Título: Sem greve, mas com atrasos
Autor: Doca, Geralda; Paula, Nice de
Fonte: O Globo, 24/12/2010, Economia, p. 19

AMEAÇA NO AR

No Galeão, índice superou 50% e aeroviários reduziram efetivo. Aeronautas podem parar em janeiro

A imposição, pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), de limites rígidos ao movimento dos trabalhadores do setor aéreo até o dia 2 de janeiro - patrocinada pelo governo federal - impediu a realização de uma greve geral que deixasse no chão os brasileiros com viagem programada para a antevéspera do Natal. Anunciada para ontem, a paralisação foi suspensa em bases importantes, como São Paulo (Guarulhos e Congonhas), Porto Alegre e Recife. No entanto, alguns líderes sindicais ligados aos aeroviários (pessoal de solo) comandaram atos em Salvador, Brasília, Confins (BH) e no Galeão (RJ), onde 20% dos funcionários de solo pararam e o índice de atrasos chegou a 52,5% às 20h, muito acima da média nacional de 39%. Já o presidente do Sindicato Nacional dos Aeronautas, Gelson Fochesato, disse que a categoria pensa em retomar a greve a partir de 10 de janeiro.

Os líderes prometem continuar a mobilização nos próximos dias, a fim de ganhar adesão de mais companheiros. Eventuais paralisações - entre 23 de dezembro e 2 de janeiro - estão limitadas a 20% dos funcionários, conforme determinou o TST na noite de quarta-feira.

A deliberação da Justiça trabalhista não foi suficiente para arrefecer os ânimos dos representantes da categoria de forma geral. Ao contrário, a decisão surpreendeu e causou indignação, disse o presidente da Federação Nacional dos Trabalhadores em Aviação Civil (Fentac-CUT), Celso Klafke - para quem os 8% de reajuste oferecidos pelas companhias são insuficientes para colocar um fim ao impasse:

- Este percentual não resolve o problema.

Ele disse que as entidades vão convocar assembleias na próxima semana para avaliar o percentual oferecido. Para a presidente do Sindicato Nacional dos Aeroviários, Selma Balbino, seria necessário chegar ao menos a 9%. Os líderes dos trabalhadores, no entanto, estão divididos quanto à paralisação. Mesmo com a decisão da Fentac, que coordenou a negociação de suspender ainda na madrugada a greve, Selma articulou uma paralisação dos funcionários de solo, principalmente de pista, ontem à tarde no Galeão.

Embora a Infraero tenha negado problemas no aeroporto, ela disse ter contado com a adesão de 120 funcionários e que o movimento será reavaliado hoje, sinalizando que novas manifestações vão ocorrer, inclusive em outros aeroportos. Em Brasília, Confins e Salvador, os sindicatos realizaram protestos até as 18h de ontem.

Para Klafke, a decisão do TST esvaziou o movimento. Segundo ele, as entidades não têm condições de controlar a frequência e, assim, evitar a multa diária de R$100 mil em caso de descumprimento. Ele contou que foi notificado da decisão do TST por volta de 1h da madrugada e logo depois comunicou às bases que a greve deveria ser suspensa. Sem acordo entre trabalhadores e companhias, que até então insistiam em reajuste de 6,58%, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, usou os canais no Judiciário para encontrar uma alternativa. Foi ele quem pediu ao Ministério Público do Trabalho para entrar com ação no TST para barra a greve.

A decisão do TST não foi a única. Na noite de quarta-feira foram deferidas mais duas liminares - uma do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) e outra da Justiça Federal, ambas do Distrito Federal, cada uma com uma punição maior, efetivo de 90% e multa de R$500 mil, no caso da primeira, e multa de R$3 milhões, no da segunda. A liminar do TRT impede que haja paralisação até o dia 7. A da Justiça Federal impõe o dia 10 como limite. Porém, segundo o Ministério Público do Trabalho, há conflito de competências e a que vale é a do TST, instância máxima que julga litígio trabalhista envolvendo empresas privadas e de âmbito nacional. Na avaliação de juristas, porém, vale a decisão mais restritiva.

Fontes do setor contam que logo depois das liminares, o presidente do Sindicato das Empresas Aéreas (Snea), José Márcio Molo, que está conduzindo as negociações por parte das empresas, foi procurado por representantes dos trabalhadores (Graziella Baggio, dos aeronautas, e Uébio José da Silva, dos aeroviários de São Paulo), interessados em buscar uma solução. Por volta das 3h30m, depois de conversar com os presidentes das duas maiores empresas (TAM e Gol), Molo fez uma contraproposta de reajuste salarial de até 8%, desde que a categoria suspendesse a greve. A Fentac só foi informada da contraproposta no meio da tarde ontem.

Mesmo sem uma greve geral, o índice de atrasos foi alto ontem nos aeroportos. Até as 20h, dos 2.207 voos previstos no país, 861 estavam atrasados (39%) e outros 97 foram cancelados, segundo a Infraero. A TAM tinha o pior percentual de atraso: 58,5% (429 das suas 733 partidas). A Gol teve índice de atraso de 39,9% e a Webjet, 32,3%. Os principais aeroportos com pior desempenho foram Galeão (52,5% dos 110 voos saíram fora do horário) e Guarulhos (52,4%). Segundo fontes da Anac, houve problemas meteorológicos, dificuldades com excesso de jornada de trabalho e retirada de aeronaves para manutenção.

O presidente do Sindicato Nacional dos Aeronautas, Gelson Fochesato, reclamou do fato de a greve ter sido considerada ilegal e disse que a categoria pensa em retomar o movimento por volta do dia 10 de janeiro, para evitar problemas com o Judiciário.

- Temos que respeitar o Judiciário. Uma decisão fala em dia 3 de janeiro, outra em dia 7... Mas não vamos nos pautar por essas datas. Vamos pensar em retomar a greve lá pelo dia 10 ou após primeira semana de janeiro.

O ministro da Defesa, Nelson Jobim, comentou que a suspensão da greve dos aeroviários foi uma "decisão inteligente" dos sindicatos e que o ministério está preparado para um adiamento da paralisação.

- A suspensão da greve foi uma decisão inteligente - afirmou o ministro, lembrando que "direito de greve é direito do cidadão". - Está previsto na Constituição. Precisamos ter a capacidade de diálogo que não tivemos nesse momento.

Nos aeroportos, o clima entre os passageiros era de incerteza na manhã de ontem. No Galeão, a família de Uno, Marina e a pequena Olívia Meyer, de 2 anos estava apreensiva.

- Chegamos 40 minutos antes. Agoras as preocupações ficam para a volta - disse Uno, que embarcaria para Porto Alegre.

COLABORARAM Tais Mendes e Fabiana Ribeiro