Título: Crise é teste para a África
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Fonte: O Globo, 01/01/2011, O Mundo, p. 28

Num continente onde golpes e eleições fraudulentas estão longe de ser incomuns, uma coisa distingue a situação na Costa do Marfim: todas as maiores potências na África e em outros continentes concordam que Laurent Gbagbo deve deixar o poder. Mas a resistência de Gbagbo tornou rapidamente a Costa do Marfim num teste de como a comunidade internacional pode impor sua vontade sobre líderes que mantêm amplo apoio entre militares e recusam-se a aceitar o resultado de eleições.

Dado o número de líderes autoritários que já foram tolerados na África, o primeiro obstáculo do teste ¿ encontrar um largo consenso internacional ¿ foi superado com sucesso. Mas a persistência de Gbagbo levanta outra questão: até onde os países iriam para removê-lo do poder?

Analistas argumentam que, por exemplo, o bloco da África Ocidental, que ameaçou intervir no país, tem capacidade militar limitada, e sofre com ameaças do governo de Gbagbo de retaliação contra cidadãos dos países que atacarem a Costa do Marfim, onde há um grande número de imigrantes.

Um sinal de fraqueza da comunidade internacional agora resultaria numa perda significativa de credibilidade das instituições internacionais e de governos que pressionam Gbagbo. Mas a possibilidade do uso de força também vem sendo rejeitada por alguns diplomatas africanos, principalmente porque o país saiu há pouco de uma guerra civil.

Quando eleições disputadas acabaram em violência no Quênia e no Zimbábue nos últimos anos, muitos países apoiaram acordos políticos que punham rivais para dividir o poder. Mas no caso marfinense, alguns países africanos já descartaram a solução de poder compartilhado. Ao menos outras cinco eleições estão previstas para este ano somente na África Ocidental, e poucos querem defender uma solução que permitiria a líderes rebeldes manter-se no poder após o término de seus mandatos.

¿Há uma forte percepção de que outro acordo de poder compartilhado criaria um péssimo precedente¿, diz um diplomata ocidental na Nigéria.

Mas analistas concordam que, enquanto Gbagbo mantiver a lealdade do Exército, será difícil retirá-lo da Presidência.