Título: Presidente do BC alerta sobre dívidas em dólar
Autor: Duarte, Patrícia
Fonte: O Globo, 07/01/2011, Economia, p. 25

EFEITO CÂMBIO: Alexandre Tombini volta a defender a redução da meta de inflação do país no futuro

"Câmbio flutuante flutua para os dois lados", afirma. Mantega avisa que novas medidas podem ser adotadas

BRASÍLIA. Embora a perspectiva seja de que o dólar continue barato, o novo presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, alertou ontem que o brasileiro deve ter cautela ao se endividar em moeda estrangeira. Ele lembrou que o regime cambial brasileiro é flutuante e, por isso, uma tendência de curto prazo não necessariamente se prolongará indefinidamente. O dólar tem se mantido abaixo de R$1,70, incentivando cada vez mais compromissos em moeda estrangeira, como viagens e financiamentos.

- Esse câmbio flutuante flutua para os dois lados. Então, o cidadão brasileiro, as empresas brasileiras, têm de ter cautela quando assumem compromissos em moeda estrangeira, aquela moeda que não é a dos seus salário e faturamento - afirmou ontem Tombini, em sua primeira entrevista coletiva como comandante do BC.

Já o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse ontem que a decisão do BC de limitar a posição em câmbio vendida dos bancos "vai no cerne da questão", mas indicou que novas ações poderão sair do papel se a cotação do dólar insistir em derreter. Para o ministro, a maior pressão sobre o câmbio hoje está no mercado futuro, que é afetado diretamente pela nova medida. Isso porque a posição dos bancos funciona como uma bússola para as apostas do mercado em contratos derivativos, cujo volume é muito grande.

- É uma medida positiva, que vai no cerne da questão. Hoje, a cotação do dólar se faz mais no mercado de derivativos futuro do que no mercado à vista (atingido diretamente pela decisão de ontem do BC). É quase como se fosse uma taxação para excesso de posição vendida - disse Mantega. - A cada momento você examina e vê de onde vem a pressão. Temos de observar e tomar medidas adequadas sem precipitação. O dólar é flutuante, não dá para arriscar.

Tombini diz que cenário externo pressiona o real

Tombini, por sua vez, também mencionou a preocupação com o cenário externo e seu excesso de liquidez, que acaba mantendo o real valorizado frente ao dólar. O novo presidente do BC disse que esse cenário ainda é volátil, oriundo da recuperação mais lenta das economias desenvolvidas e de sua consequente política monetária expansionista, que inunda o mercado com recursos para incentivar o consumo.

Isso é especialmente verdade nos EUA. Como o aquecimento da atividade econômica ainda é frágil, os investidores acabam buscando alternativas, como os mercados emergentes, que normalmente pagam juros mais altos. No Brasil, por exemplo, a Selic está em 10,75% ao ano, uma das maiores do mundo.

- É um ambiente (externo) desafiador. Existe uma ampla liquidez internacional, e isso tem gerado desdobramentos para as economias emergentes, principalmente aquelas com grau de abertura econômica maior, como o Brasil.

Tombini argumentou ainda que a medida anunciada ontem pelo BC, que limita a posição vendida dos bancos - quando apostam numa valorização do câmbio frente ao dólar - e ajuda a segurar o "derretimento" do dólar, tem caráter prudencial. Ele, porém, fez questão de afirmar que o país não se fechará para capitais externos.

- Isso não quer dizer, muito pelo contrário, que o Brasil não continua aberto para fluxos externos - disse o presidente do BC.

Ele voltou a dizer que o país tem condições de buscar uma menor meta de inflação - fixada em 4,5% pelo IPCA, com margem de dois pontos percentuais para mais ou para menos em 2011 e 2012 -, mas não quis colocar prazos. Para ele, outro foco do BC é o mercado de crédito, sobretudo o imobiliário, que continuará crescendo de forma vigorosa.

Para secretário, medidas reduzirão volatilidade

Já Mantega destacou que, há um ano, o mercado tinha mais posições compradas que vendidas em contratos futuros, mas esse quadro se inverteu agora. Segundo o ministro, o governo está acompanhando a movimentação para tomar medidas gradualmente. Mas o ministro sinalizou que o problema no câmbio está longe de acabar. Segundo ele, a cotação da moeda americana é alvo de pressões tanto no mercado doméstico quanto no internacional:

- Vamos observar. O dólar é flutuante, não dá para arriscar (uma cotação com a nova medida do BC). Ele sofre influências internas e externas. Na semana passada, ele estava se desvalorizando. Ontem (anteontem), ele estava se valorizando.

O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, também afirmou que a nova medida terá impacto gradual no mercado de câmbio. Segundo ele, é mais uma forma de influenciar as expectativas dos investidores e evitar uma volatilidade maior no mercado no futuro.

- Ela vai direção correta, mas é uma medida compulsória, que não proíbe, só aumenta o custo das operações. Ela interfere no planejamento dos bancos, principalmente nessas operações de intermediação, de tomada de empréstimo lá fora e aplicação de recursos aqui dentro - afirmou Barbosa.