Título: Miséria e crime
Autor: Franco, Carlos Alberto Di
Fonte: O Globo, 13/12/2010, Opinião, p. 7

Domingo, 28 de novembro de 2010. Dia histórico. Às 7h59m, quando as forças de segurança invadiram o Complexo do Alemão, o Estado brasileiro reassumiu o seu papel e milhares de trabalhadores honrados, reféns do crime organizado, viram brilhar uma chispa de esperança. O que vimos não foi mais uma ação policial, mas a ressurreição da cidadania.

O problema da segurança pública é gravíssimo. E não será resolvido com ações isoladas, mesmo quando expressivas e importantes. É necessário chegar às raízes da doença: a frequente falta de critérios de seleção para o ingresso nos quadros policiais, a exclusão social, a permanente entrada de armas que abastecem o paiol da bandidagem, uma legislação obsoleta e o descaso com políticas de prevenção e recuperação de dependentes químicos.

A exclusão social está no cerne do problema. O presidente Lula, na alvorada de seu governo, lançou o Fome Zero. E fez bem. Mas o que o Brasil precisa com urgência é um Desemprego Zero. Uma juventude sem trabalho, sem esperança e sem futuro é presa fácil do crime organizado. Os jornais têm mostrado a estreita ligação que existe entre miséria e criminalidade.

Impõe-se um duro combate ao ingresso de armas e drogas. A Baía de Guanabara é uma peneira e as nossas fronteiras são avenidas abertas ao livre trânsito do crime organizado. Sem uma operação conjunta das Forças Armadas e da Polícia Federal, apoiadas em modernos sistemas de inteligência, aramos no mar. A vitória da Colômbia contra a guerrilha e o narcotráfico não se deu apenas em operações de combate e de repressão, mas sobretudo em bem-sucedidas ações monitoradas pelos serviços de inteligência.

A reforma da legislação, por outro lado, é urgente e necessária. É inacreditável que bandidos como Zeu (Eliseu Felício de Souza), um dos assassinos do jornalista Tim Lopes, recapturado recentemente, continuem sendo libertados pelo regime de progressão de penas. É inconcebível que a permissão para visitas íntimas seja a porta de entrada de celulares, drogas e armas. É inaceitável que chefões do crime continuem, da cadeia, a comandar seus comparsas, orientados por ordens enviadas por meio de advogados e repassadas a familiares. A defesa das prerrogativas profissionais não pode levar a OAB a tapar o sol com a peneira. A entidade tem o dever de promover constantes limpezas nos seus quadros.

É preciso não subestimar o que está na origem da força do narcotráfico: o drama da dependência química. E o problema não se resolve com a miragem da descriminalização das drogas. É preciso, sim, investir pesado em políticas de prevenção e de recuperação de adictos. Nós, jornalistas, precisamos mostrar a luz no fim do túnel.

CARLOS ALBERTO DI FRANCO é diretor do Master em Jornalismo.