Título: Dilma e a difícil arte de tentar agradar a todos
Autor: Oliveira, Eliane ; Lima, Maria
Fonte: O Globo, 19/12/2010, O País, p. 12

Nomeações feitas pela presidente eleita deixam partidos insatisfeitos; PT já retaliou, e convite a Ciro abre crise no PSB

BRASÍLIA. Durante a campanha, a presidente eleita, Dilma Rousseff, se orgulhava de liderar a maior coligação de partidos, e que isso a ajudaria a governar. Seus maiores problemas se revelam agora, entretanto, na dificuldade de agradar e acomodar tantos interesses num espaço limitado na Esplanada. A poucos dias de sua posse, em 1º de janeiro, Dilma Rousseff ainda tem 14 ministérios para escolher os titulares, e os que já conseguiu indicar ou confirmar até agora - muitos para satisfazer o presidente Lula - deixaram terra arrasada entre os partidos aliados, com sequelas para administrar assim que seu governo começar para valer.

No seu próprio partido, Dilma conseguiu desagradar, com a montagem feita até agora para o Ministério, a quase todas as correntes. O troco veio na semana passada, com a retaliação contra o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), que viu frustrada a sua candidatura à presidência da Casa. Insatisfeita com as indicações de Dilma, a bancada petista a retaliou indicando o deputado Marcos Maia (RS) no lugar de Vaccarezza.

Paulistério incomodou

Talvez o acerto do Ministério do Desenvolvimento Agrário, por exemplo, tenha que ser anulado e tudo voltar à estaca zero, porque a reação da Democracia Socialista (DS), uma das correntes do PT, foi devastadora. Na semana passada, Dilma aceitou o pleito dos governadores Jaques Wagner (BA) e Marcelo Déda (SE) para indicar a agrônoma Lúcia Falcón para o MDA. Aos 12 deputados integrantes da DS que querem manter o ministro gaúcho Guilherme Cassel, ou indicar Joaquim Soriano para a pasta, se juntaram parlamentares mineiros insatisfeitos com a perda do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS). Eles lideraram o movimento pró-Marco Maia.

- A coisa começou a desandar com o paulistério, depois foi o minastério. Quando chegou no nordestério, a DS perdeu o MDA e deu no que deu - explica o secretário nacional de Comunicação do PT, André Vargas (PR).

A pasta da Saúde, para onde Dilma gostaria de levar alguém de projeção nacional, também está indefinida e crescem as chances do PT emplacar a indicação de Alexandre Padilha, atual ministro de Relações Institucionais. Se Padilha, que é médico sanitarista, assumir a Saúde, sairia da mais que provável sombra de Antonio Palocci no Palácio do Planalto.

Futuro chefe da Casa Civil, Palocci é considerado por pessoas próximas à presidente eleita como o grande diferencial do governo Dilma em relação à equipe do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Hoje principal coordenador da equipe de transição e deputado federal pelo PT de São Paulo, Palocci dará uma roupagem política ao cargo que até recentemente era ocupado por ela.

PSB quer três ministérios

No PSB, a crise vem ganhando dimensões imensuráveis. O governador eleito do Espírito Santo, Renato Casagrande, disse que se Dilma insistir em indicar Ciro Gomes (PSB-CE), passando por cima do partido, terá um passivo grande para administrar depois. Dilma convidou Ciro, que não foi incluído na lista de ministeriáveis, levada pelo governador Eduardo Campos, presidente do partido, para a Integração Nacional e Secretaria de Portos e Aeroportos. Com a entrada de Ciro, que aceitou ser ministro, Campos quer agora uma terceira pasta para atender o irmão do governador Cid Gomes no tabuleiro. Mas não vai ter.

- O processo, como está, não anda bem. O quadro inicial de negociação foi desarrumado com a entrada do Ciro. O Márcio França e o Beto Albuquerque ficam de fora. Se continuar assim, a Dilma vai deixar um passivo grande para o partido administrar depois - avalia Casagrande.

Já o PMDB está remoendo a notícia: Ciro, tido como inimigo do partido, ficaria com o poderoso Ministério da Integração Nacional, uma pasta de peso tirada do partido.

No PCdoB, Dilma não aceita que o atual ministro Orlando Silva seja mantido no cargo, acumulando o Ministério do Esporte com a Autoridade Pública Olímpica, como queria a direção do partido. A presidente eleita quer como ministra a ex-prefeita de Olinda (PE), Luciana Santos. Mas já está arrumando uma solução para Orlando Silva.

Inexperiente na difícil tarefa de articulação política, correndo daqui e dali para contentar a todos, interlocutores relatam que Dilma está triste e desgastada com essa confusão toda. Tudo o que ela queria era ter pelo menos uma estrela, um nome de peso para a Saúde, ou quem sabe para a Cultura. Até o momento, o perfil do Ministério deixa a desejar.

- Os ministros do PMDB são paroquiais demais - queixa-se um dirigente do PT.

Algumas pessoas que trabalham na transição comentam, reservadamente, que Dilma está praticando a premissa de que o poder é um exercício solitário. Tudo o que ela quer é vencer essa etapa e começar a fazer o que gosta: gestão administrativa.

- A sensação é que ela sofre com isso. Vamos ver até onde isso vai dar - comenta uma fonte da transição.