Título: Juros da dívida consomem R$ 1tri
Autor: Nunes, Vicente
Fonte: Correio Braziliense, 22/07/2009, Economia, p. 12

Corte de 0,50 ponto na taxa Selic, que deve ser anunciado hoje, ajudará o governo a economizar cerca de R$ 40 bi até o fim do ano com o pagamento de encargos do endividamento público

Desde que foi empossado, em janeiro de 2003, até maio deste ano, o governo do presidente Lula já pagou R$ 1 trilhão em juros da dívida pública. Esse volume de dinheiro corresponde a um terço do Produto Interno Bruto (PIB), a soma de todas as riquezas produzidas pelo país. Somente nos quatro primeiros anos da atual administração, a dívida consumiu R$ 603,2 bilhões em juros, gasto 53% superior ao registrado nos últimos quatro anos da administração Fernando Henrique Cardoso (R$ 393,3 bilhões). Essa comparação é apontada pelos economistas como a mais correta, pois, nos dois períodos, a economia brasileira esteve sustentada pelo mesmo tripé: câmbio flutuante, superávit primário e metas de inflação.

Não é à toa que Lula torce, dia e noite, para que o Banco Central (BC) não interrompa o processo de ciclo de corte da taxa básica de juros (Selic), iniciado em janeiro deste ano. No seu entender, despesas menores com a dívida permitem ao governo destinar mais recursos para projetos que tenham maior impacto na atividade econômica, como a redução de impostos e o aumento a servidores públicos e à remuneração do Bolsa Família. Lula já foi avisado pelo presidente do BC, Henrique Meirelles, que, pelo menos hoje, a Selic cairá mais um pouco ¿ 0,5 ponto percentual, segundo o mercado. Mas não há garantias de novas baixas a partir daí, apesar de a inflação estar sob controle e o nível da atividade se mostrar bastante fraco.

Para se ter uma ideia do peso dos juros, entre janeiro e maio, já sob o efeito parcial do corte da Selic, que, no período, caiu de 13,75% para 10,25%, as despesas com a dívida totalizaram R$ 65,3 bilhões, encolhendo R$ 10,2 bilhões ante os gastos realizados nos cinco primeiros meses de 2008 (R$ 75,5 bilhões). Nas contas de Carlos Thadeu de Freitas Gomes, economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC) e ex-diretor da Dívida Pública do BC, se a Selic cair mais 0,5 ponto hoje, dos atuais 9,25% para 8,75%, o governo economizará, até o fim do ano, cerca de R$ 40 bilhões em juros.

¿Não há nada que justifique uma interrupção da queda dos juros neste momento¿, disse Freitas Gomes. ¿Acredito que, como a inflação está próxima do centro da meta, de 4,5%, há espaço para a Selic baixar até os 8,5%. Ou seja, não descarto a possibilidade de o Copom anunciar um corte de 0,75 ponto¿, acrescentou. Caso, porém, venha o 0,5 ponto de baixa esperado, poderá haver mais uma queda de 0,25 ponto em setembro. ¿O importante é que os juros caiam mais. Isso dará um forte alívio no caixa do governo e, por tabela, no nosso bolso, pois pagamos os impostos que bancam o custo da dívida.¿

Momento de coragem

Mestre em finanças públicas pela Fundação Getulio Vargas (FGV), o consultor Amir Khair garante que não há razão para o Brasil continuar ostentando o título de campeão mundial dos juros altos. ¿O país tem uma política fiscal consistente e a inflação vem se mantendo há anos dentro das metas perseguidas pelo BC¿, assinalou. A seu ver, nem mesmo o fato de o governo ter aumentado os gastos para reduzir os impactos da crise mundial na economia inibe uma ação mais agressiva do BC. ¿Continuamos fazendo superávit primário, enquanto as maiores economias do mundo registram déficits enormes, e a relação entre a dívida e o PIB se mantém estável, com tendência de queda no ano que vem¿, acrescentou.

Para Khair, o BC não pode deixar escapar momento tão favorável para a queda dos juros, sobretudo pelos reflexos positivos que a Selic menor terá sobre as contas públicas no futuro. Ele sustenta essa afirmação com dados referentes a 1997 e 2008. Se, nesse período, a taxa média de juros tivesse sido de 13,6% e não de 18,7% ao ano, o governo poderia ter economizado R$ 1,4 trilhão em juros. E se, além da Selic menor, o governo fizesse superávits primários acima de 3% do PIB ao ano, como se viu nos últimos anos, a dívida líquida do setor público, que fechou maio em R$ 1,2 trilhão, estaria zerada. ¿Assim, em vez de gastar com juros, o governo poderia estar investindo no crescimento econômico¿, afirmou.

Estabilidade

Na opinião de Freitas Gomes, ex-BC, é difícil dizer hoje se o Brasil poderia ter reduzido os juros mais rapidamente, mas não há como negar que o custo da estabilidade econômica alcançada foi muito alto. ¿Está evidente que o país pode conviver perfeitamente com juros reais (descontada a inflação) entre 4% e 5%. As contas públicas, mesmo com os gastos não sendo de boa qualidade, estão saneadas. Não há mais o risco de insolvência (calote) nem dívida dolarizada, sempre um problema em períodos de crise¿, ressaltou.

Para Ilan Goldfajn, economista-chefe do Itaú-Unibanco e ex-diretor de Política Econômica do BC, além de um corte de 0,5 ponto hoje, o Copom deve reduzir a taxa básica em mais 0,5 ponto em setembro. ¿Flexibilidade (na política monetária) é um bem desejável neste momento¿, sentenciou.

TAXA MENOR NA CAIXA A Caixa Econômica Federal se antecipou à decisão do Copom e reduziu, pela sétima vez neste ano, as taxas de juros de 13 das suas principais linhas de crédito. O corte beneficiará pessoas físicas e empresas e passa a valer a partir da próxima segunda-feira, 27, com exceção das operações rotativas que têm vigência a partir de agosto. As taxas de linhas de crédito pessoal caíram até 17,72%, passando de 4,91% ao mês para 4,04% ao mês. O banco também diminuiu as taxas do penhor de 2,08% para 2,05% ao mês. No consignado, o custo máximo mensal passou de 2,31% para 2,28% e o mínimo foi mantido em 0,85%. Os juros do cheque especial também foram reduzidos. A taxa mínima passou de 1,20% para 1,15% ao mês. Para pessoa jurídica, as taxas do cheque empresa caíram até 3,18%. Para médias e grandes empresas, houve redução no desconto de cheques e duplicatas.