Título: Corrida à Bolsa
Autor: Bôas, Bruno Villas
Fonte: O Globo, 18/01/2011, Economia, p. 23

Empresas brasileiras devem captar até R$ 51 bi na Bovespa este ano. Objetivo é investir e comprar rivais

Oforte ritmo de crescimento da economia vai provocar este ano uma corrida de empresas brasileiras para captar dinheiro de investidores na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). Elas devem levantar, somadas, de R$42 bilhões a R$51 bilhões até dezembro, com o objetivo de financiar projetos de expansão e adquirir rivais no mercado, segundo estimativas do banco BTG Pactual. O valor inclui as ofertas públicas iniciais (IPOs, na sigla em inglês, quando uma empresa abre capital e lança ações em Bolsa) e também novas emissões por companhias que já têm papéis em pregão (conhecidas como follow-on).

Somente nos próximos três meses, nove empresas devem captar entre R$6 bilhões e R$7 bilhões na Bovespa nesses dois tipos de ofertas, segundo estima o Itaú BBA, banco de atacado do Itaú Unibanco. São companhias de setores como consumo, energia, metalurgia e saneamento. O banco prevê que até abril haverá um total de 25 ofertas, número que supera as 23 operações feitas em todo o ano passado.

Fábio Nazari, responsável pela área de mercado de capitais do BTG Pactual, afirma que o apetite dos investidores brasileiros e estrangeiros permite às empresas captarem recursos com emissão de ações. No ano passado, aplicadores de outros países participaram de 52,8% das ofertas, segundo dados da Bolsa. Ele explica que a crise fiscal vivida por países da Europa foi assimilada pelo mercado e apenas um cenário muito mais grave vai atrapalhar.

- As últimas captações feitas pelas empresas tiveram uma procura até dez vezes maior que a quantidade de ações oferecidas. Existe uma corrida desenfreada, mas com fundamentos, o que é muito bom. Está todo mundo ganhando dinheiro - explica o executivo do BTG Pactual, banco que coordenou 22 ofertas que, somadas, movimentaram US$5,332 bilhões no ano passado.

Companhias médias serão destaque

Neste momento estão em avaliação na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) os pedidos de IPOs de empresas como Sonae Sierra (shopping centers), Autometal (metalúrgica), Desenvix (energia renovável), QGEP Participações (empresa de petróleo do Grupo Queiroz Galvão), Arezzo (calçados) e Companhia de Águas do Brasil (empresa de saneamento da Galvão Engenharia).

Também são aguardadas para este ano a abertura de capital de empresas como Magazine Luiza (vestuário), Cedae (saneamento no Rio), XP Investimentos (corretora) e possivelmente da Infraero (estatal de aeroportos). Mas elas ainda não enviaram pedido de registro da oferta para a CVM. Outras sete empresas que já negociam ações na Bolsa aguardam aprovação do órgão regulador do mercado para emitir mais papéis, como Vulcabrás (dona de marcas como Azaleia) e Brasil Brokers (setor imobiliário).

Segundo Cristina Pereira, diretora de Desenvolvimento da BM&F Bovespa, as empresas de médio porte devem ser o destaque das ofertas públicas daqui para frente. São companhias que têm dificuldade de acesso a linhas de financiamento internacional para captar recursos e veem na Bovespa uma alternativa de custo menor para se financiar.

- Queremos atrair 200 novas empresas para a Bolsa até 2015 e, com certeza, serão em sua maioria companhias de médio porte, independentemente do segmento de atuação. É uma meta ambiciosa, mas ainda é pouco frente ao enorme desafio de tornar o mercado de capitais uma fonte viável de financiamento para as empresas - diz Cristina.

Mesmo com o avanço do mercado, o volume total esperado de IPOs e follow-ons não deve superar o visto no ano passado, quando as ofertas somaram R$149 bilhões, um aumento de 224,6% em relação ao ano anterior. Isso porque, no ano passado, a Petrobras realizou a maior capitalização da História, ao levantar R$120 bilhões na Bovespa. Especialistas afirmam que os números da Petrobras distorcem as estatísticas. O ano passado, na verdade, foi fraco para captação via Bolsa da maioria das empresas até o término da oferta da Petrobras, que mobilizou atenções e recursos.

- Se você olhar somente o número de IPOs, por exemplo, que não considera os dados da Petrobras, vai notar que houve uma queda de 53% nas ofertas. Muitas empresas adiaram a abertura de capital para não concorrer com a Petrobras - afirma um executivo.

Segundo Márcio Yamashita, gestor de renda variável da Gradual Investimentos, as políticas monetárias expansionistas nos Estados Unidos e na Europa criaram um cenário favorável para busca de ativos de risco este ano, o que poderá contribuir para o sucesso das ofertas das empresas.

- O cenário econômico mundial tem melhorado aos poucos, com indicadores dos EUA surpreendendo positivamente. Isso não significa, porém, que todas as empresas vão captar quanto querem e ao preço que querem. O mercado vai olhar a qualidade da empresa e decidir - explica Yamashita.

Recuperação dos EUA contribui

Julie Teigland, líder da Ernst & Young para mercados em crescimento, afirma que o Brasil vai desempenhar um papel importante no mercado mundial de IPOs, ao lado de países asiáticos como China, Índia e Coreia do Sul. Ela prevê grandes ofertas no setor de matérias-primas, como mineração e metálicos. E acredita também em novos IPOs de empresas do setor de tecnologia.

- Existe uma recuperação em curso nos mercados mundiais. Isso aconteceu no ano passado e continua este ano. Estados Unidos e Europa estão se recuperando, mesmo que lentamente, o que é positivo. E temos um forte fluxo de projetos de companhias, o que faz com que tenhamos grandes IPOs este ano - afirma Julie, por telefone, de Londres.

Ela acredita que recursos captados no exterior (funding internacional) terão um papel importante para o sucesso dessas ofertas públicas de ações. Mas acrescenta que tudo dependerá do apetite por risco desses investidores.

- Quando um investidor compra ações de uma empresa no exterior, ele assume não apenas o risco daquela empresa, mas também da oscilação da moeda do país. Não sei até que ponto isso pode interferir. Vai depender do apetite por risco dos investidores e das avaliações dos mercados que eles fizerem - conclui Julie.