Título: Inflação e câmbio, dilema dos emergentes
Autor: Rodrigues, Luciana
Fonte: O Globo, 09/01/2011, Economia, p. 30

Crescimento acelerado e moeda forte leva países a medidas pouco ortodoxas

Depois de o Brasil registrar, em 2010, crescimento econômico recorde e a maior inflação em seis anos, analistas dão como certo que o Banco Central (BC) elevará a taxa básica de juros Selic no próximo dia 19. Uma subida na taxa terá como efeito colateral inevitável nova pressão sobre o real, já que os juros maiores tendem a atrair mais investimentos externos. O dilema de conter a atividade econômica, segurar a inflação e, ao mesmo tempo, evitar nova apreciação cambial não é exclusivo do Brasil.

Segundo estudo do HSBC, os países emergentes tiveram uma aceleração do crescimento no último trimestre e, 2011, nessas economias, terá o sabor amargo da inflação - em muitos casos, a alta dos preços internos ocorrerá mesmo com uma moeda apreciada. E, assim como o Brasil, esses países estão adotando políticas nem tão ortodoxas para sair dessa encruzilhada.

O HSBC Emerging Markets Index (EMI, calculado pela Markit Economics em parceria com o HSBC) do último trimestre de 2010 mostra que, nos 16 países emergentes de maior relevância na economia global, a atividade econômica subiu de um índice de 54,2 para 55,7 (números acima de 50 indicam expansão). Mas o EMI, que é divulgado trimestralmente, revela também que os preços nesses países subiram a níveis não vistos desde a disparada nas cotações de commodities e de energia de 2008.

O problema é que, desta vez, o mundo rico está em crise e políticas como o afrouxamento quantitativo dos EUA (injeção de recursos na economia) tem derrubado o dólar em todo o planeta. Então, muitos países emergentes, destaca o relatório, adotaram políticas que se assemelham ao que Stephen King, economista-chefe do HSBC, chama de "quantitative tightening" (ou "aperto quantitativo", em oposição à política americana). O relatório cita Hong Kong, que aumentou a exigência de garantias no crédito imobiliário, e a China, que elevou compulsório.

No Brasil, aperto fiscal seria melhor, diz economista

"É difícil culpar os emergentes por usar políticas não convencionais quando os ricos estão jogando o mesmo jogo", diz King no relatório, que será divulgado amanhã e foi obtido com exclusividade pelo GLOBO. Qualquer semelhança com o Brasil não é mera coincidência. Em dezembro, o Banco Central (BC) elevou o compulsório sobre depósitos à vista e a prazo e aumentou exigências para financiamentos a longo prazo. O objetivo era frear a atividade econômica. Semana passada, o alvo foi a queda do dólar e o BC criou um compulsório de 60% para posições vendidas de câmbio.

- Mais medidas nessa direção (pouco ortodoxas) devem ser feitas aqui e em outros países. Porém, no caso brasileiro, o ideal seria um aperto fiscal mais forte - diz Constantin Jacso, economista do HSBC Bank Brasil.

Jacso acrescenta que o maior "quebra cabeça para a política econômica brasileira" nos próximos anos será a necessidade de financiar um forte aumento dos investimentos. Para isso, o Brasil terá que lançar mão de poupança externa, o que acentuaria a valorização do real. E nesse caso, novamente, um ajuste fiscal seria bem-vindo: reduzindo a poupança negativa do governo (que gasta mais do que arrecada), aumentaria a poupança interna do país.