Título: Cancún morre na praia
Autor: Alencastro, Catarina
Fonte: O Globo, 11/12/2010, Ciência, p. 44

Conferência repete fiasco de Copenhague e não aprova um acordo significativo

Num sinal de que caminha para repetir o fracasso de Copenhague, a 16ª Conferência das Partes da Convenção de Mudanças Climáticas das Nações Unidas (COP-16), em Cancún, no México, protelou até a última hora a definição de todas as questões discutidas ao longo de duas semanas. Embora negociadores e até mesmo ambientalistas que acompanham a COP-16 tenham se recusado até o último instante a reconhecer a derrota, os países devem falhar novamente em fechar um acordo significativo no combate do aquecimento global.

À noite, foi concluído um rascunho de acordo, que prevê a continuidade do Protocolo de Kioto (ele expira em 2012), mas em termos vagos. Também se estabeleceu o compromisso de criar um fundo verde de US$100 bilhões em 2020, para ajudar os países em desenvolvimento a se adaptarem às mudanças climáticas. O texto, porém, ainda precisaria ser aprovado em plenária pelos 194 países na COP-16.

¿ O documento define o acordo político de ter um segundo período de compromisso de Kioto. E aí começar (a partir de 2011) as negociações. É algo visto, do ponto de vista diplomático e legal, como um ganho, porque não há uma interrupção. A grande preocupação era perder o único instrumento legalmente vinculante que a convenção tem hoje, isto é, Kioto ¿ disse a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira.

Uma segunda derrota consecutiva em torno de um acordo de redução das emissões de gases do efeito-estufa significará o fracasso das negociações multilaterais da ONU, que exigem que decisões só sejam adotadas se todos os países concordarem. Embora o grande nó das discussões sejam as metas para um segundo período de compromisso do Protocolo de Kioto, várias outras questões estavam em aberto.

Por isso, países como a Bolívia chegaram a desistir de negociar. Diante das demonstrações de que um acordo importante era impossível, o grupo de países insulares (Aosis) demonstrava que não esperava muita coisa de Cancún, jogando para Durban (África do Sul), onde será sediada a próxima conferência climática, no ano que vem, as esperanças de que algo mais ambicioso seja obtido.

Até o final da noite, os temas que estavam mais adiantados eram adaptação (ações que países em desenvolvimento devem tomar em resposta às mudanças climáticas e que são financiadas pelos países ricos); transferência de tecnologia verde dos ricos para os em desenvolvimento; e um mecanismo de proteção das florestas, financiado pelos ricos. O mecanismo conhecido como REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal), no entanto, também tinha arestas a aparar. Uma delas era como conciliar os direitos de povos indígenas nos projetos de preservação florestal.

O tema mais importante da negociação ¿ a adoção de metas de redução de emissões ¿ não foi concluído. O máximo que os negociadores esperam alcançar é o compromisso de que o Protocolo de Kioto continuará valendo para que, em 2011, novas metas sejam definidas.