Título: Em estudo, combinação de IOF maior e quarentena
Autor: Duarte, Patrícia
Fonte: O Globo, 06/01/2011, Economia, p. 21

Equipe econômica quer elevar custos de investidor externo. BC convoca entrevista coletiva para as 8h de hoje

BRASÍLIA, RIO e SÃO PAULO. O arsenal infinito que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, diz ter contra a queda do dólar inclui a possibilidade de um novo aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) na entrada de capital estrangeiro no país, a imposição de uma quarentena para esses recursos e até a combinação das duas medidas. Ambas têm como efeito impor um custo adicional aos aplicadores que buscam o mercado brasileiro, reduzindo seus ganhos. Outra possibilidade é usar o Fundo Soberano do Brasil para comprar dólares no mercado. Ontem à noite, o Banco Central convocou para hoje, às 8h, uma entrevista coletiva. Cabe ao BC implementar boa parte do arsenal do governo contra o derretimento do dólar.

Os técnicos sabem, no entanto, que qualquer iniciativa será paliativa diante da desvalorização global do dólar. Nos bastidores, o governo está, na verdade, cruzando os dedos e contando com um ajuste no mercado cambial o mais rapidamente possível - algo que sempre acontece depois de uma queda muito grande na cotação de uma moeda.

- O ajuste no câmbio vai acontecer - disse um integrante da equipe econômica, reconhecendo, porém, que as taxas ficarão abaixo do nível considerado ideal, por exemplo, pelos exportadores.

Segundo ele, mais preocupante que o dólar ficar baixo é haver muita volatilidade no mercado.

O governo tem consciência de que o mundo vive uma fase de extrema liquidez. Portanto, ainda que os investidores sejam aconselhados pelos bancos a terem cautela na exposição ao real, eles têm margem (volume de recursos) para bancar um risco maior e continuar entrando nos mercados, inclusive no Brasil, mesmo com medidas de controle de capital.

Dólar tem segunda alta seguida, de 0,66%, para R$1,675

Para Francisco Carvalho, analista de câmbio da corretora BGC Liquidez, o governo não conseguirá conter a alta do real a curto prazo:

- O ministro tenta segurar um pouco no gogó e o mercado fica reticente por um tempo em apostar numa queda maior do dólar. Mas isso funciona por alguns dias.

O especialistas em câmbio Nathan Blanche, sócio da consultoria Tendências, afirma que só a alta dos juros nos EUA pode interromper o recuo do dólar frente ao real. E André Perfeito, economista da Gradual Investimentos, vê falhas nos planos do governo:

- Se o ajuste fiscal for realmente severo, vai apenas evitar uma alta dos juros, não provocar sua queda. O diferencial dos juros vai continuar muito atraente. Ao mesmo tempo, a demanda doméstica vai se reduzir e as empresas terão de exportar mais, aumentando a entrada de dólares no país.

Puxada pelo otimismo com o mercado externo, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) passou ontem a barreira dos 71 mil pontos pela primeira vez desde 11 de novembro. O Ibovespa, seu índice de referência, subiu 1,10%, aos 71.091 pontos, no sexto pregão seguido de valorização. Com a expectativa de novas medidas do governo, o dólar teve a segunda alta consecutiva, de 0,66%, a R$1,675.

Petrobras PN subiu 1,19%, e Vale PNA, 1,44%. BM&FBovespa ON teve a maior queda do Ibovespa, 2,31%, com a notícia de que alguns investidores planejam criar uma bolsa alternativa.

As tentativas do governo de segurar o câmbio, como a alta do IOF, até agora tiveram efeito residual no mercado. Esta semana, por exemplo o dólar atingiu o menor patamar desde 2008: R$1,651.

Como os estrangeiros vêm ao Brasil em busca dos juros elevados, Mantega tem destacado que o governo fará um corte significativo de despesas, dando espaço ao BC para reduzir as taxas. Mas não haverá efeito a curto prazo.

Por isso, a equipe econômica se prepara para fazer desonerações tributárias e agir na área de comércio exterior. O governo planeja estrear uma lei que permite frear importações de países que sejam parte de triangulação, como O GLOBO antecipou ontem. Seriam taxadas as compras de calçados de Vietnã, Malásia e Cingapura, usados pela China para entrar no Brasil.

COLABORARAM: Bruno Villas Bôas, Lucianne Carneiro e Ronaldo D"Ercole