Título: BC vê risco de inflação e indica alta de juros
Autor: Duarte, Patrícia
Fonte: O Globo, 23/12/2010, Economia, p. 34

Para conter os preços, mercado aposta que Banco Central elevará Taxa Selic de 10,75% a 11,25% já em janeiro

BRASÍLIA. Com uma clareza pouco usual, e elevando bastante o tom, o Banco Central (BC) deixou evidente ontem, ao divulgar seu último relatório trimestral de inflação do ano, que vai voltar a subir a taxa básica de juros do país em janeiro. Os riscos inflacionários cresceram muito, segundo a autoridade monetária, advindos dos alimentos e do descompasso entre a demanda e a oferta. O cenário externo também deixou de jogar a favor dos preços no mercado doméstico, como achava até então o BC, que elevou as projeções de inflação para 2010 e 2011.

O texto afirma que "o balanço de riscos associado ao cenário prospectivo para a inflação evoluiu desfavoravelmente desde a divulgação do último relatório (de setembro). (...) Importante destacar que, no regime de metas para a inflação, desvios em relação à meta, na magnitude dos implícitos nessas projeções sugerem necessidade de implementação, a curto prazo, de ajuste na taxa básica de juros, de forma a conter o descompasso entre o ritmo de expansão da demanda doméstica e a capacidade produtiva da economia, bem como de reforçar a ancoragem das expectativas de inflação."

No fim do ano, Taxa Selic deve chegar a 12,25%

Com o recado, o mercado aposta que a Selic, em 10,75% ao ano desde julho passado, deve ir a 11,25% no próximo encontro do Comitê de Política Monetária (Copom), nos dias 18 e 19 de janeiro. No fim do ano, ela chegaria a 12,25%.

- O relatório de inflação tirou a ambiguidade da ata (do Copom) - resumiu a economista sênior do banco Santander, Tatiana Pinheiro, referindo-se ao documento divulgado na semana passada, que levou parte do mercado a diminuir suas projeções de aumento imediato dos juros.

O diretor de Política Econômica do BC, Carlos Hamilton Araujo, reconheceu que tem sido difícil para o mercado e o BC fazerem projeções porque a volatilidade econômica cresceu muito, o que acaba atrapalhando a comunicação entre ambos. Mas defendeu que a última ata já explicitava preocupação com os riscos à inflação.

- A marca registrada tem sido a volatilidade - resumiu.

O BC enxerga agora que a inflação medida pelo IPCA, pelo cenário de referência (com juros constantes a 10,75% ao ano), será maior nos próximos anos, acima do centro da meta de 4,5%. Para 2010, prevê que a variação dos preços ficará em 5,9%, 0,9 ponto percentual a mais do que a projeção anterior, e em 5% em 2011, frente aos 4,6% esperados antes. Para 2012, calcula que o indicador ficará em 4,8%. Já com o cenário de mercado, com juros e dólar variando, o BC vê que o IPCA ficará em 5,9% em 2010, em 4,8% no ano seguinte e em 4,5% em 2012.

Diretor: há descompasso entre oferta e demanda

Esse quadro indica que, para o BC cumprir a meta de inflação, terá de elevar a Selic. Com juros mais altos, os empréstimos também tendem a ficar mais caros, inibindo o consumo e, assim, segurando os preços. Araujo argumentou ainda que o cenário inflacionário está mais perigoso porque existe um descompasso entre oferta e demanda. Esta cresce mais rapidamente, sendo que em 2010, o BC projeta 10%.

O diretor lembrou que o cenário é preocupante mesmo com as medidas de restrição ao crédito adotadas recentemente, como elevação dos depósitos compulsórios. O documento também traz avaliações sobre o ganho de renda e de emprego da população, que também podem alimentar o avanço dos preços.

- Não somos contra aumento de renda. É tudo de bom. A nossa preocupação é quando essa renda maior não encontra contrapartida na oferta (de bens e serviços) - avaliou Araujo.

No cenário externo, o BC destacou especialmente a pressão sobre os preços das commodities, inclusive de petróleo, e os riscos de contágio no país. Por isso, acrescentou Araujo, esse cenário deixou de ser "desinflacionário".

O Banco Central manteve a projeção de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) este ano em 7,3% e, para 2011, espera expansão de 4,5%, "condizente com taxas de crescimento avaliadas como sustentáveis em longo prazo."