Título: Ahmadinejad surpreende ao demitir chanceler
Autor: Malkes, Renata
Fonte: O Globo, 14/12/2010, O Mundo, p. 35

Chefe da agência atômica iraniana assume o cargo interinamente, pressupondo política nuclear mais austera

Após cinco anos no cargo, o ministro das Relações Exteriores do Irã, Manouchehr Mottaki, foi demitido ontem pelo presidente Mahmoud Ahmadinejad. Apesar de haver um histórico de desavenças políticas entre os dois, a demissão repentina no momento em que o Irã retoma as negociações acerca de seu controverso programa nuclear surpreendeu, principalmente, porque contou com o aval do líder supremo do país, aiatolá Ali Khamenei ¿ responsável por indicá-lo à pasta em 2005. O chefe da agência nuclear iraniana, Ali Akbar Salehi, foi indicado ao posto temporariamente.

Outro aliado, Mojtaba Hashemi, cotado ao cargo

Mottaki, diplomata de carreira e ex-embaixador do Irã em Istambul, foi demitido no meio de uma viagem oficial à África. A notícia foi divulgada pela agência estatal Irna enquanto ele se reunia com lideranças do Senegal, causando constrangimento. Ahmadinejad não deu explicação oficial para a decisão.

¿Espero que seus esforços sejam reconhecidos por Deus e que tenha sucesso. Agradeço e aprecio seu trabalho e serviço durante seu mandato¿, afirmou o presidente.

A troca de comando na Chancelaria de Teerã é o primeiro resultado concreto de uma briga de bastidores que se arrasta há meses em um governo rachado. De um lado, o conservadorismo de Ahmadinejad e seus aliados que defendem o foco da política local no programa nuclear, e do outro, o grupo liderado pelo líder do Majlis, o Parlamento, Ali Larijani, e seus insistentes apelos por mudanças na política econômica e por denúncias de uma centralização excessiva do poder nas mãos da Presidência.

Mottaki é um dos maiores aliados políticos de Larijani ¿ o que explicaria, em tese, sua demissão. Um dos últimos episódios de tensão entre a Presidência e a Chancelaria teria sido uma decisão de Ahmadinejad de criar ¿enviados especiais¿ a diversas partes do mundo ¿ irritando Mottaki, que viu seus diplomatas esvaziados. O aiatolá Ali Khamenei, fiel da balança nas disputas internas de poder, interviu e fez Ahmadinejad recuar, dando aos ¿enviados¿ o status de ¿conselheiros¿. Trocas em pastas importantes como Defesa, Relações Exteriores e Inteligência, aliás, só ocorrem com o aval de Khamenei.

¿ Khamenei foi quem indicou Mottaki a Chancelaria ¿ afirmou ao GLOBO o analista iraniano Meir Javedanfar, do think tank Centro de Análises do Oriente Médio, baseado em Tel Aviv. ¿ Acredito que tenha concordado com a troca por estar preocupado com as constantes brigas no poder. Talvez esteja dando a Ahmadinejad a chance de cercar-se de aliados em tempos difíceis, com mais sanções e dificuldades econômicas.

O chanceler interino, Ali Akbar Salehi, é homem de confiança de Ahmadinejad, mas especula-se que não tem o respaldo de Khamenei. Sua indicação, no entanto, pode sinalizar o que alguns analistas já chamam de ¿a nuclearização da política externa do Irã¿. Fontes iranianas especulam o nome de Mojtaba Samareh Hashemi para ocupar definitivamente o ministério. Hashemi é considerado um irmão pelo presidente ¿ e seria o responsável pela influência de Ahmadinejad sobre as Guardas Revolucionárias do Irã e os serviços de inteligência.