Título: Fartura no mercado externo
Autor: D"Ercole, Ronaldo
Fonte: O Globo, 14/01/2011, Economia, p. 19
EFEITO CÂMBIO
Empresas brasileiras já emitiram US$2,7 bi em títulos este ano. Em 2010, total foi recorde: US$40 bi
As empresas e os bancos brasileiros nunca captaram tanto dinheiro lá fora com a emissão de títulos. Do início do ano até ontem, cinco grupos - BR Malls, Bradesco, Banco do Brasil, Santander e banco Cruzeiro do Sul - já concluíram emissões lá fora, em operações que, juntas, levantaram US$2,76 bilhões. O excesso de liquidez nos mercados internacionais e os juros baixos resultantes das politicas monetárias expansionistas nos Estados Unidos e Europa, que tentam reerguer suas economias, criaram um cenário muito favorável para as empresas brasileiras buscarem lá fora recursos para financiar os investimentos aqui. Em 2010, entraram nos cofres das companhias brasileiras US$40,37 bilhões por meio das emissões de papéis, como bônus e commercial papers. O volume, 53% maior do que os US$26,2 bilhões levantados em 2009, é recorde, de acordo com a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais (Anbima).
- O primeiro trimestre tende a ser muito aquecido, porque a economia brasileira está muito forte e o dinheiro de longo prazo para as empresas no Brasil ainda é escasso - diz diretor Alexandre Aoude, diretor-executivo do Itaú BBA.
Mais lançamentos de bônus perpétuos
A maior operação deste início de ano foi fechada ontem pelo BB, que emitiu 750 milhões em bônus com prazo de cinco anos, pagando juros de 4,625% ao ano. Ainda em Londres, ontem, o vice-presidente de Finanças e Relações com Investidores do BB, Ivan Monteiro, comemorava a primeira captação do banco no mercado europeu desde 2003.
- Retornamos a esse mercado, que volta a ser uma fonte adicional de funding importante, possibilitando ao banco manter a liderança no financiamento às exportações Brasileira - disse Monteiro, informando que a demanda pelos papéis do banco chegou a 1,4 bilhão.
Os bancos têm aproveitado bastante as boas condições de captação no exterior. Dos US$40,3 bilhões levantados lá fora com a emissão de títulos no ano passado, US$21,3 bilhões, ou 53%, foram para reforçar o caixa de empresas não financeiras, enquanto que US$14,2 bilhões (35%) ficaram com os bancos.
A maior parte foi de "dívida subordinada", ou seja, recursos que servem para aumentar a capacidade de financiamento dos bancos. Recorreram a essas operações tanto bancos menores, como o BicBanco e ABC, como Itaú Unibanco, Santander, Bradesco e BB.
- O mercado está muito aberto e é uma oportunidade para a diversificação de prazos das captações, a custos menores. Em 2010, o mercado teve um apetite forte, os bancos souberam aproveitar e o ano começou nessa linha - diz Fábio Mentone, diretor de Investimentos do Bradesco BBI, que na semana inaugurou a temporada de captações, com a emissão de US$500 milhões em bônus.
Em 2010, o governo federal captou apenas US$2,8 bilhões lá fora com o relançamento de um bônus global, enquanto que o BNDES levantou US$1,9 bilhões com debêntures.
O maior interesse por papéis brasileiros reabriu também às empresas brasileiras o mercado para as emissões de títulos perpétuos (sem prazo de vencimento). Companhias como Odebrecht, Braskem e InBev aproveitaram para fazer novas emissões.
- Esse dinheiro é quase um investimento direto por não ter prazo - observa Aoude, do Itaú BBA.
As boas condições para buscar recursos lá fora, contudo, levaram a um maior endividamento nos últimos dois anos. Levantamento da consultoria Economática mostra que, entre setembro de 2009 e o mesmo mês de 2010, o estoque de dívidas em moeda estrangeira das 291 empresas brasileiras de capital aberto aumentou 32%, passando de US$115,7 bilhões para US$153,8 bilhões.
- Desse aumento de US$37 bilhões no estoque de dívidas, parte veio de novos empréstimos diretos tomados junto a bancos - observa Einar Rivero, da Economática.
A elevação do endividamento decorrente do aumento das captações, observa Luiz Miguel Santacreu, analista da Austin Rating, exige das empresas uma gestão mais eficiente da variável cambial em seus balanços.
- O governo já sinalizou que vai intervir para calibrar o nível do dólar, o que representa um componente novo de incerteza cambial, que deve ser considerada nas decisões de novas emissões - diz.