Título: Angra 3 de novo na pauta do TCU
Autor: Torres, Izabelle
Fonte: Correio Braziliense, 21/07/2009, Política, p. 6

Tribunal analisa processo que libera o término da construção da usina no Rio de Janeiro. Mas impasse quanto a valores pode atrasar retomada da obra

Em 17 de junho, o ministro José Jorge pediu vistas do processo, que volta a ser analisado amanhã

A etapa que falta para o governo retomar de vez as obras da Usina Termonuclear de Angra 3, no Rio de Janeiro, pode ser concluída amanhã. Está na pauta do Tribunal de Contas da União (TCU) o processo que analisa os termos e os preços do contrato firmado entre a Eletronuclear e a empreiteira Antonio Gutierrez, na década de 80. O grande impasse entre os ministros da corte gira em torno do valor do contrato, inicialmente estimado em US$ 1,8 bilhão, mas com custo atualmente estimado em US$ 3,4 bilhões. Técnicos do tribunal propuseram redução do valor da obra em cerca de R$ 470 milhões. Mas a Eletronuclear aceitou acordo para reduzir apenas R$ 88 milhões, enquanto a empreiteira briga para manter os atuais preços. Diante do jogo de interesses e das mais diferentes justificativas apresentadas à corte, caberá aos ministros encontrar consenso e estabelecer um percentual de redução dos custos para concluir o polêmico projeto.

Decidir sobre o valor que deve ser renegociado não será fácil. Há as mais diferentes opiniões entre os integrantes do tribunal. Depois de analisar os documentos e as justificativas da empreiteira e da Eletronuclear, empresa subsidiária da Eletrobrás e responsável pela construção da usina, os ministros têm defendido valores diversos para o corte dos custos. Por isso, acreditam que o julgamento de amanhã pode ser mais uma vez adiado. A análise do caso em plenário teve início em 17 de junho, mas depois de o relator Marcos Vilaça ler seu parecer, o ministro José Jorge pediu vistas do processo.

Apesar das divergências em torno dos preços do contrato, os integrantes da corte já possuem entendimento entre a necessidade de modificar outros pontos do antigo acordo. Um deles estabelece multa de 10% do valor total da obra em favor da empreiteira, caso a Eletronuclear retarde pagamentos ou esbarre em limitações e licenças que possam atrasar o andamento das obras. Os ministros devem recomendar a anulação desse artigo.

Vitórias O parecer do TCU sobre o contrato é praticamente a única pendência na lista de exigências para a retomada das obras de Angra 3. No último dia 8, a prefeitura de Angra dos Reis concedeu à

Eletrobrás a licença de uso do solo para o projeto da usina. Em março deste ano, a construção recebeu mais um aval. Dessa vez, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que concedeu a licença de instalação definitiva da usina, apesar de os responsáveis não terem cumprido a exigência de apresentar uma solução definitiva para depositar os resíduos nucleares.

Além do processo que consta na pauta de amanhã, outros acórdãos sobre a construção de Angra 3 já foram editados pelo TCU. No mais completo deles, o 2049/2008, a corte detectou diversas irregularidades. Entre elas, o fato de que a construtora alegava que seriam necessários mais R$ 7,3 bilhões para a construção da obra, sendo que o orçamento inicial não ultrapassava a marca de R$ 2 bilhões.

PROJETO

A usina nuclear de Angra 3 começou a ser construída na década de 80. O projeto prevê a construção em cima de rochas, diferentemente de Angra 2, que foi erguida sobre estacas escavadas. A usina deverá alcançar potência bruta elétrica de 1.400MW e térmica de 3.782 MW. De acordo com o projeto original, a usina terá capacidade de gerar 10,9 milhões de MWh por ano ¿ o suficiente para abastecer um terço de uma cidade do tamanho do Rio de Janeiro. A expectativa dos entusiastas do projeto é de que, somada às outras duas usinas existentes, Angra 3 possa fazer com que o complexo nuclear de Angra dos Reis atinja a capacidade de geração de cerca de 26 milhões de MWh por ano.

Memória Anos de polêmica

A construção da usina nuclear de Angra 3 foi iniciada em 1983, no governo do então presidente da República, João Figueiredo, e paralisada três anos depois, sempre cercada de polêmica. Na época, o governo federal alegou não ter condições de bancar a obra, estimada inicialmente em US$ 1,8 bilhão. Além disso, questões ambientais travaram a construção, já que ainda não havia um estudo sobre o impacto que a geração de energia nuclear poderia acarretar ao meio ambiente.

Mesmo durante o tempo em que ficaram paralisadas, as obras da usina tiveram um custo alto aos cofres públicos. A empreiteira Andrade Gutierrez, que venceu a concorrência na década de 80, continuou recebendo cerca de US$ 20 milhões para manter o canteiro de obras.

Depois de a empresa ter sido beneficiada por anos, o governo Lula surpreendeu e decidiu revalidar o contrato da União com a construtora, em vez de realizar nova licitação. Com a renovação do contrato, as obras puderam ser retomadas.