Título: Força-tarefa busca restos de mortos na ditadura
Autor: Suwwan, Leila
Fonte: O Globo, 03/11/2010, O País, p. 13

Escavações podem encontrar ossadas de até dez desaparecidos, incluindo Virgílio Silva, o Jonas

SÃO PAULO. Uma força-tarefa formada por autoridades federais e estaduais iniciou ontem escavações no cemitério da Vila Formosa, na Zona Leste da capital paulista, para tentar localizar os restos mortais de até dez desaparecidos políticos. Um deles é Virgílio Gomes da Silva, sindicalista e químico, que, durante o regime militar, lutou contra a ditadura combatendo com o codinome de Jonas. Ele foi preso, torturado e morto em 1969.

Com a ajuda de uma escavadeira, a equipe abriu um "sítio" num lote que teria sido usado como uma "vala comum", e onde teriam sido depositadas ossadas sem registro durante uma reformulação do cemitério nos anos 70. O local pode ter servido para esconder ossadas dos desaparecidos e, depois, foi cimentado e se tornou um canteiro.

No outro ponto de escavação, os técnicos localizaram à tarde sepulturas ocultas, que ajudarão a esquadrinhar a configuração original dos túmulos da quadra onde Virgílio pode estar enterrado, segundo documentos obtidos por sua família. Numa segunda etapa, que deve ocorrer ainda esta semana, serão abertas sepulturas em quatro pontos da quadra, que podem corresponder ao local onde o sindicalista foi enterrado, supostamente como indigente.

- Temos esperança de localizar os restos de Virgílio. Desde que foi preso, em 1969, só tivemos a certeza da morte em 2004, quando apareceu o laudo. Espero que agora possamos ter um desfecho - disse a viúva Ilda Martins da Silva, que também foi presa e torturada em 1969. - Fiquei presa nove meses, quatro deles incomunicáveis e longe de meus quatro filhos.

O grupo, formado pelo Ministério Público em São Paulo, a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos, o Instituto Nacional de Criminalística (INC) da Polícia Federal e o Instituto Médico-Legal (IML) de São Paulo, estima que as escavações se estenderão por toda a semana.

- A expectativa é chegar à profundidade onde estariam os restos e descobrir se as ossadas foram despejadas ou se estariam separadas, ensacadas. Já será um grande passo nesta etapa - disse a procuradora da República Eugênia Gonzaga a respeito da busca da vala identificada no começo do mês.

Um radar geofísico que detectou uma estrutura com paredes, de cerca de nove metros quadrados.

Descaracterização de cemitério ocorreu em 1975

No outro local, técnicos da Polícia Federal, com ajuda do procurador regional da República Marlon Alberto Weichert localizaram e identificaram uma fileira de sepulturas antigas, onde hoje existem um canteiro e a pista de circulação interna. A escavação de um local escolhido a partir de fotografia aérea de 1972,encontrou ossos humanos, madeira, tecido e alça metálica de caixões. A partir da análise dessas sepulturas, será feito um mapa com as coordenadas originais dos túmulos da antiga quadra 50, que hoje é a quadra 47.

- A quadra foi reduzida. Precisamos reconstruir o mapa original da quadra para chegar até a provável sepultura - disse Weichert.

A descaracterização do cemitério da Vila Formosa em 1975 repetiu o processo de ocultação de cadáveres que ocorreu no cemitério de Perus.