Título: Novo governo Dilma
Autor: Jungblut, Cristiane ; Oliveira, Eliane
Fonte: O Globo, 02/01/2011, O País, p. 12A

Cada novo governo tende a trazer novidades e levantar esperanças ou temores. Mas o próximo deve proporcionar aos brasileiros poucas surpresas. O anúncio da composição dos ministérios, como já vimos, não trouxe mudanças radicais. Pelo que foi anunciado, o fator continuidade tenderá a predominar, e o mercado poderá dormir tranquilo. Na economia, depois das reformas introduzidas nos governo FH e das alterações feitas no governo Lula, as mudanças mais fáceis já foram feitas e as mais difíceis, como as reformas fiscal, tributária e política, poderão ser deixadas de lado porque mexer nessa área pode produzir mais problemas do que solução.

No plano da economia, a indicação dos novos ministros, ou recondução dos antigos, tende a acalmar o mercado (para usar o chavão), porque não prognostica alterações nos rumos anteriormente seguidos.

Também no campo político o governo Dilma não deve esperar complicações maiores do que as que habitualmente habitam nosso sistema partidário e político. A fragmentação partidária continua e as alterações se produzem lentamente a cada eleição. Sete partidos com mais de 30 cadeiras representam cerca de 74% dos deputados federais. O PSDB, que recuou na Câmara dos Deputados, conquistou o governo de oito estados, e o PT, que continuou com a Presidência da República e a maior bancada federal, venceu em apenas cinco. O PSB, partido de dimensões médias, ganhou o governo de seis estados e o direito de reivindicar maiores favores do governo federal. A oposição continua a controlar uma ampla parcela do eleitorado brasileiro.

À primeira vista, o quadro partidário parece complicado e justificaria uma reforma do sistema político habitualmente reclamada depois de cada eleição, especialmente pelos perdedores. Contudo, as numerosas tentativas de reformas anteriores não deram em nada e, hoje, parece esforço destinado ao malogro certo inventar novo projeto, especialmente se não se sabe claramente por quê e para quê proceder a reforma política. O quadro partidário, nos últimos anos, sofreu alterações reveladas especialmente no declínio lento dos partidos tidos como de direita e no crescimento dos de esquerda. A fragmentação partidária não impediu Fernando Henrique e Lula de governarem. Na distribuição de forças, as diferenças com relação às eleições anteriores têm sido pequenas. PT e PMDB alteram-se, desde a eleição de 2006, nas primeiras posições, e o PSDB (junto com o PFL-DEM) declinou.

Por isso, a situação atual do PT da presidente Dilma parece um pouco melhor do que a vivenciada por Lula, sendo hoje o PT o primeiro partido na Câmara. Para relembrar: nas eleições de 2006, o PMDB obteve 89 cadeiras (90 na posse) contra 83 do PT. Em 2002, o PT conseguira 91 contra 84 do PFL, então o segundo partido. O PMDB tinha 66. Agora, nas eleições de 2010, baixou para 79, e o PT foi para 88.

Do ângulo do manejo da máquina estatal, os petistas e seus aliados no governo devem ter adquirido mais experiência administrativa, o que permite antever maior chance de que certos erros sejam evitados. Por outro lado - e apesar de serem quase inexauríveis as demandas da classe política por mais benefícios, favores e vantagens - é possível que as pressões do baixo e médio clero petista/sindical diminuam, sendo o governo Dilma favorecido pelo distributivismo anterior dos anos Lula. São especulações. Nas incertezas que sempre cercam a chegada de um novo governo, a performance da nova equipe dependerá amplamente da capacidade política e administrativa de Dilma, que enfrentará, nos primeiros anos de governo, a dura tarefa de adquirir fisionomia própria.

LEÔNCIO MARTINS RODRIGUES é cientista político