Título: Pacote pró-investimentos chega a R$13 bilhões
Autor: Beck, Martha
Fonte: O Globo, 16/12/2010, Economia, p. 37

Medidas do governo incluem redução de tributo para aplicação em título de longo prazo e incentivo a financiamento imobiliário

BRASÍLIA e SÃO PAULO. O governo anunciou ontem o tão esperado pacote de incentivo ao investimento privado de longo prazo no país. As 12 medidas têm como desafio garantir que haja recursos disponíveis para grandes obras de infraestrutura nos próximos anos sem que o Tesouro Nacional tenha que fazer aportes bilionários no BNDES - foram quase R$200 bilhões desde 2009. Entre as iniciativas, que somam R$13 bilhões em aportes (R$12,3 bilhões) e desonerações (662 milhões), estão a redução de tributos para aplicações em títulos com prazo superior a seis anos e ações para incentivar o financiamento imobiliário.

Além disso, técnicos adiantaram ao GLOBO que o governo vai prorrogar a desoneração do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de caminhões, picapes e bens de capital. Esses incentivos terminariam em dezembro.

As projeções da equipe econômica indicam que a taxa de investimento no país deve saltar de 19% para 23% do Produto Interno Bruto (PIB) até 2014, o que significa uma necessidade de recursos entre R$350 bilhões e R$650 bilhões.

- Esse é o volume adicional de investimentos que terá que ser financiado nos próximos anos e é desejável que seja financiado por instrumentos privados e não pela expansão do BNDES. Parte importante do financiamento deverá vir do próprio lucro das empresas - afirmou o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, salientando que a velocidade disso dependerá da queda dos juros.

- O setor público se incumbiu do financiamento da infraestrutura num primeiro momento. Agora, queremos abrir espaço para que o setor privado compartilhe esse trabalho com o BNDES - disse o ministro da Fazenda, Guido Mantega.

Debêntures emitidas por Sociedades de Propósito Específico (SPEs) terão redução do Imposto de Renda (IR). As pessoas físicas (que hoje pagam uma alíquota entre 15% e 22,5%) e estrangeiros (que recolhem 15%) que aplicarem nesses papéis serão isentos do tributo. Já pessoas jurídicas pagarão uma alíquota de 15%. Ela hoje é de 34%. Para isso, no entanto, terão que ser obedecidas algumas condições, como os papéis terem prazo mínimo de seis anos e a emissão estar limitada ao valor do projeto, que terá de ser aprovado pelo governo federal.

Governo quer estimular mercado secundário

A Fazenda também isentou do IR os títulos de longo prazo emitidos por empresas não-financeiras adquiridos por estrangeiros, sob as mesmas condições do caso das debêntures.

O governo vai utilizar ainda parte do compulsório sobre depósitos à vista - três pontos percentuais, ou R$2,2 bilhões - para criar um fundo que negociará títulos privados no mercado. Segundo Mantega, a ideia é estimular o mercado secundário (de papéis já nas mãos de investidores) por meio de negociações diárias de compra e venda de papéis. E o BNDES poderá aportar R$200 milhões nesse fundo, que será administrado por entidade selecionada ou constituída pelo setor privado.

Outra medida para dar mais liquidez ao mercado secundário é a eliminação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) que incide sobre papéis negociados em menos de 30 dias. Além disso, não haverá mais a tributação adicional sobre títulos que são negociados fora da data de pagamento de seus cupons.

Também foi reduzido o IOF - de 6% para 2% - que incide sobre a aplicação de recursos estrangeiros em fundos de investimento em participações (FIP) e fundos mútuos de investimento em empresas emergentes (FMIEE). Segundo técnicos do governo, o capital estrangeiro que entra para financiar a infraestrutura é positivo.

Outra ação foi permitir que o BNDES emita Letras Financeiras (LFs) - papel de longo prazo que hoje só pode ser colocado no mercado por empresas privadas. Essa será uma forma de o banco se capitalizar sem recorrer a recursos públicos. Segundo Coutinho, além de atuar nesse mercado, o banco de fomento vai usar R$10 bilhões nos próximos dois anos para comprar títulos de longo prazo ofertados por empresas, entre outras ações.

Preocupado com o risco de a poupança não ter fôlego para atender toda a demanda por crédito habitacional, o governo também anunciou um incentivo à securitização, ou seja, a venda de títulos vinculados a contratos imobiliários no mercado. Foi fixado um prazo de 36 meses para que a securitização seja contabilizada nos limites da poupança (os bancos têm que aplicar 65% dos depósitos na caderneta em habitação).

O governo decidiu ainda permitir o parcelamento pelos bancos sobre créditos recuperados, que podem ser descontados da base de cálculo enquanto estão pendentes:

- É uma medida lateral para estimular os bancos a renegociarem as dívidas com seus clientes - explicou Mantega.

Pacote de estímulo é elogiado pela Abdib

Para a Associação Brasileira da Indústria de Base e Infraestrutura (Abdib), o pacote de medidas de estímulo cria um ambiente propício para "deslanchar" diversos investimentos e projetos. Segundo Paulo Godoy, presidente da entidade, existe hoje uma grande perspectiva de aumento para os investimentos em infraestrutura, seja em planos já traçados por diversos setores, como pela demanda de projetos envolvendo a Copa do Mundo (2014) e as Olimpíadas (2016).

- Foi dado um importante passo para ampliar a capacidade de financiamento de longo prazo das empresas - disse.

Segundo o empresário, a Abdib contribuiu com análises e sugestões durante o processo de elaboração do pacote para aperfeiçoar as condições de financiamento de longo prazo. Até 2014, a entidade estima que os investimentos em infraestrutura devem atingir R$160 bilhões por ano, o que tornava imperativa a viabilização de fontes alternativas de crédito para complementar os desembolsos do BNDES.

- A desoneração poderá atrair novos investidores dispostos a participar de projetos de infraestrutura, ampliando a competitividade desse mercado.

O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, disse que embora não soubesse detalhes das medidas, em linhas gerais o pacote da Fazenda aponta para a direção certa:

- O trabalho está na direção positiva de incentivar o crédito de longo prazo no país.

COLABORARAM Ronaldo D"Ercole e Lino Rodrigues