Título: Politica monetaria se mantem coerente
Autor:
Fonte: O Globo, 10/12/2010, Opiniao, p. 6
A decisão do Comitê de Política Monetária (Copom), de manter as taxas básicas de juros em 10,75% ao ano, é passível de diferentes interpretações, até mesmo de caráter político, por se tratar da última reunião do órgão no ano, no governo Lula e na gestão de Henrique Meirelles à frente do Banco Central. No entanto, há que se considerar que o BC tem adotado uma linha coerente, sempre com o objetivo de prevenir antecipadamente os mercados para mudanças mais expressivas na política monetária.
O repique da inflação certamente justifica que as autoridades adotem uma política restritiva ao crédito, o que levou o Banco Central a elevar o depósito compulsório dos bancos ¿ cujo efeito moderador sobre a concessão de empréstimos é quase imediato ¿ e a exigir mais garantias do setor na concessão de certos tipos de financiamento, iniciativa que terá mais impacto em médio prazo. Afinal, a inflação do ano se aproximará dos 6%, quando o centro da meta é 4,5%.
Quanto às taxas básicas de juros, a expectativa predominante entre os analistas do sistema financeiro é que o BC terá de elevá-las. Porém, grande parte dos analistas acreditava que, depois dos passos já dados pelo BC, o Copom iria primeiro sinalizar tal intenção na ata que será divulgada na semana que vem. Esse é o procedimento que agora os mercados esperam de autoridades monetárias.
Independentemente de fatores passageiros que possam estar pressionando a inflação, como os problemas climáticos que afetaram a oferta de alimentos que pesam muito nos orçamentos domésticos (feijão, arroz, carnes, hortigranjeiros) e de altas nas cotações internacionais de produtos como açúcar, trigo, milho e soja, a variação média dos demais itens é suficiente para deixar as autoridades em alerta. Mesmo desconsiderando-se esses fatores passageiros no cálculo dos índices, a inflação ao consumidor estaria na faixa de 0,4% a 0,5% ao mês. Assim, na melhor das hipóteses estaria se distanciando do centro da meta anual estipulada pelas autoridades.
Vale observar que, depois de reduzi-la para o patamar mais baixo desde o lançamento do real (8,75% ao ano), em face da crise financeira internacional, o Banco Central voltou a aumentar a taxa Selic este ano. E não foi um pequeno aumento, pois dois pontos percentuais a partir do piso anterior equivalem a um ajuste de mais de 20%.
A dosagem teria sido a adequada se a política fiscal houvesse dado mais contribuição para o equilíbrio macroeconômico do país. Mesmo percebendo que a economia brasileira continuava a crescer fortemente, o governo não tirou o pé do acelerador, talvez motivado pelas eleições gerais, fazendo com que seus gastos correntes expandissem ainda mais a demanda por bens e serviços internamente.
O ministro Guido Mantega, da Fazenda, que permanecerá na pasta no próximo governo, recebeu da presidente eleita, Dilma Rousseff, a incumbência de estudar cortes de gastos exatamente para que a política fiscal volte a desempenhar papel importante no equilíbrio macroeconômico. É na expectativa desse ajuste que o Banco Central transferiu para a reunião do Copom em janeiro a decisão sobre as taxas básicas de juros, pois até lá ficará mais clara qual a dosagem adicional necessária para que a inflação convirja novamente para o centro da meta.