Título: Capital especulativo na mira
Autor: Duarte, Patrícia ; Bôas, Bruno Villas
Fonte: O Globo, 05/01/2011, Economia, p. 19

Mantega diz que controlar ingresso de recursos no país está em estudo pelo governo. Dólar reage e chega a subir 1,2%

Confirmando que o câmbio é preocupação central do governo Dilma Rousseff, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, subiu ontem o tom que já havia sido dado na véspera pelo ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, e desafiou o mercado dizendo que o Brasil não deixará o dólar derreter. Ele deixou claro que o controle de capitais é uma opção concreta na mesa da equipe econômica e reafirmou o compromisso com um ajuste fiscal que freie a demanda do Estado sobre a economia e ajude o Banco Central (BC) a reduzir os juros, tornando o mercado brasileiro menos atraente aos especuladores.

- Não vamos permitir que o dólar derreta. O governo não medirá esforços para impedir a queda da moeda americana. São infinitas as medidas que podemos tomar. Uma delas é administrar o ingresso de capital especulativo de curto prazo - disse.

O mercado de câmbio reagiu de imediato às declarações. Um dia depois de bater sua menor cotação desde 1º de setembro de 2008, o dólar comercial voltou a subir ontem. A moeda americana chegou a avançar 1,21% após o ministro Mantega convocar a entrevista sobre o assunto. Mas, como nenhuma medida foi anunciada, a moeda perdeu fôlego e fechou negociada a R$1,664, em alta de 0,78%.

Reembolso mais flexível a exportador

Solange Srour, economista-chefe da BNY Mellon Arx, afirma que a convocação da entrevista criou expectativa de medidas, como uso do Fundo Soberano Brasileiro (FSB) ou uma nova taxação sobre capital estrangeiro:

- O ministro costuma alertar o mercado antes de tomar alguma medida no câmbio. Mas isso acontece de forma menos formal. Desta vez, ele convocou uma entrevista coletiva para o alerta, o que não é comum. E criou assim uma expectativa muito forte.

O Brasil já vem adotando desde outubro medidas de controle, como a elevação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) - de 2% para 4% e, depois, para 6% - para aplicações em renda fixa. No entanto, o cardápio pode ser muito mais duro com os investidores do que a subida de um tributo. Entre as barreiras, pode haver quarentena, limite de exposição às moedas local e americana, aumento das garantias mínimas, entre outras.

O país também foi um dos mais ativos integrantes do grupo das 20 maiores economias do mundo (G-20) a exigir, na reunião de novembro, que o controle de capitais fosse aceito como forma de defesa contra medidas de terceiros países fortes - como EUA, China e os da União Europeia - que tenham impacto sobre os demais.

Mantega também anunciou uma ampliação do regime de ressarcimento de créditos tributários aos exportadores, para dar mais competitividade ao setor. Os critérios para que as empresas recebam crédito de PIS/Cofins e Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) mais rapidamente (em até 30 dias) ficaram mais flexíveis. Para ter direito ao incentivo agora, a empresa tem que ser exportadora há, pelo menos, dois anos (antes eram quatro) e ter 15% de seu faturamento provenientes de venda ao exterior (antes eram 30%).

O incentivo, no entanto, ainda é tímido. O ressarcimento acelerado foi anunciado em maio do ano passado, mas, até dezembro, apenas 55 empresas conseguiram obter créditos mais rapidamente, num montante de R$143,5 milhões. A Receita Federal calcula que o total de exportadores com direito à devolução cresça 20%.

O ministro afirmou que o governo já está fazendo também um esforço para ajudar a equilibrar o câmbio por meio do controle das despesas públicas. Segundo ele, os cortes que estão sendo estudados no Orçamento de 2011 vão ajudar a reduzir a demanda.

- Essa ação vai ajudar a política antiinflacionária do BC para que ele possa reduzir juros quando achar necessário - afirmou o ministro.

Mantega afirmou ainda que o governo continuará atuando na área comercial, por meio de medidas de competitividade, e diretamente no mercado, para segurar o dólar.

Na esfera do BC, os técnicos acreditam que não há medidas novas além de continuar comprando dólares no mercado para compor as reservas, que já estão próximas de US$290 bilhões. Em dezembro, até o dia 17 (último dado disponível), o país já havia comprado US$1,163 bilhão.

O câmbio será destaque na primeira reunião ministerial marcada pela presidente Dilma Rousseff para dia 14.

COLABOROU Luiza Damé