Título: Presídios e lei penal na ordem do dia
Autor:
Fonte: O Globo, 03/12/2010, Opinião, p. 6

É imprescindível que o Ministério da Justiça e os diretores dos quatro presídios federais de segurança máxima do país levem de fato à frente, como anunciado anteontem, a elaboração de um pacote de medidas para uniformizar os procedimentos das unidades prisionais da União com os presos, do qual faz parte a gravação das conversas dos detentos com parentes e advogados. Equacionar esta e outras questões referentes a um sistema penitenciário em crise quase permanente é tarefa urgente, para se consolidar uma efetiva política nacional de segurança pública. Espera-se o apoio do Congresso

Os presídios brasileiros (incluídas as unidades estaduais) abrigam cerca de 500 mil detentos, segundo o Departamento Penitenciário Nacional (Depen). O déficit no sistema está em torno de 195 mil vagas. Ou seja, além das condenáveis condições físicas dos estabelecimentos e de uma política prisional que menos regenera bandidos do que lhes reforça a opção pela criminalidade, as celas do país estão abarrotadas com um excedente da ordem de quase 40% da população carcerária. E não se trata de fenômeno recente. Tais números foram se formando à maneira de uma tragédia anunciada: entre 1995 e 2005 a população carcerária saltou de 148 mil para 361 mil presos, um crescimento de quase 145% em uma década, até chegar a 473 mil detentos em dezembro de 2009. Como não houve criação de vagas na mesma proporção, é de se imaginar o impacto do descompasso em todo o sistema.

A inapetência do poder público para enfrentar o problema só piora a situação. No plano federal, dos cinco presídios de segurança máxima que o governo Lula prometera entregar até 2006, para abrigar 1.040 bandidos de alta periculosidade, quatro estão concluídos. E destes, três funcionam plenamente (mas nenhum deles opera com a capacidade máxima de 208 detentos, em média, por unidade).

No Estado do Rio, flagelado pela ação de quadrilhas e onde é premente a necessidade de novas vagas para presos de média periculosidade, também é tíbio o interesse oficial na questão dos presídios - do que resulta, por exemplo, a existência de 4 a 5 mil presos amontoados irregularmente em delegacias, e um índice de reincidência no crime de assustadores 70%. Um princípio do combate à criminalidade é prender, e disso é exemplo o estado de São Paulo, que nos últimos anos investiu em penitenciárias, endureceu o combate aos bandidos e logrou reduzir os indicadores de violência.

Colada à necessidade de enfrentar o barril de pólvora dos presídios está a imperiosidade de se rever os critérios de aplicação da Lei de Execuções Penais (LEP). Por exemplo, bandidos de alta periculosidade não podem ter o seu prontuário examinado pela mesma ótica com que se deve analisar a ficha de réus potencialmente regeneráveis.

Estes dois ângulos - um sistema penitenciário como rigoroso depositário de criminosos que ameaçam a sociedade e como espaço de reabilitação social, ao lado da adequação da LEP à realidade do país - são essenciais num programa nacional de segurança que não se erga sobre pés de barro. Sem isso, as vitórias na Vila Cruzeiro e no Alemão terão sido infrutíferas.