Título: Espionagem cubana a serviço de Caracas
Autor: Maltchik, Roberto; Carvalho, Jailton de
Fonte: O Globo, 01/12/2010, O Mundo, p. 39

Documentos revelam que funcionários da ilha têm acesso a Chávez e vigiam americanos

MADRI. A implantação dos serviços de inteligência cubanos na Venezuela é tão profunda que desfrutam de "acesso direto" ao presidente Hugo Chávez e, muitas vezes, fornecem a ele informações não compartilhadas com os serviços de inteligência locais, segundo indicam telegramas enviados ao Departamento do Estado pela Embaixada dos EUA em Caracas.

"Relatórios indicam que os laços da inteligência entre Cuba e Venezuela são tão estreitos que essas agências parecem competir para conseguir a atenção do governo bolivariano", indica um documento de 30 de janeiro de 2006.

Quatro anos depois deste despacho, Havana continua sua espionagem ativa no centro da coligação cubano-venezuelana. A confiança de Chávez na competência dos agentes de Cuba explica o fato de a Direção de Inteligência Militar (DIM) e os Serviços de Inteligência Bolivarianos terem respondido a indicações cubanas durante importantes operações de inteligência, segundo telegrama datado de janeiro deste ano. Os cubanos também teriam acesso a serviços de imigração responsáveis por documentar estrangeiros e controlar sua localização e movimentos. Um despacho da embaixada em Bogotá refere-se à reunião do então chanceler colombiano Mauricio Acero com um funcionário consular, que alertou sobre a obtenção fraudulenta da nacionalidade colombiana por centenas de estrangeiros.

"Acero sugeriu que alguns cubanos (tentariam obtê-la) para escapar do regime e outros poderiam usar a nacionalidade colombiana para executar operações secretas de inteligência".

O Exército venezuelano parece ser uma instituição menos "cubanizada". O escritório diplomático de Caracas diz não ter recebido nenhuma informação de intervenção significativa dos cubanos entre os militares, exceto pela guarda militar que acompanha Hugo Chávez.

Diplomatas americanos programaram tour de propaganda na Venezuela

A embaixada pede fundos para melhorar a imagem dos EUA na Venezuela, positiva hoje para apenas 31% da população. Diplomatas americanos programaram um tour de propaganda pelo país para tentar modificar as percepções e juízos negativos sobre os EUA. Não surpreende então a preponderância da aliança Chávez-Castro nos informes transmitidos a Washington.

"O impacto da penetração de Cuba nos serviços de inteligência venezuelanos poderia afetar diretamente os interesses dos EUA, já que os serviços de inteligência venezuelanos figuram entre os mais hostis em relação aos EUA, mas lhes falta a destreza que os cubanos podem ensinar" - diz um telegrama.

Sendo o mundo da espionagem opaco por definição, não foi possível confirmar por fontes independentes a influência cubana no núcleo do governo venezuelano - frequentado com regularidade pela elite política de Cuba, como o comandante Ramiro Valdés, fundador do Ministério do Interior após a revolução. A embaixada não descarta que o companheiro de Fidel Castro na Serra Maestra tenha aplicado em Caracas seus amplos conhecimentos políticos.

O alerta permanente dos EUA em Caracas leva ao reforço das medidas de segurança, que são executados após a constatação de que funcionários da missão diplomática são espionados "por meios técnicos e contatos pessoais de outros tipo", por uma equipe de venezuelanos sob o controle cubano, segundo um telegrama de janeiro deste ano. O autor afirma que a prioridade destas operações são os opositores, mas que a inteligência local também tem capacidade e vontade de controlar o pessoal da embaixada. A seqüência de documentos confidenciais certificam a preocupação dos EUA sobre a presença na Venezuela de cerca de 40 mil cubanos, alocados em diferentes ministérios e setores do governo local, em sua maioria, médicos e enfermeiros.