Título: Resultado excepcional
Autor: Nunes, Vicente
Fonte: Correio Braziliense, 15/07/2009, Economia, p. 13

Para IBGE, recuperação do varejo nacional demonstra força. Setor brasileiro reage melhor à crise que o dos demais países emergentes.

Embaladas pelo aumento de 3,4% no rendimento real dos trabalhadores, as vendas do comércio varejista registraram crescimento de 0,8% em relação a abril (as estimativas do mercado variavam entre queda de 0,4% e alta de 0,9%), interrompendo dois meses consecutivos de retração. Nove de dez setores pesquisados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontaram expansão. Com esse resultado, as vendas no ano acumulam elevação de 4,4% frente a igual período de 2008. Saldo que, segundo Nilo Lopes, técnico IBGE, deve ser classificado como ¿excepcional¿ por ter resistido aos impactos da crise mundial e ser calculado sobre uma base de comparação muito elevada ¿ no ano passado, o comércio crescia a taxas próximas de 10%.

Mesmo nos setores mais dependentes de crédito, como o automotivo e o de materiais de construção, que compõem o varejo ampliado, as vendas tiveram incremento de 3,7% em maio ante abril e de 3,3% sobre maio de 2008. ¿Ainda que a oferta de financiamentos aos consumidores não tenha voltado aos níveis de antes da crise, as vendas de carros e de materiais de construção responderam muito bem à decisão do governo de reduzir o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) desses produtos¿, disse Lopes. O mesmo raciocínio vale para os eletrodomésticos, que saíram de uma queda de 2% em abril para uma ligeira alta de 0,1% no mês seguinte.

Na avaliação da economista-chefe do Banco ING, Zeina Latif, dificilmente o varejo reverterá esse quadro positivo até o fim do ano. Primeiro, porque a inflação tende a se manter sob controle, preservando o poder de compra das famílias, ponto fundamental para o grupo supermercados, hipermercados, alimentação, bebidas e fumo, que responde por quase 45% do cálculo da Pesquisa Mensal do Comércio (PMC). Segundo, porque não se espera uma nova onda de desemprego ¿ na verdade, as contratações já voltaram a superar as demissões. Terceiro, porque os juros estão em queda e o crédito à pessoa física está retornando aos níveis pré-crise.

¿Realmente, está surpreendendo muito o comportamento firme da demanda, contrariando as expectativas mais pessimistas¿, disse Zeina. Ela ressaltou que a surpresa fica maior quando se compara os resultados do varejo brasileiro com os de outros países de economias emergentes. Enquanto as vendas do comércio ampliado aumentaram 3,3% em maio em relação ao mesmo mês de 2008, no Chile, houve contração de 1,6% e, na Nova Zelândia, de 1%. Já na Polônia, o comércio cresceu 1% e, na Coreia do Sul, 5,1%.

Se a comparação tiver como base o mês de abril ¿ pois os dados disponíveis de muitos países vão até esse mês ¿, o quadro continua favorável ao Brasil, com queda de 0,8%. No Chile, o recuo nas vendas atingiu 5%; na Colômbia, houve queda de 7,1%; na Hungria, o encolhimento foi de 4,1%; no México, de 5,8%; na Rússia, de 5,6%; e, na África do Sul, de 6,7%. Polônia e Coreia apontaram, respectivamente, expansão nas vendas do varejo de 1% e 0,6%. ¿Isso mostra o quanto o varejo brasileiro está se saindo melhor nessa crise¿, assinalou a economista do ING.

Particularidades Segundo o presidente da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL), Roque Pellizzaro, esse comportamento diferenciado decorre de características particulares do varejo brasileiro. ¿Em mais de 5 mil municípios do país, o comércio é dominado por pequenos comerciantes, que dependem muito mais do desempenho da economia local do que de fatores externos. Além disso, o grosso do varejo financia a clientela com recursos próprios. Ou seja, como a crise mundial provocou escassez de crédito bancário, o varejo nacional não sentiu o baque que muitos alardeavam¿, afirmou o empresário, que aposta em crescimento entre 5% e 6% para o comércio neste ano.

Para o economista-chefe do Banco BES Investimento, Jankiel Santos, a grande surpresa dos dados do varejo está no mercado de trabalho. ¿Felizmente, a crise não desencadeou uma onda de desemprego. Além disso, as demissões na indústria foram compensadas pelo aumento do salário mínimo, pela ampliação do Bolsa Família e pelo reajuste dos servidores públicos¿, explicou. Jankiel chamou ainda a atenção para o impacto que o bom desempenho do comércio pode ter sobre a política monetária. A tendência é de que o Banco Central promova, na próxima semana, o último corte da taxa básica de juros (Selic), de 9,25% para 8,75% ao ano. ¿O BC vinha trabalhando com um quadro de recuperação incipiente e frágil da economia. Mas o que temos visto é uma retomada mais firme e disseminada por vários setores. É isso, inclusive, que está levando vários analistas a aumentarem as previsões para a inflação neste ano¿, destacou.

CALOTE DIMINUI

Mais pessoas quitaram débitos pendentes em junho deste ano e a inadimplência apresentou queda de 22,67% na comparação entre esse mês e maio. Os dados são da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL) e do Serviço Nacional de Proteção ao Crédito (SPC). O presidente da CNDL, Roque Pellizzaro, atrela a melhora do indicador não somente a uma recuperação econômica, mas a uma austeridade maior na concessão de crédito. A inadimplência no comércio do Distrito Federal em junho ficou em 5,2% (estabilidade), segundo levantamento do banco de dados da Câmara de Dirigentes Lojistas, que administra o Serviço de Proteção ao Crédito. (Victor Martins)