Título: Cenários apontam para retorno de conflito
Autor:
Fonte: O Globo, 10/01/2011, O Mundo, p. 21

Esta semana, os habitantes do sul do Sudão decidirão, por meio de referendo popular, se a região continuará fazendo parte do Sudão ou, votando pela secessão, se deverá ser criado um novo país, com capital em Juba. Estima-se que haja 3,8 milhões de eleitores no sul do país e que mais de 90% irão votar pela secessão da região.

O Sudão enfrentou um conflito interno por mais de 20 anos, caracterizado pelo embate entre as Forças do Governo do Sudão, ao norte, e o Movimento de Libertação do Povo do Sudão, ao sul. O confronto teve início em 1955, praticamente no mesmo período em que o país se tornara independente do domínio anglo-egípcio, em 1956. Segundo estimativas, mais de 2 milhões de pessoas morreram e 600 mil deixaram o país como refugiados.

Mesmo com todos os esforços realizados pela comunidade internacional e pela ONU, permanece ainda obscura a delimitação da fronteira entre norte e sul. Diversos impasses entre as partes continuam sendo discutidos, principalmente relativos às questões que envolvem as regiões conhecidas como ¿Três Áreas¿, que compreendem os estados de Kordofan do Sul, Nilo Azul e da Região de Abyei, em função de disputas pelos campos de petróleo (no caso de Abyei).

Segundo o United States Institute of Peace, dois cenários prospectivos para o Sudão apontam para um possível retorno dos conflitos no período pós-referendum. O primeiro indica a possibilidade de retorno da guerra, pois sem uma mudança na atual dinâmica das relações entre norte e sul é pouco provável que as partes estejam dispostas a discutir os principais problemas existentes no período pós-referendum. Desta forma, esta desconfiança mútua poderá levar ao início de uma corrida armamentista entre as partes, ameaçando a estabilidade na região.

Um segundo cenário envolve o que se pode chamar de uma onerosa secessão: caso não haja um fortalecimento institucional do governo do sul do Sudão (GoSS), o sul não se sustentará como Estado independente. A calma (relativa) atualmente existente no sul do país evoluirá para uma desestabilização social e, consequentemente, contribuirá para uma escalada da violência política no novo Estado, podendo, até mesmo, refletir no norte. As principais variáveis que poderão levar à desestabilização incluem a falta de capacidade de gerenciar e prover recursos básicos à população como distribuição de água e fornecimento de energia. Esse cenário sinaliza que o GoSS passaria a empregar a maior parte das receitas do petróleo em segurança militar, na tentativa de manter a ordem interna e como estratégia de dissuasão contra a possibilidade de ataques do Norte, em detrimento do desenvolvimento sócio-econômico do país. O estudo revelou, ainda, que haverá uma ascensão da corrupção no governo e, com a falta da aceitação popular, a situação será insustentável no período pós-referendum.