária de 5 a 17 anos, 8,3% estão nessa situação. Entre os idosos (65 anos ou mais), apenas 3,6% estão tão próximos da fome. Nos domicílios onde há crianças e adolescentes (até 18 anos), há insegurança alimentar grave ou moderada em 17,5% dos que são chefiados por mulheres - quando o homem é o chefe da família, cai para 11,5%.

Mas é na cor que a diferença é mais gritante. Entre os brancos, a insegurança moderada ou grave está em 7,5% dos domicílios. Entre os pretos, isso é mais que o dobro: 19,2%.

Na casa de Juliana Fernanda da Silva, de 5 anos, em São Domingos, na zona rural de Teresina, o almoço, na quinta-feira passada, era feijão e arroz. O jantar, incerto: a despensa tinha um pouco de arroz e flocos de milho para o cuscuz do café da manhã seguinte. Sua mãe, Maria de Fátima da Silva, de 40 anos, é negra e solteira. Na casa vivem ainda as irmãs de Maria de Fátima, Ana Maria Ferreira da Silva, de 49 anos, e Maria Anezina, de 23 anos. Todas sem renda.

- Quando cortaram meu benefício depois que um perito do INSS disse que eu estava boa para trabalhar, ficamos comendo e vivendo da ajuda dos meus irmãos - conta Ana Maria.

- Me dói muito quando minha filha quer tomar café com cuscuz e manteiga. Ela gosta muito de manteiga. Nós dizemos que não podemos comprar e ela já está se acostumando - disse Maria de Fátima.