Título: Tudo pronto, só falta a ordem
Autor: Werneck, Antônio
Fonte: O Globo, 05/12/2010, Rio, p. 18
Polícia já tem equipes treinadas para invadir e ocupar favelas da Rocinha e do Vidigal
Lá dentro, são milhares de moradores, construções umas próximas das outras, vias íngremes e muitos becos. Do lado de fora, centenas de pessoas em prédios, casas luxuosas, hotéis lotados de turistas e veículos circulando sem parar em movimentadas avenidas. Ocupar as favelas da Rocinha e do Vidigal, em São Conrado, parece uma tarefa extremamente difícil. No entanto, policiais civis do Rio já têm equipes táticas prontas, treinadas e com conhecimento suficiente da região para uma esperada invasão das comunidades, revelou o delegado Allan Turnowski, chefe de Polícia Civil. A operação, porém, ainda não tem data marcada.
Recém-saído da batalha de retomada do Complexo do Alemão, Turnowski garantiu que a polícia é capaz hoje de entrar em qualquer favela do Rio. As polícias Militar e Federal, além das Forças Armadas, também têm equipes preparadas para subir o Vidigal e a Rocinha quando o estado quiser.
- Já temos conhecimento suficiente sobre como entrar nas favelas da Rocinha e do Vidigal, e como ocupá-las. Nossas equipes táticas de recursos especiais já estão acostumadas a progredir naquela região. Se a decisão de entrar for tomada amanhã, já temos tudo planejado, sabendo até quem vai entrar e por onde - garantiu Turnowski.
Duzentos fuzis com o tráfico na Rocinha
A situação das favelas da Rocinha e do Vidigal é semelhante à que existia na Vila Cruzeiro e no Complexo do Alemão. Traficantes transformaram as duas comunidades da Zona Sul no entreposto de drogas, armas e munição de uma facção criminosa. Há pelo menos um ano, policiais do Rio têm conhecimento de que bandidos foragidos de outras favelas da Região Metropolitana teriam buscado refúgio na Rocinha. Só na comunidade, são mais de 200 traficantes e 200 fuzis em poder da quadrilha. O chefe do tráfico é Antônio Francisco Bonfim Lopes, o Nem.
Estratégica para o tráfico, rica (vende-se para um tipo de viciado que pode pagar mais caro pela droga) e cercada de rochas e matas (o que amplia o número de rotas de fuga numa eventual ação policial), a região teria se tornado esconderijo de bandidos foragidos até do Complexo do Alemão - uma informação que os policiais não confirmam. O tenente-coronel Carlos Roberto Garcia de Oliveira, comandante do 23º BPM (Leblon), responsável pelo policiamento ostensivo da região, diz que a PM tem informações sobre as favelas, os traficantes e a localização das bocas de fumo.
- São informações que não posso passar, porque bandido também lê jornal. O que posso dizer é que nosso serviço reservado (P-2) sabe onde os bandidos costumam ficar e até para onde costumam fugir - afirmou Garcia.
Denúncias ao 23º BPM crescem 200%
Nos últimos dias, em especial depois da ocupação do Complexo do Alemão, a quantidade de informações que os PMs do Leblon receberam do Disque-Denúncia sobre a atuação dos criminosos da Rocinha e do Vidigal aumentou mais de 200%. Uma das denúncias anônimas chegou na última sexta-feira: diz que os traficantes estão aterrorizando moradores (suspeitos de darem informações às autoridades), andam muito nervosos, circulam armados por todo lado, e têm muito medo de uma invasão da polícia, que acreditam ser iminente.
- Os criminosos estão tensos. É o que posso informar - confidenciou um agente do serviço reservado da PM.
Recebendo elogios de todas as forças de segurança que participaram da mobilização dos últimos dias, o secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, tem repetido que a ocupação definitiva da Rocinha está sendo planejada com responsabilidade. Quando a operação ocorrerá ele não diz. Mas, para aqueles que defendem uma entrada imediata, para aproveitar o sucesso das ações na Vila Cruzeiro no Complexo do Alemão, o secretário se mostra cauteloso.
- A população sabe o que nós já fizemos ao longo dos últimos anos. Implantar uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) precisa de planejamento. O que posso dizer no momento é que a ocupação da Rocinha é importante e está sendo planejada. Como as outras, será uma invasão definitiva - garantiu o secretário.
Embora a cúpula da segurança pública faça questão de negar, em abril deste ano as duas principais facções criminosas da cidade - a que dominava o Complexo do Alemão, e a que comanda as favelas da Rocinha e Vidigal - teriam selado um pacto de não agressão para enfrentar o bem-sucedido projeto das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) nas favelas do Rio. Um encontro entre os principais chefes teria ocorrido na Favela da Grota. Teriam participado do encontro, o traficantes Anderson Rosa Mendonça, o Coelho, chefe do Complexo do São Carlos; um representante da Rocinha; Luciano Martiniano da Silva, o Pezão; além de Fabiano AtanásioAtanázio da Silva, o FB - os dois últimos do Complexo do Alemão e que estão foragidos depois que a polícia tomou as favelas da Penha e Inhaúma.
O delegado Ângelo Gioia, superintendente da Polícia Federal do Rio, revelou que, a partir da próxima semana, agentes das delegacias de repressão ao tráfico de drogas e de armas iniciam o rastreamento da origem de armas e explosivos apreendidos durante a ocupação do Complexo do Alemão. Gioia também garantiu que a PF vai manter a troca de informações com outras forças.
- Está sendo altamente positivo o estreitamento da ligação das forças federais no combate aos criminosos no Rio - afirmou Gioia.
Allan Turnowski informou que esta semana a Polícia Civil vai iniciar uma série de ações de combate ao crime em comunidades de diferentes pontos do Rio.
- Vamos buscar alvos nas favelas da Maré, da Mangueira, do Jacarezinho, da Rocinha e do Vidigal. O tráfico não terá descanso - afirmou Turnowski.