Título: Caos nos momentos finais de Cancun
Autor: Alencastro, Catarina
Fonte: O Globo, 10/12/2010, Ciencias, p. 48

Ninguém cede e todos reclamam da falta de um acordo para o clima

CANCÚN. O saldo de nove dias de discussão em Cancún é negativo. Literalmente. Não houve qualquer sinal de um acordo que represente um avanço no combate às mudanças climáticas. Negociadores de 194 países gastaram horas de discussão e o dia terminou ¿à beira de um desastre¿, como resumiu o secretário de Mudanças Climáticas e Energia do Reino Unido, Chris Huhne. A 16ª Conferência das Partes da Convenção de Mudanças Climáticas nas Nações Unidas (COP-16) corre o sério risco de terminar hoje com um resultado ainda mais pífio do que a de Copenhague, encerrada com um acordo sem metas específicas e valor legal.

EUA continuam a se opor ao Protocolo de Kioto

Países como EUA, Japão, Canadá, Austrália e Nova Zelândia não aceitam continuar com o Protocolo de Kioto ¿ único mecanismo que força países industrializados a cortar emissões de gases-estufa ¿ porque ele não inclui os emergentes. Ontem, em uma série de reuniões informais, ministros se encontravam aos pares para fechar pequenos textos que seriam levados para apreciação dos demais negociadores.

A pedido da presidente da COP-16, Patricia Espinosa, dez países (incluindo o Brasil) formaram pares para resolver temas específicos, como Kioto, o financiamento de ações de adaptação e mitigação dos efeitos das mudanças climáticas, transferência de tecnologia e a criação de fundos para financiar projetos e medidas de prevenção nos países em desenvolvimento. O processo durou todo o dia e um texto provisório seria negociado hoje.

¿ O momento é de aparar as arestas ¿ disse a ministra do Meio Ambiente brasileira, Izabella Teixeira.

Espinosa informou que a conferência será encerrada às 18h de hoje e que, imediatamente depois, todos serão convocados para uma grande festa. No entanto, os negociadores brasileiros duvidam que seja possível conciliar todas as diferenças em um texto que conte com a concordância de todos antes de sábado. Como as últimas horas são as mais intensas, muita coisa pode mudar. Ontem, negociadores não arriscavam opinar nem mesmo sobre o formato do documento que deverá sair de Cancún, se será um acordo, um pacote de decisões ou um resultado ainda mais fraco, como o consentimento geral de que as discussões continuarão em Durban (África do Sul), no ano que vem, na COP-17.

Morales e países insulares protestam

Os temas que estavam mais próximos de um consenso eram sobre a proteção de florestas (REDD), adaptação e transferência de tecnologia dos ricos para os emergentes e mais vulneráveis.

Como fez em Copenhague em 2009, o presidente da Bolívia, Evo Morales, um dos poucos líderes presentes, voltou a protestar contra os países ricos que, segundo ele, deveriam arcar sozinhos com os custos do combate do aquecimento global. Morales classificou a falta de um acordo que ajude os pobres em Cancún de ¿ecocídio¿. Representantes de países insulares, os mais afetados pela elevação do nível do mar, disseram que seus governos já pensam em planos para evacuar a população nos próximos anos.

* A repórter viajou a convite da CNA