Título: Barreiras a capital têm riscos
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Fonte: O Globo, 06/01/2011, Opinião, p. 6

As exportações brasileiras bateram recorde no ano passado, ultrapassando pela primeira vez a barreira dos US$200 bilhões. O resultado surpreendeu em dezembro, com vendas de mais de US$5 bilhões, o que elevou o superávit da balança comercial para US$20,3 bilhões, bem acima de todas as previsões (do mercado ou do próprio governo).

As exportações vêm sendo impulsionadas mais por produtos básicos do que por manufaturados. Petróleo, minérios, soja e café se destacaram na pauta brasileira, enquanto a participação de bens manufaturados encolheu. Isso causa certa preocupação, pois pode ser consequência de perda de fôlego da indústria de transformação instalada no país.

Mas há também outros fatores a se considerar. Além de os preços dos produtos básicos estarem mais favoráveis do que os de bens industrializados no mercado internacional (pois a demanda se concentra em mercados emergentes que no momento importam mais os chamados produtos primários, enquanto as economias ricas estão ainda com estoques de manufaturados), o Brasil tem mais facilidade para aumentar rapidamente a oferta desses itens.

No entanto, não se pode subestimar o impacto da valorização do real sobre a cadeia produtiva. As condições atuais da economia brasileira não justificariam uma desvalorização da moeda nacional. Mas também uma valorização excessiva é capaz de provocar desequilíbrios indesejáveis no futuro.

A entrada de recursos externos supera a saída na economia brasileira. Essa sobra é absorvida em parte pelo mercado, e o Banco Central. A acumulação de reservas - já na faixa dos US$290 bilhões - pelo BC gera efeitos fiscais e monetários desfavoráveis, de modo que tal iniciativa não pode ser usada irrestritamente.

O ideal seria o Brasil subtrair fontes de atração de capitais de curto prazo, entre os quais o diferencial de taxa de juros em relação ao mercado internacional. Mas a queda dos juros não seria viável atualmente, devido à necessidade de se conter as pressões inflacionárias. Nesse quadro, o recomendável é o setor público moderar sua demanda, contendo gastos. O novo governo tem dado sinais de que pretende pôr essa política em prática, mas levará algum tempo até que se possa colher os frutos.

Assim, no curtíssimo prazo, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, ameaça com restrições à entrada de capitais financeiros. É uma possibilidade que as autoridades de fato não podem descartar - e nesse sentido já há uma taxação expressiva, de 6% de IOF, sobre aplicações em títulos de renda fixa, por exemplo. Porém, são medidas de caráter extremo, às quais só é aconselhável recorrer em situações muito delicadas, o que não parece ser ainda o caso do Brasil. O risco dessas restrições está em não se conseguir separar o joio do trigo.

A criação de barreiras à entrada de capitais pode dificultar também os investimentos diretos que ajudam a economia a crescer de maneira sustentável. Há que se pensar duas vezes antes de seguir por este caminho.