Título: Dilma será muito transparente e honesta. Ela não esconde nada
Autor: Rousseff, Dilma
Fonte: O Globo, 16/01/2011, O País, p. 9
Único irmão da presidente, que nunca apareceu, conta como a vê Ninguém viu o senhor na festa da posse da presidente Dilma...
IGOR ROUSSEFF: Fiquei meio escondido no meio da multidão. Sou tímido.
Tímido? Sua irmã é tão corajosa...
IGOR: Uma safra nunca sai igual à outra. Temos personalidades parecidas; as atitudes é que são diferentes. A Dilminha gosta de certas coisas públicas, e eu não. Sou mais parado. Ela pensa antes no que vai fazer. Não aceita fazer nada que não vai aguentar fazer. Mas, se aceita, ninguém tenha dúvida de que ela vai fazer direito.
O senhor e a presidente são meio afastados. Quando se separaram?
IGOR: A gente não se separou. A gente se afastou fisicamente, mas estamos sempre ligados. Eu é que caí no mundo cedo. Cada um foi para um lado. Passei mais tempo sem ver minha mãe do que a Dilma. Aos 18 anos, fui para o Canadá ver as coisas por lá. Depois, fui para os Estados Unidos. Tinha acabado o movimento beatnik e começado o movimento hippie. Eu gostava de ver as palestras do Martin Luther King no Central Park. O pessoal dos Panteras Negras passava por mim e gritava: "white trash!" (lixo branco). Mas não me sentia atingido. Nem americano eu era. Tinha consciência política, mas não me envolvi com nenhum movimento.
Quando voltou, cada um foi para um lado...
IGOR: Ficamos juntos mais ou menos até a época do vestibular. Depois, ela foi presa e eu também sumi. Fui fazer Direito na UnB. Já advogado, fui para Salvador e trabalhei em hotelaria lá e no Rio de Janeiro. Fiz jornalismo, turismo, história e depois me interessei por aviação. Tirei o brevê, mas quando ia para o Rio fazer um curso de controle de voo, tive um acidente na estrada e entendi aquilo como um prenúncio de que minha carreira na aviação não daria certo. Hoje tenho residência fixa em Belo Horizonte, Juiz de Fora e Passatempo (cidade onde a família Rousseff se fixou). E agora vou para onde tiver emprego. Trabalho com consultoria jurídica e controle de patrimônio.
Com a eleição da presidente, o senhor vai para Brasília?
IGOR: Vamos continuar afastados. O que vou fazer em Brasília? Vou ficar rabeando ela? Não quero atrapalhar. O que nos aproxima muito é minha mãe. Ela e tia Arilda, uma solteirona que é nossa segunda mãe, estão lá dando uma força para Dilma. Se elas me chamarem para alguma coisa especial, vou até amanhã. Mas não tem nada programado. Gosto muito de Brasília, mas é meio fora de mão.
Fica parecendo que o senhor tem uma relação meio fria com a presidente.
IGOR: Não somos frios, não. Somos assim mesmo. Durante a campanha em Minas, fui a três comícios da Dilma: a um, assisti de longe. Em outros dois, cheguei perto. E lógico que ela me reconheceu. É minha irmã.
A presidente ofereceu algum cargo ao senhor?
IGOR: Nem eu aceitaria! Cargo público não aceito nem de graça. Ela mostrou que é competente. Não sou tão competente. Não daria conta do recado nem numa prefeiturazinha pequenininha. Dilma sempre foi contra o nepotismo e não faria isso nunca.
Como está a reação nas ruas com a eleição de sua irmã?
IGOR: O povo me enche o saco. Onde vou, querem conversar sobre curiosidades, saber o que ela fez, o que vai fazer, querem descobrir o que tem por trás de cada boato. Isso tudo que você está me perguntando (risos)...
Dizem que o senhor não gosta de falar que é irmão da presidente Dilma.
IGOR: Tenho um fusquinha, uma caminhonete e uma motinha. Uma vez parei em Juiz de Fora com meu fusquinha, um cara viu a placa de Passatempo, onde fomos criados, e me falou: você sabia que a ministra Dilma é de Passatempo? Dei de ombros, mas falei: Sei que a Dilma é de Passatempo porque ela é minha irmã. O cara riu e disse: "Ah é? E eu sou irmão do presidente Lula..." Por isso não falo de jeito nenhum que sou irmão dela. Também sai muito boato de que eu morri. Já me mataram muitas vezes. Mas não ligo. Não vou atrás para desmentir (foi um meio irmão de Dilma, o búlgaro Lúben, que faleceu).
É complicado ser irmão da presidente? É um peso?
IGOR: Isso não é um peso para mim de jeito nenhum! Eu me sinto bastante orgulhoso. Quando a gente vê um estranho que chega lá depois de perseguir seu objetivo, já acha bom, imagina quando é um irmão, uma pessoa tão próxima? Estudo muita filosofia budista. Uma pessoa que plantou feijão nunca vai colher trigo. As pessoas colhem o que plantam. Dilma está colhendo o que plantou.
O que o senhor se lembra de sua infância com Dilma?
IGOR: Quando era pequena, a Dilminha voava. Minha mãe penou com ela. Vivia dizendo: "Menina, desce do telhado; menina desce do abacateiro!" Depois, ela foi crescendo e perdendo as asas...
Acha que ela fez a coisa certa na luta contra a ditadura? Tinha medo por ela?
IGOR: Nunca tive premonição do tipo: vão matar essa menina na prisão. Não dava para ter muito medo porque não tinha noção do que se passava. Não tinha medo por ignorância. Depois que ela foi presa e processada, sabíamos que não seria morta porque já era um caso público. Ela fez o que tinha que fazer.
O que o senhor acha que será o grande feito de Dilma na Presidência?
IGOR: Ela vai diminuir a pobreza. Dilma e Lula descobriram que, para acabar com a pobreza, tem que melhorar para todo mundo. Dilma será muito transparente e honesta. Ela não esconde nada. Se tiver qualquer crise, um escândalo, todo mundo vai saber. Ela sabe que, nessas situações, a melhor coisa é dar publicidade e não esconder.
É difícil lidar com o humor dela? É brava?
IGOR: A Dilma engana muito. Mas o que quer é resultados. Se a pessoa administra uma empresa, por exemplo, dá tarefas, tem hora que tem de falar grosso.Todo mundo acha que a Dilma é mal humorada. Ela tem um humor fino, muito sutil. Mas haja cultura para entender o humor dela! Sabe quando a pessoa entende o humor da Dilma? Quando vê que, mesmo carrancuda, ela resolve o problema. Quando alguém precisa, pode saber que pode contar com ela.
Vamos fazer uma foto?
IGOR: Foto minha só se você tirar escondido, no meio da rua, com uma supercâmera teleobjetiva...